Primeiro dia

Racismo na Alesp: na posse, deputada Thainara foi tratada 'mais de 10 vezes' como assessora

Parlamentar mais jovem da Casa, petista lamentou o episódio: “Eu consigo materializar o racismo naquele espaço”

São Paulo | SP |

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Thainara Faria foi eleita para dois mandatos de vereadora em Araraquara, interior de São Paulo - Foto: Reprodução/Instagram

Na última quarta-feira (15), Thainara Faria (PT) e outros 93 deputados tomaram posse na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) para mandatos da nova legislatura da Casa. Porém, durante a cerimônia, a parlamentar afirma que seus pares a tratavam como assessora.

“Por mais de dez vezes, fiz questão de contar, eu fui confundida com assessora e foi muito difícil para mim, porque eu consigo materializar o racismo naquele espaço”, explicou Faria, que é a deputada mais jovem da Alesp na atual legislatura.

Faria também repercutiu a entrevista do presidente eleito da Alesp, André do Prado (PL), que afirmou que precisará ter “paciência de Jó” para lidar com as bancadas de mulheres e negros.

Leia Mais: Presidente da Alesp diz que precisará de 'paciência de Jó' para lidar com mulheres e negros

“Paciência tivemos nós, com mais de 300 anos de escravidão. Agora estamos reorganizando a sociedade, conforme nossos interesses”, criticou a deputada.

Thainara Faria está entre os 18 deputados estaduais eleitos pelo PT em São Paulo, em 2022. É a segunda maior bancada da Alesp, ficando atrás apenas do PL, que elegeu 19 parlamentares.

Com apenas 21 anos de idade, Thainara Faria foi eleita para o primeiro mandato de vereadora em Araraquara, no interior de São Paulo, em 2016. Na eleição seguinte, foi reeleita para o cargo. Em 2022, a petista foi eleita para a Alesp com 91.388 votos.


Brasil de Fato: Como foi a posse? O que você sentiu?

Thainara Faria: A posse foi um momento muito importante, não apenas para a minha vida, mas para todas as pessoas que confiaram que nós faríamos um trabalho em todo o estado, conectando o interior com a capital. Recebemos dois ônibus de pessoas do interior, o que mostra que a população está mobilizada para participar da vida política.

Você é a parlamentar mais jovem da Alesp. Ontem, foi olhada de forma diferente pelos parlamentares?

Por mais de dez vezes, fiz questão de contar, eu fui confundida com assessora e foi muito difícil para mim, porque eu consigo materializar o racismo naquele espaço. Agora, após a posse, alguns policiais e servidores da casa já me reconhecem como deputada, mas, mesmo assim, eu continuo tendo dificuldade de transitar naquele espaço.

Antes mesmo de ser empossada, eu já havia participado de reuniões da Casa, com pessoas que têm o dobro da minha idade, mas que têm aprendido a me respeitar ao longo das reuniões.

Em entrevista à Folha, o presidente da Alesp, André do Prado, afirmou que terá que ter “paciência de Jó" para lidar com os parlamentares negros e mulheres. Você acha que essa declaração é sintomática de como será a presidência dele?

Sobre a fala infeliz do André do Prado, eu penso que essas figuras não estão acostumadas a ver nosso perfil dentro do parlamento, porque nós negros éramos impedidos de estudar e para votar era necessário saber ler e escrever, nós não participamos da montagem e estrutura desse país, nem das leis que foram criadas aqui, que regem nossas vidas.

Por isso, esses homens brancos, héteros e cis normativos, não estão acostumados conosco nesse espaço. Agora, que estamos dentro, reivindicando nossos direitos, eles falam em paciência? Paciência tivemos nós, com mais de 300 anos de escravidão. Agora estamos reorganizando a sociedade, conforme nossos interesses.

Uma das primeiras grandes pautas da Alesp pode ser a privatização da Sabesp. O que a senhora pensa a respeito?

Nós, da bancada do PT e da Federação, o que inclui a deputada Leci Brandão (PCdoB), estamos muito organizados contra as privatizações, sobretudo da Sabesp. O bem público, a água, precisa chegar à população como prestação de serviço e não como lucro, com empresas levando vantagem. Somos contra a privatização da Sabesp e tantas outras que o governo colocará para discussão.

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho