'Grito de desespero'

Após denúncia do Brasil de Fato, ministro Silvio Almeida ordena providências em cadeia de litoral de SP

O ministro de Direitos Humanos classificou como 'grave' as denúncias de 'condições desumanas', falta de comida e remédio

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

Ouça o áudio:

A unidade prisional de Caraguatatuba tem 847 vagas para 934 presos - Defensoria Pública

O ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, determinou que a Ouvidoria Nacional de sua pasta acione "imediatamente" autoridades da Justiça de São Paulo e entidades de direitos humanos para tomar "as providências cabíveis" em relação às "graves denúncias" de maus tratos dentro do Centro de Detenção Provisória (CDP) de Caraguatatuba (SP). 

Comida estragada, corte de itens básicos de alimentação, ratos na cozinha, falta de remédio, negligência médica são os principais pontos de uma carta redigida coletivamente pelos detentos e que o Brasil de Fato teve acesso. Nela, os homens presos afirmam estar vivendo sob "condições desumanas" e com "alimentação incompatível com nossos direitos". 

Superlotada, a unidade está sob a direção de Alan Scarabel de Souza. Afirmando não ter "força para combater essa opressão sem a ajuda de um órgão competente", os presos provisórios pedem "pelo amor de deus, direitos humanos, inclinem seus ouvidos a esse grito de desespero".  

A reportagem entrou em contato com o Ministério dos Direitos Humanos questionando quais providências foram, estão ou serão tomadas em relação a este caso, mas até o fechamento desta matéria não teve resposta.  

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Uma publicação compartilhada por Silvio Almeida (@silviolual)

Frutas voltaram após denúncia, mas condições seguem 

Depois que a denúncia foi publicada pelo Brasil de Fato no último 8 de novembro, familiares dos presos do CDP de Caraguatatuba que fizeram visitas no último final de semana relatam que ainda não houve retaliação e que frutas voltaram a ser servidas nas refeições.  

A falta de acesso à saúde e a fome, no entanto, seguem inalteradas, afirmam familiares. "É muito difícil, como mãe, você ver seu filho morrendo", afirmou Jurema*, cujo filho está nesta unidade prisional.  

:: Comida estragada e falta de remédios: presos em cadeia do litoral de SP fazem carta coletiva com 'pedido de socorro' ::

"Está certo que cometeu um crime, ainda que o ato dele não tenha sido tão grave, mas mesmo que fosse, eles não podem estar matando os presos aos poucos. Porque é o que estão fazendo lá: matando", descreve Jurema.  

A Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) informa que a alimentação "respeita um cardápio que foi elaborado por nutricionistas", que servidores da pasta são responsáveis por "avaliar e fiscalizar as condições de higiene e limpeza do local" e que "o acesso à saúde é garantido pelo setor de saúde da unidade". No último 25 de setembro, um homem preso no CDP de Caraguatatuba faleceu. Ele era soropositivo e não estava sob tratamento.  

"A cadeia maltrata"

Chefiada pelo coronel da Polícia Militar Marcello Streifinger, a SAP vem expandindo o número de cadeias no estado – que já é o recordista do país, com 195. No momento, outras duas estão em construção.  

Por outro lado, recursos para a manutenção da população carcerária são cortados. No último 17 de outubro, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) decretou a transferência de R$ 27 milhões da SAP para a Companhia de Trens Metropolitanos (CPTM).   

"A cadeia maltrata... E quando saem aqui para a rua, a sociedade não insere mais eles", diz Jurema. "É assim que continua a superlotação da cadeia, porque aqui fora eles não têm chance de recomeçar", avalia. 

"O meu filho tentou, quando saiu da cadeia, arrumar um serviço. Ficou tão contente, numa marmoraria. Ia ser registrado. Quando pediram os antecedentes criminais dele, mandaram embora", conta Jurema, aos soluços. "Porque uma vez preso, sempre preso", resume. 

*O nome foi alterado para preservação da fonte.  

Edição: Rodrigo Durão Coelho