Direitos humanos

Após 3 assassinatos em uma semana, Colômbia já registra 97 líderes sociais mortos em 2023

Segundo diretor da organização Indepaz, principais motivos para assassinatos são sociais e ambientais

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |
Desde o início de 2023, 97 líderes sociais já foram assassinados na Colômbia - Colombian army/AFP

A Colômbia registrou na última semana a morte de mais três líderes sociais em regiões do interior do país, elevando a cifra total desde o início do ano a 97 assassinatos. Segundo dados do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz), o agricultor Carlos Mario Roldán Díaz e os líderes indígenas Yesid Pechené Musicué e Benito Segundo Castillo Gutiérrez foram assassinados entre os dias 24 e 25 de julho nos departamentos de Antioquia, Cauca e La Guajirra respectivamente.

O alto nível de conflitividade nessas regiões entre grupos armados continua fazendo vítimas ligadas aos movimentos populares e se tornou um empecilho ao programa de "paz total" promovido pelo governo do presidente Gustavo Petro.

Em maio, após a morte do ativista Sergio Luis Castro, que pretendia se candidatar a vereador em Tibú, localizado em Norte de Santander, Petro chegou a afirmar que o assassinato de líderes sociais são "crimes sistemáticos" na Colômbia.

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"Essas mortes visam atacar o processo", afirma Leonardo González, diretor do Observatório de Direitos Humanos do Indepaz. Em entrevista ao Brasil de Fato, ele afirma que as mortes buscam coibir diversos pontos relacionados ao processo de paz no país.

"Quais são esses processos? Pode ser, eventualmente, a ampliação de um resguardo de território, ou a criação de um conselho comunitário, pode estar relacionado com o tema das vítimas incluídas na JEP [Jurisdição Especial para a Paz], ou seja, são processos que estão sendo atacados", afirma.

González também explica que os assassinatos são resultados de múltiplos fatores, sendo que os principais estão relacionados a conflitos nas regiões, "não somente conflitos entre grupos armados, mas também conflito de interesses socioambientais".

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"Algumas mortes estão relacionadas a cultivos ilícitos, outras com a mineração legal e ilegal, então o que acontece: quando algum representante comunal ou indígena se coloca para defender seu território contra essas práticas, ele está ameaçado", diz.

De acordo com os dados da Indepaz, mais de 1.500 líderes sociais já foram assassinados na Colômbia desde os Acordos de Paz assinados entre Colômbia e a ex-guerrilha Farc em 2016.

González, no entanto, aponta que o número de líderes sociais mortos desde o início do ano até esta sexta-feira (28) é menor do que a cifra do mesmo período do ano passado. "A quantidade de assassinatos nesse período em comparação de um ano a outro diminuiu 20%, mas ainda que esse número venha caindo, os líderes seguem morrendo, então ainda tratamos como algo constante", afirma.

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O pesquisador explica que uma das razões que pode explicar a diminuição é a consolidação do controle de grupos armados em determinados territórios. "Quando um grupo armado já assumiu o controle de um território, já não precisa mais atacar os líderes sociais", diz.

Um outro motivo apontado por González é o cumprimento de acordos de cessar-fogo alcançados pelo governo Petro com alguns grupos armados. "Isso também tem a ver com o projeto de paz total porque ele gera cenários de diálogo, esperanças de que pode haver diálogo entre o governo e os grupos armados, então isso diminui as tensões também", afirma.

Desde que assumiu, Petro vem buscando colocar em prática o seu projeto para atrair ao diálogo não apenas grupos guerrilheiros como o ELN (Exército de Libertação Nacional), mas também facções ligadas ao narcotráfico e gangues que enfrentam autoridades estatais no interior do país.

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O passo mais concreto do governo foi dado em junho, em Havana, capital de Cuba, quando Petro e o ELN assinaram um cessar-fogo que durará seis meses e prevê a elaboração de equipes de trabalho para ampliar as negociações de paz.

Para González, além de acordos elaborados pelo governo com os grupos é importante que existam mecanismos de autodefesa das comunidades contra a violência existente nas regiões para que possam se proteger e evitar mortes.

"As guardas indígenas, brigadas camponesas, o cooperativismo, os alertas comunitários, os alertas da Defensoria do Povo são mecanismos que as comunidades têm para se proteger e o Estado deixou de lado essa visão, a substituiu por uma visão de proteção de cima para baixo", afirma.

Edição: Thales Schmidt