Esquema milionário

PIX de R$ 17 mi para Bolsonaro e transações atípicas de Mauro Cid serão investigadas por CPMI

Parlamentares querem apurar possível relação entre as movimentações financeiras e os atos golpistas de 8 de janeiro

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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O ex-presidente Jair Bolsonaro ao lado do ex-ajudante de ordens Mauro Cid - Reprodução/ Facebook Jair Bolsonaro

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebeu R$ 17,2 milhões via transação por Pix nos seis primeiros meses deste ano, segundo um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Entre os dias 1º de janeiro e 4 de julho, foram cerca de 769 mil transações que totalizaram R$ 17.196.005,80. No mesmo período, o ex-presidente movimentou R$ 18.498.532. As informações foram enviadas à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro. 

De acordo com o Coaf, os valores podem ter relação com as campanhas de arrecadação de dinheiro feita por aliados de Bolsonaro para o pagamento de multas impostas pela Justiça. "No período chamou a atenção o montante de PIXs recebidos em situação atípica e incompatível. Esses lançamentos provavelmente possuem relação com a notícia divulgada na mídia", diz trecho do relatório obtido pela Folha de São Paulo.   

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O próprio ex-presidente afirmou, em junho, que havia recebido um montante suficiente para quitar as dívidas. "Foi algo espontâneo por parte da população. O Pix nasceu no nosso governo. Já foi arrecadado o suficiente para pagar as atuais multas e a expectativa de outras multas. O valor, a gente vai mostrar brevemente. Agradeço a contribuição, mesmo sem ser a pedido. A massa contribuiu entre R$ 2 e R$ 22", disse Bolsonaro em entrevista a jornalistas. 

A lista das pessoas jurídicas e físicas que fizeram as transações para Bolsonaro traz apenas valores maiores do que R$ 5 mil. O Partido Liberal (PL) transferiu R$ 47,8 mil em dois pagamentos para Bolsonaro. Outras 18 pessoas fizeram pagamentos variando entre R$ 5 mil e R$ 20 mil, incluindo empresários, advogados, pecuarista, militar, agricultor, estudante e duas pessoas identificadas pelo Coaf como "do lar". Uma empresa ainda depositou R$ 9.647 em 62 pagamentos.  

Bolsonaro ainda não se manifestou publicamente sobre a divulgação do relatório. 

Transações de Mauro Cid 

O Coaf também apontou movimentação “atípica” e “incompatível” nas contas bancárias do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. A informação foi revelada pelo jornal O Globo. De acordo com o relatório, há indícios de “movimentação de recursos incompatível com o patrimônio, atividade econômica ou a ocupação profissional e capacidade financeira do cliente” e “transferências unilaterais que, pela habitualidade e valor ou forma, não se justifiquem ou apresentem atipicidade”. 

No total, Cid movimentou R$ 3,2 milhões em sete meses, entre 26 de junho de 2022 e 25 de janeiro de 2023. Foram R$ 1,4 milhão em débitos e R$ 1,8 milhão em créditos. Atualmente, ele recebe um salário mensal de R$ 26.239. O relatório destaca uma operação suspeita de envio de remessas aos Estados Unidos, no valor de R$ 367.374, que ocorreu em 12 de janeiro de 2023. Nesta data, tanto Cid quanto Bolsonaro estavam nos Estados Unidos.   

“Considerando a movimentação elevada, o que poderia indicar tentativa de burla fiscal e/ou ocultação de patrimônio e demais atipicidades apontadas, comunicamos pela possibilidade de constituir-se indícios do crime de lavagem de dinheiro ou com ele relacionar-se”, diz trecho do relatório. 

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Após a divulgação do relatório, a CPMI do 8 de janeiro deve investigar as movimentações financeiras atípicas de Cid, com o objetivo de saber se há relação entre as transações e o financiamento dos aos golpistas alvos do colegiado. 

Para o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), trata-se de uma conta “estranha”. “Naquela conta ele também movimentava em nome de Bolsonaro, é uma conta estranha. Entra muito dinheiro além do que ele ganha. Tem que saber de onde vem aquele dinheiro, se tem dinheiro dentro da conta do próprio Bolsonaro que entra lá para pagar as coisas dele ou não, se tem dinheiro da conta da Michelle que entra lá e de onde entra, se tem empresa que deposita. Isso tudo vai se saber na hora que houver quebra de sigilo, que a CPMI já pediu”, disse ao O Globo.  

A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), afirmou em seu perfil no Twitter que a CPMI irá trabalhar “para descobrir quem está financiando Bolsonaro e seu ex-ajudante de ordens e por quê”. “Em relatório, o Coaf concluiu que Bolsonaro recebeu R$ 17,2 milhões via Pix só nesse ano. Mauro Cid, seu ex-ajudante de ordens, movimentou 3,2 milhões nos últimos 12 meses, valor incompatível com seu salário. Isso não passará batido”, disse a parlamentar. 

Cid já compareceu em depoimento à CPMI do 8 de janeiro, mas ficou em silêncio por orientação de seus advogados. Ele foi convocado na condição de investigado e de testemunha, em casos diferentes.   

Mauro Cid preso e as mensagens golpistas 

Mauro Cid está preso sob acusação de supostamente articular um esquema de inserção fraudulenta de doses de vacina contra a covid-19 em carteiras de vacinação nos sistemas do Ministério da Saúde, incluindo os registros de imunização de Bolsonaro e seus familiares. 

Em seu celular, que foi apreendido pela Polícia Federal, foram encontradas mensagens que sugerem a possibilidade de um golpe de Estado após as eleições presidenciais do ano passado, que resultaram na vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).  

Além das conversas entre oficiais do Exército e reservistas sobre o envolvimento das Forças Armadas diante do resultado eleitoral, a PF também encontrou a minuta de um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) que poderia servir de base para um golpe.  

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Entre as mensagens encontradas, um dos interlocutores de Mauro Cid foi identificado como coronel do Exército, Jean Lawand Junior. “Cidão, pelo amor de Deus, cara. Ele [Bolsonaro] dê a ordem que o povo tá com ele, cara. Se os caras não cumprir, (sic) o problema é deles. Acaba o Exército Brasileiro se esses caras não cumprir a ordem do, do Comandante Supremo", diz parte da conversa.

“Como é que eu vou aceitar uma ordem de um general que não recebeu, que não aceitou a ordem do comandante. Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer", disse Lawand em um dos áudios enviados a Mauro Cid, em 30 de novembro de 2022, segundo transcrição da PF.     

Edição: Geisa Marques