'Guerra do dendê'

Força Nacional é autorizada a atuar em conflito que vitimou indígenas Tembé no Pará

Quilombolas também relatam violência por multinacional do biocombustível; MPF pede proteção à vida dos envolvidos

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Registro feito por indígenas em novembro de 2022 mostra atuação de seguranças armados da Brasil BioFuels em Tomé-Acu (PA) - Reprodução/Twitter

O Ministério da Justiça autorizou nesta sexta-feira (18) o envio da Força Nacional de Segurança Pública (FNPS) para atuar na disputa conhecida como "guerra do dendê", nos municípios de Tomé-Açu e Acará, no Pará. Neste mês, quatro indígenas foram baleados no conflito territorial que vem escalando há três anos.

O envio da Força Nacional será em apoio à Polícia Federal (PF) e aos órgãos de segurança do Pará. A decisão foi tomada após uma recomendação do Ministério Público Federal (MPF).

A autorização foi publicada no Diário Oficinal da União (DOU) e prevê que as tropas atuem por 30 dias "nas atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio".

Ao recomendar o envio da Força Nacional, o MPF afirmou que o objetivo é garantir a vida, a integridade e a segurança dos indígenas Tembé e Turiwara, além de quilombolas e trabalhadores do grupo empresarial Brasil BioFuels (BBF).

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A BBF é uma multinacional que produz óleo de dendê, substância usada na produção de biocombustíveis. Desde a chegada da empresa, indígenas e quilombolas relatam um cotidiano de truculência por parte de seguranças privados da BBF, que, segundo os moradores, são também policiais militares. 

A Secretaria-Geral da Presidência da República afirmou em nota que o órgão está acompanhando a as providências tomadas em relação ao caso. "Desde a sexta-feira (4), quando o indígena Kauã Tembé foi baleado, a Secretaria-Geral acompanhou de perto as providências tomadas por outras pastas, no sentido de apoio e suporte a comunidade e acompanhamento das investigações e responsabilização dos envolvidos", diz a nota.

A nota informa, ainda, que os "Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Ministério dos Povos Indígenas estão diretamente envolvidos, além da atuação do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que esteve no local buscando providências".

Além disso, a Secretaria-Geral ressaltou que "o ministro Márcio Macêdo prestou solidariedade às lideranças indígenas da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), que integrou a Comissão que entregou a Carta da Marcha dos Povos da Terra pela Amazônia". Leia a nota na íntegra aqui.

Em 14 de maio deste ano, o cacique Lúcio Gusmão, do povo Tembé, foi atingido por um tiro no rosto e sobreviveu. No início do mês, enquanto Belém se preparava para a Cúpula da Amazônia, o jovem Kauã Tembé, 18 anos, foi baleado. Três dias depois, um novo ataque deixou três baleados: Daiane, Felipe e Erlane Tembé.  

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Na última semana, o ministro da Justiça, Flávio Dino, destacou a necessidade de investigação sobre o caso.

"Obviamente, [é necessária] a atuação do Poder Judiciário para que não haja violência e a negociação para a solução da controvérsia em torno da questão fundiária. Nesse momento, a atuação do Ministério da Justiça é uma atuação de acompanhamento daquilo que esses outros órgãos estão providenciando", afirmou Dino, como noticiado pelo g1.

BBF diz que propósito foi combater "ação criminosa"

Sobre o conflito que feriu Kauã Tembé, a Brasil BioFuel (BBF) afirmou que a "equipe de segurança privada do Grupo BBF" agiu com o propósito de "conter a ação criminosa e resguardar a vida dos trabalhadores que estavam no local".   

Segundo a empresa, um grupo de 30 pessoas "incendiou dezenas de tratores, maquinários e também edificações da companhia". A BBF atua no local desde novembro de 2020, quando assumiu os ativos da antiga empresa Biopalma, subsidiária da Vale.

Após o conflito que deixou três indígenas baleados, a BBF afirmou que "o Polo de Tomé-Açu, propriedade privada da empresa, composto pela Agrovila, Administração Geral e Áreas de Infraestrutura, foi invadido mais uma vez, na manhã desta segunda-feira, quando teve equipamentos incendiados e edificações destruídas por invasores indígenas".

A empresa alega que "na ação, cerca de 30 invasores armados ameaçaram e agrediram trabalhadores da empresa, antes de incendiar dezenas de tratores, maquinários agrícolas e edificações da companhia". "A equipe de segurança privada da companhia conseguiu conter a ação criminosa dos invasores e resguardar a vida dos trabalhadores que estavam no local", afirma o comunicado.

"O Grupo BBF reforça que tomou as medidas jurídicas cabíveis junto ao Poder Judiciário e solicitou o apoio aos órgãos de segurança pública do Estado do Pará. Dessa forma, aguarda uma rápida solução do caso", disseram.

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup) informou que prendeu o vigilante identificado como autor do disparo ao indígena na sexta-feira (4) e que "se esforça para esclarecer as circunstâncias do ocorrido.

Edição: Thalita Pires