CPI em Porto Alegre

Líderes sindicais explicam como privatização da Equatorial Energia impactou serviços prestados

Quadro de técnicos diminuiu drasticamente e os profissionais não recebem mais qualificação adequada, afirmam lideranças

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Comissão Parlamentar de Inquérito da CEEE Equatorial ouviu representantes de sindicatos na Câmara de Vereadores de Porto Alegre - Foto: Ederson Nunes/CMPA

Representantes sindicais foram ouvidos na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a atuação da CEEE Equatorial na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, na quinta-feira (11). Eles foram sabatinados por vereadores e destacaram a redução do quadro de trabalhadores qualificados para a prestação do serviço após a privatização da empresa.

O presidente do Sindicato dos Eletricitários do RS (Senergisul), Antonio Silveira, pontuou que antes da privatização a CEEE Distribuidora tinha em torno de 2,2 mil trabalhadores, número que foi reduzido em 998 por meio de um Plano de Demissão Voluntária (PDV) realizado pela concessionária ao assumir a administração.

“Os que restaram, no último acordo que fiz com a empresa, tinham 600 trabalhadores. Lhe afirmo com certeza, a maioria destes trabalhadores, mais de 90%, não fazem atendimento ao cliente. Fazem fiscalização, acompanhamento, mas não trabalham na linha de frente. A maioria foi desligada no PDV ou estão sendo demitidos. A Equatorial ainda continua demitindo os trabalhadores com experiência", disse.

Segundo o presidente do sindicato, não há um processo de qualificação e capacitação dos eletricitários terceirizados que atuam nas ruas. Ele lembrou que, na época da CEEE pública, os eletricitários passavam por processos de capacitação prática de, no mínimo, três anos, e cursos de formação com duração de cerca de 400 horas.

Em relação à pergunta sobre a carga horária, relatou que foi instituído o banco de horas com a privatização, o que tem gerado reclamações diárias por parte da categoria, devido às jornadas de trabalho extensivas e exaustivas, chegando até 16 horas de trabalho em alguns casos. Sobre os veículos, segundo Silveira, “a Equatorial não tem caminhões próprios, são os antigos da CEEE. Muitos não têm condições necessárias para fazer o atendimento ao cliente”, e que os trabalhadores ficam sem equipamento adequado para realizar os serviços.

Problemas com a empresa terceirizada

Uma das questões feitas ao dirigente sindical foi a avaliação do sindicato quanto à empresa Setup, terceirizada que realiza o trabalho de manutenção nas ruas e da qual eram funcionários alguns eletricistas que foram a óbito durante o serviço recentemente. Ele disse que a empresa foi contratada assim que a CEEE foi privatizada e que, desde o início, havia problemas trabalhistas, como greves por falta de pagamento dos salários.

Informou que o Senergisul, apesar de não ser o sindicato que representa diretamente estes trabalhadores, tem levado as denúncias trazidas pelos funcionários da Setup, como a falta de treinamento e capacitação para o exercício de atividades complexas e de alta periculosidade, o que acabou por gerar mortes.


Presidente do Sindicato dos Eletricitários do RS (Senergisul), Antonio Silveira / Foto: Ederson Nunes/CMPA

Segundo Silveira, no final de 2023 o sindicato recebeu um relatório do Ministério do Trabalho de investigação sobre os óbitos, em que consta a prova da fraude na capacitação de diversos trabalhadores da Setup. Em relação a um acidente que aconteceu recentemente em Porto Alegre, em que um eletricista caiu da escada quando fazia manutenção, o presidente do sindicato destacou que o funcionário era o “campeão de metas”.

Para ele, o sistema de metas em um serviço de alto risco como o setor elétrico é um potencializador dos casos de acidentes e óbitos que aconteceram. Quanto à terceirização da manutenção, ele afirmou que “o atendimento é todo terceirizado, falta conversa, os funcionários não se comunicam”, e completou que o trabalho da Equatorial “é o cúmulo da terceirização”, apesar de ponderar que não é totalmente contra a terceirização.

