Conferência do clima

Brasil pode alcançar emissão zero de poluentes com mudanças no uso da terra

Segundo pesquisa apresentada na COP28, preservação de biomas acelera e barateia processo para cumprir metas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Mudanças no uso da terra podem diminuir emissões do Brasil - Vitor Shimomura/ Brasil de Fato

Um estudo da Universidade de Oxford, liderado por uma pesquisadora brasileira, aponta que o Brasil pode economizar tempo e dinheiro na jornada para a redução da emissão de gases poluentes se investir em soluções inspiradas nos processos naturais dos biomas, especialmente no uso da terra. 

A pesquisa Soluções baseadas na natureza (SBN) são fundamentais para colocar o Brasil no caminho rumo às emissões líquidas zero até 2050 mostra que o país não precisaria pagar tecnologias mais caras por vinte anos, se priorizasse as SBN. 

“A implementação de políticas nacionais existentes e esperadas, principalmente do setor de uso da terra e mudança no uso da terra e florestas, poderia ajudar o Brasil a alcançar suas metas de curto e longo prazo, incluindo o compromisso de emissões líquidas zero”, diz o texto. 

Aline Soterroni, pesquisadora associada no Departamento de Biologia da Universidade de Oxford e principal autora do estudo, explica que a aplicação dessas soluções, no entanto, precisa ir além do objetivo de compensar as emissões que já estão no ar. Para muitas empresas, as SBN viraram uma forma de não se comprometer com a redução dos impactos climáticos. 

“Ao implementar e priorizar Soluções Baseadas na Natureza, nós vamos além do carbono, no sentido de adaptação e resiliência, que são muito importantes. Mas muitas empresas usam as SBN para compensar emissões que elas deveriam reduzir. E isso é lavagem verde. Elas não podem ser usadas para adiar a descarbonização da economia e a eliminação do uso de combustíveis fósseis”, alerta. 

Soterroni conversou com a equipe do Brasil de Fato na COP 28, onde apresentou os resultados da pesquisa. Em cenários projetados até 2050, o Brasil poderia mitigar até 80% das emissões de gases poluentes com a eliminação do desmatamento e a restauração de vegetação. Sistemas de produção agroecológica, como as agroflorestas, têm potencial de impacto direto nos resultados. 

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Mas as vantagens não se resumem ao cumprimento das metas para frear as emissões. O manejo sustentável e a recuperação da vegetação destruída impulsionam a economia, ao garantir a disponibilidade dos recursos naturais. As medidas também são benéficas para a soberania e a segurança alimentar. 

"Essas ações são importantes para combater as múltiplas crises que vivemos, como as crises de mudanças climáticas, de biodiversidade e de segurança alimentar”, ressalta Aline Soterroni. O estudo também mostra que, embora o Brasil conte com legislação e políticas de recuperação e contra o desmatamento, o impacto ainda não é suficiente. 

A implementação total do Código Florestal, por exemplo, tem potencial de reduzir as emissões em 38% até 2050. Para aproveitar a vantagem que tem sobre os outros países na corrida para zerar os danos dos combustíveis fósseis, o país precisa ir além do que já está em prática.  

“A maior parte das emissões no mundo vem realmente da queima de combustíveis fósseis, mas o uso da terra e as atividades relacionadas ao uso da terra são a segunda maior fonte de emissões. Mudanças do uso da terra e mudanças climáticas são os principais vetores de perda de biodiversidade”, afirma a pesquisadora.  

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Ainda de acordo com as conclusões do estudo, o Brasil precisa revisar as metas nacionais de curto para alinhá-las ao compromisso de emissões líquidas zero até 2050. “O país ainda não apresentou um plano detalhado para se tornar net zero em longo prazo”, cita a pesquisa. 

A análise levou em consideração todos os setores e biomas em território nacional e se baseou em estatísticas sobre desmatamento e outras mudanças no uso da terra. A modelagem inédita possibilitou projeções das emissões de gases de efeito estufa em todos os setores da economia.  

A jornalista viajou a convite da Fundação Rosa Luxemburgo.

Edição: Rebeca Cavalcante