Paraná

BDF 20 anos

Comunicação da esquerda e relação com as periferias foi o tema da mesa final de Seminário

Seminário 20 anos do Brasil de Fato contou com três comunicadoras de movimentos populares na mesa final

Curitiba (PR) |
As três convidadas do debate abordaram o desafio de uma comunicação que não esteja pautada apenas na denúncia, mas nas coisas boas na vida das comunidades - Pedro Carrano

A mesa final do Curso de Comunicação – Seminário “20 anos do Brasil de Fato e a comunicação dos trabalhadores” – abordou um assunto cada vez mais em pauta nos dias de hoje: os desafios da comunicação popular.

Participaram do debate – organizado na ocupação Britanite, que existe desde dezembro de 2020 no bairro Tatuquara -, convidadas com experiências na comunicação de movimentos populares urbanos e por moradia.

Kinberly Novaes integra a comunicação do Movimento Popular por Moradia (MPM). Já Juliana Santos integra o Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD). Vanda Moraes integra a redação do Brasil de Fato Paraná e tem experiência de curso de comunicação popular no bairro Parolin. A mediação foi feita por Pedro Carrano, integrante da União de Moradores/as e Trabalhadores/as (UMT) e do Brasil de Fato Paraná.

Comunicação da classe trabalhadora

Uma das principais questões do debate certamente foi o desafio entre a realização de uma comunicação geral da classe trabalhadora, que se coloque como alternativa à mídia empresarial, como é a experiência do Brasil de Fato Paraná, e a relação disso com as experiências de comunicação das próprias comunidades.

A fala de Kymberli recordou do jornalista Rene Silva, que criou um jornal no Complexo do Alemão, aos 11 anos. “Ele viu um jornalzinho na escola e nunca viu nada sobre a comunidade. Queria falar sobre coisas boas da comunidade. Começou a colocar mais gente para fazer. Criaram uma conta no twitter chamada Voz das Comunidades. Em 2010, na guerra do Estado contra a comunidade, todas as pessoas pelo mundo começaram a retuítar o que acontecia”, descreve.

Pela voz de todas as convidadas, um dos consensos é que a comunicação popular tem que abordar o cotidiano, a cultura, o esporte as coisas positivas, em suma, a realidade da periferia, para além das (importantes) denúncias dos problemas. É o caso da experiência de Kymberli, que ministra cursos de artes marciais na ocupação Nova Esperança, em Campo Magro.

Cursos de Comunicação Popular

Juliana Santos destacou a importância do curso de comunicação popular ocorrido na vila Maria e Uberlândia, no bairro Novo Mundo, ainda em 2020, no período difícil de pandemia, como um espaço formador que auxiliou na comunidade cotidiana enquanto liderança comunitária.

“Eu e minha filha fizemos parte do curso e aprendemos muito. Trouxe para a gente como saber fazer uma foto, um vídeo, gravar o que acontece, às vezes filmando uma ação absurda da polícia, como já aconteceu comigo, num momento de violência”, afirma.

Juliana ainda complementou com a experiência de distribuição do Brasil de Fato Paraná nos bairros. “Pela distribuição dos jornais, levamos conhecimento e notícias para toda periferia, onde pessoas não tem muito acesso à internet. Eu trabalho também na região do Formosa, com muitas pessoas em situação de rua. Temos panfletos, jornais e o famoso boca a boca”, descreve.

Responsabilidade

Vanda Moraes abordou a contradição entre a necessidade de uma comunicação produzida por pessoas das áreas de ocupação e periferias, mas reconhece que, sem estrutura, as pessoas acabam não se fixando nas tarefas da comunicação popular. Nesse sentido, o Brasil de Fato Paraná e outras experiências de comunicação alternativa tem uma responsabilidade enorme sobre os temas que abordam.

“Qual é o nosso limite? Quem faz o jornal ainda não é o povo que realmente sofre dentro das nossas comunidades. Por quê? Porque não temos condições. Então temos que debater com muita seriedade o que se vai escrever, porque, dependendo da pessoa que escreve, não enxerga as coisas da forma que a gente (integrantes de comunidades) enxerga”, aponta.

Vanda reforçou então a necessidade de criar condições e estrutura para que essa comunicação popular possa se efetivar. “Estamos na situação de não ter moradia, de não ter comunicação. (…) Independente da ferramenta, temos que estar atentos para o que vamos dizer, então a pessoa que faz a comunicação é tão importante quanto a comunicação que se faz. Temos que garantir que os nossos não sejam apenas entrevistados. Temos que construir comunicação aqui dentro. Daí que as parcerias são importantes, como garantir que essas pessoas que sofrem falem disso”, aponta.

Edição: Pedro Carrano