A testemunha também fez uma análise com relação à concessão e a prestação de serviços públicos. “No setor elétrico e no saneamento, a gente não tem concorrência, é monopólio. A gente fica refém de uma concessionária, se ela prestar um mau serviço, se os órgãos fiscalizadores não tomarem uma atitude, o cliente vai ficar refém daquela concessionária”, observou. Segundo ele, a opinião do sindicato é que a atividade fim tem que ser própria, prestada pelos funcionários da empresa.

Redução de mais de metade dos engenheiros

O diretor do Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul (Senge-RS), Diego Mizette Oliz, representando o presidente do sindicato, que não pode comparecer por motivos de saúde, também foi ouvido pelos vereadores. Ele pontuou também a brusca redução no quadro técnico da empresa. “Nós tínhamos no quadro da CEEE 85 engenheiros representados [no sindicato], esse quadro reduziu pra 22 engenheiros. Hoje chega a 32, com os engenheiros contratados pela Equatorial”, explicou.

Questionado sobre o Programa de Demissão Voluntária (PDV) que tirou 998 profissionais da CEEE Equatorial, Oliz avaliou que houve um decréscimo considerável na qualidade da prestação do serviço. “Se perdeu parte da engenharia, parte da técnica, nenhum desses profissionais [demitidos] tinha menos de onze anos de experiência”, avaliou. Ele apontou os déficits na rede, fora os eventos climáticos, e que Porto Alegre tem mais de 1 milhão de consumidores, o que demanda maior atenção por parte da empresa.


Diretor do Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul, Diego Mizette Oliz / Foto: Ederson Nunes/CMPA

CPI na Assembleia

Falta somente uma assinatura para que a presidência da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (ALRS) receba o requerimento de abertura de uma CPI para também investigar as recorrentes falhas das distribuidoras de energia elétrica no estado. Embora venha sendo chamada de CPI da Equatorial, que é responsável pela distribuição de energia para a Capital, Litoral e região Sul, o requerimento se destina a analisar também a área de concessão da RGE Energia, responsável por 65% da distribuição de energia no estado.

Líder e vice-líder do Partido dos Trabalhadores (PT), os deputados Luiz Fernando Mainardi e Miguel Rossetto estão colhendo assinaturas dos colegas de parlamento desde o início do ano. São necessárias, no mínimo, 19 assinaturas para protocolar a proposta de CPI. Não assinaram o pedido as bancadas do PSDB, MDB, PP, PDT, PSB, União Brasil, PRD, PSD, Podemos e Novo. Dessas, apenas o Novo não integra a base do governo de Eduardo Leite (PSDB).

Deputados recorrem ao Ministério de Minas e Energia

Em outro movimento, as bancadas do PT e PCdoB encaminharam ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na quarta-feira (10), documento solicitando a averiguação do descumprimento sistemático de cláusulas contratuais por parte da empresa CEEE Equatorial no estado e requisitando que sejam tomadas as medidas legais cabíveis ao caso. O texto resgata episódios nos quase três anos em que o Grupo Equatorial deixou de atender os consumidores dentro dos padrões mínimos exigidos pela legislação.

Para deputado Mainardi, além da péssima prestação de serviços, a CEEE Equatorial também tem causado prejuízo a diversos setores da economia, no campo e na cidade. “Queremos investigar quais são as responsabilidades da empresa. Que o ministro olhe e tome decisões. Ele pode até procurar a Aneel e pode pedir a cassação da concessão.”

O documento afirma que os eventos climáticos que atingiram o Rio Grande do Sul nos últimos meses, agravaram um quadro de péssimos serviços que já vinham sendo registrados. Aponta que a empresa não responde aos consumidores, não cumpre prazos, não tem um sistema de recebimento de reclamações e solicitações por meio digital, eficiente e não cumpre nenhuma meta de qualidade estabelecida em contrato.

* Com informações da Câmara de Vereadores e ALRS


Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Marcelo Ferreira