DENÚNCIA NA TELA

Usinas eólicas causam danos a comunidades do agreste pernambucano, denuncia documentário

A produção 'Vento Agreste' critica o modelo de instalação das usinas no Brasil e os impactos à saúde e ao meio ambiente

Ouça o áudio:

Insegurança alimentar, diminuição da biodiversidade destruição de sítios arqueológicos são alguns dos impactos das usinas eólicas - Vinícius Sobreira/Brasil de Fato
A gente só tem duas opções: ou a gente sai do lugar da gente ou as eólicas saem

Roselma de Melo mora há dez anos na comunidade de Sobradinho, no município de Caetés, no agreste pernambucano. Há oito anos, a família da agricultora é uma das 170 que convivem com os aerogeradores a cerca de cem metros de distância de suas casas.

"A gente só tem duas opções: ou sai do lugar da gente ou as eólicas saem. E a gente sabe que as eólicas não vão sair. Então, infelizmente, a gente vai ter que sair do local que escolheu pra viver", lamenta. 

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A moradora também revela problemas relacionados à saúde. "Olhe, para a gente que mora praticamente embaixo delas [das hélices], piorou a saúde, a ansiedade aumentou, [além da] perda de sono e dificuldade para dormir. O barulho é frequente, todos os dias". 

A denúncia de Roselma e outros danos causados às comunidades camponesas pelas usinas eólicas na região estão no documentário 'Vento Agreste', uma produção da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em parceria com o Instituto Mãe Terra.

Também participam a equipe de residência em saúde coletiva e agroecologia da Universidade de Pernambuco (UPE) e o Fundo Casa Socioambiental. O objetivo é apoiar a luta pela reparação dos direitos violados dos agricultores. O diretor e roteirista João Paulo Do Vale, que é agente da CPT, destaca que o filme foi uma forma de alcançar ainda mais pessoas com o trabalho de denúncia que já vinha sendo feito.

"A gente começou a tentar fazer intercâmbio, levando [o filme] para as comunidades afetadas, para elas sentirem, perceberem o que estava acontecendo. Isso tem funcionado muito bem, porque algumas comunidades que estavam ainda em dúvida sobre a instalação percebem que o parque eólico não faz sentido para suas comunidades. Então, a gente usou a estratégia de divulgação do conflito, de mostrar, fazer essa denúncia mesmo", destaca. 

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As gravações de Vento Agreste foram realizadas entre os meses de julho e outubro de 2022, a partir da atuação das organizações envolvidas em atividades de escuta, registro, formação e acompanhamento dos casos de violações de direitos causados pelas usinas eólicas. Uma das principais críticas é o modelo que tem sido utilizado para a instalação, onde os moradores acabam aceitando sem saber qual o impacto na prática.

"A questão não é energia eólica, mas o modelo. Na Europa, existe outra regulamentação. No Brasil, ela imita a lógica do latifúndio, da violência. Então a gente mostra o que realmente acontece, que essa energia não é suficiente nem para a natureza - que sofre com esse modelo de instalação no Brasil - e muito menos para os camponeses e os povos da natureza", complementa o diretor. 

Confira a reportagem em vídeo no Bem Viver na TV:

 


Segundo dados da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), existem 805 parques eólicos no Brasil, sendo 708 deles no Nordeste. Ao todo, a região possui mais de 8 mil aerogeradores instalados. Entre os impactos apontados pelos moradores estão distúrbios do sono, enxaqueca, estresse, depressão, interferência nas rotas de aves e danos ambientais.

 

 

O documentário aborda também o papel de denúncia que a comunidade assumiu desde a instalação do parque; e é possível conferi-lo no YouTube da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Agora, os moradores desejam apenas que ninguém passe pela mesma situação. "É um modo da gente poder desabafar. Toda vez que a gente conversa com alguém, a gente fala o que aconteceu, como a gente foi enganado e que a gente não teve a opção de escolher se vai querer passar pelo que a gente está passando. Não tivemos a oportunidade de ver o que estava acontecendo em outros lugares antes desse empreendimento chegar aqui", desabafa, mais uma vez, Roselma. 

Edição: Douglas Matos