Retrocesso

Congresso rejeita vetos de Lula ao marco temporal e entidades indígenas devem recorrer ao STF

Tese foi declarada inconstitucional pelo STF em outubro; PL foi aprovado depois do julgamento do Supremo

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Agora, os trechos que haviam sido vetados serão incorporados à Lei 14.701/23, que estabelece o marco temporal no país - @kamikiakisedje / APIB

O Congresso Nacional rejeitou, nesta quinta-feira (14), o veto feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao dispositivo que estabelece um marco temporal para a demarcação terras indígenas no país.  

Entre os deputados, foram 321 votos contrários ao veto e 137 votos favoráveis. Já entre os senadores, foram 53 contrários e apenas 19 favoráveis. Agora, os trechos que haviam sido vetados serão incorporados à Lei 14.701/23, que estabelece o marco temporal no país.  

Diante da derrubada dos vetos, há uma expectativa de que as entidades que representam movimentos indígenas entrem com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) nos próximos dias contra a legislação.  

A deputada federal Célia Xakriabá e outros parlamentares da base do governo destacaram que a tese já foi declarada inconstitucional pelo STF no final de outubro. Nove dos 11 ministros deram razão aos povos indígenas ao reconhecerem que a Constituição não prevê um critério de tempo para validar as demarcações. Os únicos favoráveis ao marco temporal foram os dois integrantes da Corte indicados por Jair Bolsonaro (PL): Nunes Marques e André Mendonça. 

Luis Ventura Fernández, vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), afirmou que as entidades habilitadas a ingressarem com uma ADI no STF vão tomar essa decisão "nas próximas horas ou nos próximos dias". Fernández defendeu que a tese traz insegurança jurídica para os territórios indígenas no país e ameaça a sobrevivência dos povos.  

O vice-presidente do Cimi também afirma que a derrubada dos vetos representa "o que significa o Poder Legislativo hoje no país". "O marco temporal é inconstitucional. É um fato. Algo que já foi declarado pelo STF. O Executivo também se manifestou pela inconstitucionalidade do marco temporal quando vetou trechos. Portanto não cabe uma decisão do Congresso Nacional no sentido contrário. Dessa forma, o Congresso Nacional se coloca à revelia da Constituição", disse ao Brasil de Fato.

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A deputada federal Juliana Cardoso (PT-SP) afirmou que a despeito da derrota para o governo federal, "a luta continua". "O Congresso Nacional ataca mais uma vez os nossos direitos. Mesmo com o STF declarando inconstitucional a tese do Marco Temporal, o plenário desta casa aprovou a derrubada do veto 30/23 que protegia os direitos à terra dos povos indígenas. A luta continua!", disse em seu perfil no X, antigo Twitter. 

No final de setembro, os parlamentares aprovaram a tese que limita o direito às terras somente aos indígenas que estavam ocupando o território requisitado na data em que foi implementada a Constituição Federal, 5 de outubro de 1988. Em 20 de outubro, Lula sancionou o projeto com um total de 34 vetos. 

Trechos mantidos 

Os congressistas, no entanto, mantiveram alguns trechos da legislação, como a parte que dava ao governo federal a possibilidade de tomar uma terra indígena para destiná-la a fins de interesse público e reforma agrária.  

Outro ponto foi o não contato com indígenas isolados. Anteriormente, os congressistas haviam decidido que o Estado pode fazer esse tipo de contato. O governo Lula, entretanto, argumentou que a Constituição não indica para essa possibilidade. Agora, o argumento foi aceito pelos congressistas. 

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Os deputados e senadores, em sessão conjunta, também respeitaram o veto do presidente Lula à possibilidade de plantação de alimentos transgênicos em áreas de conservação ambiental. 

A tese do marco temporal em si, que não teve acordo entre os congressistas, deve ser votada em separado. O veto à indenização para proprietários de terras consideradas indígenas no processo de demarcação de territórios também foi mantido. 

Edição: Thalita Pires