Disputa

STF volta a julgar nesta sexta (16) ação que questiona piso da enfermagem; Toffoli pede vista

Tema está em análise na Corte desde agosto de 2022; entidade afirma que categoria ainda aguarda novos salários

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Enfermagem é a maior categoria da área de saúde e reúne mais de 1,5 milhão de profissionais, segundo pesquisa da Fiocruz em parceria com o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) - Bruno Cecim/Agência Pará

O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a julgar nesta sexta-feira (16), em plenário virtual, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222, da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), que questiona o piso da enfermagem. Os ministros teriam até a próxima sexta (23) para manifestar seus votos no sistema, podendo inclusive rever suas posições dentro desse limite de tempo, mas logo nas primeiras horas da madrugada nesta sexta o ministro Dias Toffoli pediu vista.

Até antes do retorno do julgamento, havia parecer favorável do relator, ministro Luís Roberto Barroso, para o pagamento do piso, com algumas condicionalidades. Uma delas é o entendimento de que, no caso dos trabalhadores celetistas, seja possível uma eventual negociação coletiva se sobrepor à lei de criação do piso, “a partir da preocupação com eventuais demissões”. Nas primeiras horas desta sexta-feira (16), o plenário virtual recebeu uma complementação de voto do relator assinada conjuntamente pelo ministro Gilmar Mendes.

Os dois defendem alguns pontos, entre eles o de que União, autarquias e fundações públicas federais devem implementar o pagamento do piso conforme prevê a Lei nº 14.434/2022. A norma foi aprovada pelo Congresso Nacional em 2022 e fixa um piso nacional de R$ 4.750 para enfermeiros, 70% desse valor para técnicos de enfermagem e 50% para auxiliares e parteiras.

Já em relação aos servidores públicos dos estados, municípios, Distrito Federal, suas autarquias e fundações, os magistrados entendem que deve haver um crédito suplementar por parte da União para custear o piso, caso os valores liberados pelo governo Lula não sejam suficientes para as novas despesas. No caso se não haver essa complementação, os ministros entendem que o pagamento do piso não deve ser “exigível” nesse segmento.

A questão do custeio esbarra na queixa de gestores municipais e estaduais de que o montante de R$ 7,3 bilhões liberados mês passado pelo presidente Lula (PT) não seriam suficientes para todas as despesas necessárias ao pagamento dos novos salários. O motivo seria um problema relacionado ao cálculo do custeio do piso, que foi feito nos últimos anos a partir de dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2020 e por isso estaria desatualizado.

Na complementação de voto assinada por Barroso e Gilmar Mendes, os dois ministros defendem ainda que, uma vez disponibilizados os recursos financeiros suficientes, o pagamento do piso deve ser proporcional nos casos em que os trabalhadores tenham carga horária inferior a oito horas por dia ou 44 horas semanais.

No que se refere aos profissionais celetistas, os ministros apontam que a implementação do piso salarial deve ser precedida de negociação coletiva entre as partes, “levando em conta a preocupação com demissões em massa ou prejuízos para os serviços de saúde”. “Não havendo acordo, incidirá a Lei nº 14.434/2022, desde que decorrido o prazo de 60 dias contados da data de publicação da ata deste julgamento”, emendam.

Fachin

O outro voto manifestado até agora é o do ministro Edson Fachin, que defende a imediata aplicação dos novos salários, previstos na Lei nº 14.434/2022. Citando o fato de o piso nacional da enfermagem ter previsão expressa na Constituição Federal, Fachin entendeu que não deve haver sobreposição de negociação coletiva à legislação.

O julgamento do caso estava paralisado desde 29 de maio, quando Gilmar Mendes pediu vista para analisar melhor o processo. Agora que foi feito um novo pedido de vista, desta vez por parte de Toffoli, o julgamento é novamente suspenso. Ainda devem manifestar suas posições os outros sete ministros da Corte.

“Nós tivemos aí um tempo em que a questão já poderia ter sido resolvida pelo próprio STF com alguma sentença definitiva. Isso inclusive atrasou para nós a questão do pagamento porque todo mundo está aguardando de forma ansiosa, tanto o setor público quanto os [hospitais] filantrópicos e os privados, para ver se vai ter ou não a manutenção da decisão do ministro Barroso”, disse ao Brasil de Fato a presidenta da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), Solange Caetano.

Capítulos

O piso nacional da enfermagem foi proposto em diferentes projetos de lei (PLs) nos últimos 20 anos no Congresso Nacional, mas ganhou fôlego mais efetivo somente na pandemia, precisamente a partir de maio de 2020, quando o senador Fabiano Contarato (PT-ES) apresentou o PL 2564/2020, texto que deu origem à Lei nº 14.434/2022. Ao longo da tramitação, a proposta angariou apoio das diferentes correntes político-partidárias no Legislativo, contando com rejeição apenas dos parlamentares do partido Novo e alguns nomes isolados dentro das siglas PL, PP e União Brasil.

Como resultado do somatório de forças que se aglutinaram em torno do PL, o projeto foi aprovado na Câmara e no Senado com ampla maioria, mas enfrentou dura resistência de atores do segmento empresarial. A disputa foi parar no STF por meio da ADI 7222, para a qual é esperada agora a definição de um rumo por parte do plenário da Corte.  

“Nós, entidades sindicais e trabalhadores, esperamos que se chegue logo a uma sentença final para que, a partir daí, a gente possa, de fato, com uma segurança jurídica maior, começar a cobrar os empregadores para começarem a cumprir o piso”, afirma a presidente da FNE.

Edição: Vivian Virissimo