CÚPULA DO BRICS

No Brics, Lula critica militarização, defende empregos e pede mais mulheres no poder: 'Lutam pela conciliação'

Em discurso, presidente critica gastos militares e cita povos que sofrem no esquecimento, como haitianos e palestinos

Brasil de Fato | Botucatu (SP) |

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Lula (com a primeira-dama Janja da Silva) disse que os homens fazem guerra, enquanto as mulheres lutam pela conciliação - GIANLUIGI GUERCIA / POOL / AFP

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mencionou a guerra da Ucrânia em seu discurso desta quarta-feira (23) na cúpula do Brics, em Joanesburgo. Além de expressar os pontos de vista habituais, como as limitações do Conselho de Segurança da ONU para lidar com temas dessa magnitude e os esforços do Brasil para viabilizar algum diálogo, ele destacou o papel das mulheres na busca pela paz.

“Em muitos lugares, enquanto os homens fazem a guerra, são as mulheres que lutam pela conciliação. A valorização e o fortalecimento do papel das mulheres na resolução dos conflitos será cada vez mais central para um mundo de paz”, afirmou o presidente.

Lula disse que o empoderamento das mulheres é “pré-condição para o pleno desenvolvimento econômico e social” e citou o revolucionário e pan-africanista Thomas Sankara: “Não podemos almejar uma sociedade em que metade da população é silenciada pelo machismo e pela discriminação na participação política e no mundo do trabalho”.

O presidente destacou também outros conflitos e crises que não recebem atenção devida, “mesmo causando vasto sofrimento para as suas populações”. “Haitianos, iemenitas, sírios, líbios, sudaneses e palestinos, todos merecem viver em paz”. E classificou como “inaceitável” que os gastos militares globais em um único ano ultrapassem 2 trilhões de dólares, enquanto 735 milhões de pessoas passem fome no mundo.

 

 

Aquecimento global

Lula abordou, como tem feito em todos os fóruns internacionais, a questão ambiental. Voltou a afirmar que os países mais desenvolvidos são os principais responsáveis pela crise climática, em virtude das altas emissões de carbono, destacou o protagonismo do Brasil ao realizar a Cúpula da Amazônia, no início deste mês, e defendeu os direitos das populações nativas. “Nossos recursos não devem ser explorados em benefício de poucos, mas valorizados e colocados a serviço de todos, sobretudo do bem-estar das populações locais”.

O presidente afirmou que a descarbonização das economias deve ser acompanhada pela geração de empregos dignos, industrialização e infraestruturas verdes. E defendeu que tudo isso só será possível se o sistema financeiro internacional for aprimorado, a fim de ajudar países de baixa e média renda a implementarem mudanças estruturais.

“Por meio do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), podemos oferecer alternativas próprias de financiamento, adequadas às necessidades do Sul Global. Tenho certeza de que, sob a liderança de minha companheira Dilma Rousseff, o Banco estará à altura desses desafios”, afirmou, em referência ao banco do Brics, presidido pela ex-presidenta brasileira.

Lula disse também que a criação de uma moeda para as transações comerciais e de investimento entre os membros do Brics aumentaria as opções de pagamento e reduziria as vulnerabilidades dos países membros.

Segundo Isabela Nogueira, professora de Economia Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do LabChina, o interesse da China em aumentar a participação de sua moeda nas transações externas deve inviabilizar a criação de qualquer moeda comum no bloco. “O Brasil tem falado de moeda comum dos Brics, algo que tem chance zero de acontecer porque a China vai seguir tentando internacionalizar sua moeda”.

Justiça e inclusão

O presidente brasileiro encerrou o discurso dizendo que o Brics está “plenamente consolidado como marca e ativo político de valor estratégico”, que o interesse de vários países em aderir ao bloco é reconhecimento de sua relevância crescente, que a sessão ampliada de quinta-feira (24) representará um “feito histórico”. “Que o ímpeto que motivou a criação do Brics continue a nos inspirar na construção de uma ordem multipolar, justa e inclusiva”.


 

Edição: Rodrigo Durão Coelho