democracia em jogo

Massa x Milei: a acirrada eleição argentina se aproxima do fim com resultado imprevisível

Fruto de crises política e econômica, a disputa entre extrema direita e peronismo é teste para democracia argentina

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Sergio Massa e Javier Milei disputam o segundo turno das eleições argentinas neste domingo - Luis Robayo/AFP

A eleição para escolha do novo presidente argentino, no próximo domingo (19) está absolutamente indefinida. A disputa entre o candidato de extrema direita Javier Milei (A Liberdade Avança) e o atual ministro da Economia, Sergio Massa (União pela Pátria), chega à reta final com os dois tecnicamente empatados nas pesquisas de opinião e o país em uma grave crise política e econômica. 

Na avaliação de Juliano Medeiros, historiador, cientista político, ex-presidente do PSOL e autor de A nova esquerda na América Latina: partidos e movimentos em luta contra o neoliberalismo, essa crise está por trás justamente do surgimento e do fortalecimento de Milei como candidato

“Essa combinação de crise econômica, que é, digamos, a dinâmica do neoliberalismo. Neoliberalismo produz crise, miséria, recessão, com crise política, de confiança das instituições políticas. É o que pavimenta esse tipo de aventureiro. Infelizmente, a maior parte desses que têm surgido no mundo, são de direita e de extrema direita, porque eles se conectam com valores, com medos, com angústias, com preconceitos que já estão entranhados nas pessoas”, explica, em participação no podcast Três por Quatro

Na avaliação de Medeiros, se os grupos políticos de esquerda não conseguirem dar uma resposta para a crise econômica e a política, “nós vamos seguir enfrentando sujeitos como esses na política latino-americana". 

Nas mais recentes pesquisas, Massa e Milei aparecem tecnicamente empatados. Na última pesquisa da Proyección Consultora, uma das empresas de pesquisa que mais se aproximou do resultado no primeiro turno, os dados indicavam 47,7% das intenções de voto para Milei e 45,9% para Massa. No primeiro turno, o candidato peronista teve 36,68% dos votos e o candidato ultraliberal conseguiu 29,98%.

O cientista político avalia ainda que, apesar da força eleitoral e dos ensaios recentes, Milei não terá condições de questionar o resultado das urnas em caso de derrota, como fez o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL).  

“Eu não consigo ver uma ameaça, pelo menos nesse momento, que o Milei derrotado e não reconhecendo o resultado da eleição, consiga mobilizar, por exemplo, uma ala militar para questionar o resultado da eleição para acossar a democracia argentina. A democracia argentina é mais sólida que a brasileira. Agora, uma vez que o Massa vença as eleições, nós temos que cercar também o processo democrático argentino de apoio de solidariedade e legitimidade”, afirma. 

João Pedro Stedile, economista e liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) avalia, no entanto, que apesar da disputa, Milei não deve vencer a eleição deste domingo. Ele ressalta que a eleição para governadores teve forte vitória dos peronistas e o grupo detém força entre sindicatos, prefeituras e governos. Além disso, a politização da sociedade argentina é bem maior que a brasileira, por exemplo.  

“Milei é a reprodução folclórica do pensamento de ultradireita dos militares argentinos. E os militares, na Argentina, são odiados. Muitas famílias têm mortos pela ditadura argentina, então essa aversão tem uma base estrutural permanente. A sociedade da Argentina é bem mais politizada que a nossa. O cara não se deixa iludir por uma fake news, não vai atrás de uma mentira na rede social. Por essas razões, eu acho que o Massa vai ganhar”, afirma.  

Para Stedile, o que permite um candidato com as ideias de Milei se destacar, além da crise que o gerou, é que a burguesia não se importa com a política nacional, com a preservação do Estado nacional, nem com qualquer coisa além dos seus ganhos financeiros. E a classe trabalhadora está desarticulada, sem um projeto.  

O podcast Três por Quatro é apresentado por Nara Lacerda e Igor Carvalho, agora em temporada fixa no Brasil de Fato. Nesta nova fase, além dos comentários do João Pedro Stédile, liderança do MST, a equipe também conta com a presença do ex-presidente do PT, José Genoíno. 

Novos episódios do Três por Quatro são lançados toda sexta-feira pela manhã, discutindo os principais acontecimentos e a conjuntura política do país. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho