DIREITOS HUMANOS

Óbitos suspeitos, violência, tortura: cresce o número de violações nos presídios de Minas Gerais

Cerca de 775 denúncias foram registradas em 2023 nas 43 prisões do estado, um aumento de 21% em relação a 2022

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Espancamentos, afogamentos, violência psicológica, óbitos suspeitos e uso desproporcional e inadequado de armamentos estão entre as ações denunciadas - Foto: Marcelo Casal Jr./ Agência Brasil

O número de violações de direitos humanos no sistema prisional de Minas Gerais aumentou, segundo o relatório anual de atividades do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de MG (Conedh). Foram registradas 775 denúncias em 2023, um aumento de 21% em relação a 2022, quando foram registradas 638 ocorrências. 

Na avaliação da deputada estadual Andreia de Jesus (PT), presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o cenário é trágico. “Existe uma cultura de violências e violações de direitos humanos no sistema prisional de Minas Gerais”, afirma.

Segundo ela, há um quadro generalizado de práticas de tortura sistemáticas, com espancamentos, afogamentos, violência psicológica, óbitos suspeitos e uso desproporcional e inadequado de armamentos menos letais, além de outras formas de tratamento cruel e desumano. 

A parlamentar destaca ainda outras violações contra a população carcerária, como situações de fome, comida inadequada para consumo, falta de água, incomunicabilidade, superlotação e total desassistência à saúde.

O Conedh contabilizou denúncias de cerca de 43 carceragens, com o Presídio Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves, em primeiro lugar, com 169 denúncias, e a Penitenciária Nelson Hungria, de Contagem, em segundo, com 141. 

Presidente do conselho, Robson Souza alerta ainda que cerca de dez presos morreram em unidades prisionais de Ribeirão das Neves pela chamada droga K, o que acende um alerta sobre o acesso dos presos a essa substância.

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) investiga mais duas mortes de presos que cumpriam pena na Grande Belo Horizonte. No entanto, ainda não foi possível afirmar se elas têm relação com o uso das drogas K. 

“É um problema sério que pode ser inclusive de corrupção dentro do próprio sistema”, sinaliza Souza. 

Atualmente, grande parte das unidades prisionais de Minas está superlotada, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Na capital e na Região Metropolitana, por exemplo, entre 21 penitenciárias, presídios e centros de remanejamento inspecionados pela Justiça, 16 têm mais presos do que vagas. 

Além disso, o CNJ também aponta que 69% dos 218 presídios do estado estão em condições regulares, ruins ou péssimas.

Gestão ineficaz 

Para Andréia de Jesus, o aumento das denúncias está relacionado à má gestão do sistema prisional do estado. 

“O governador Zema não possui nenhuma preocupação com a população carcerária de Minas e desconhece as regras mínimas das Nações Unidas para o tratamento de pessoas presas”, pondera. 

A parlamentar também observa que existe uma ausência de controle sobre o uso da força nas unidades prisionais, com denúncias de maus-tratos tratadas internamente, a partir de comissões técnicas disciplinares executadas na própria unidade. Esse fator, segundo ela, gera arbitrariedade disciplinar. 

Um outro problema citado pela deputada é a atuação do Grupo de Intervenção Rápida (GIR), que, segundo relatos recebidos pela comissão, é extremamente truculenta.

“Além disso, há precariedade do trabalho, com a contratação de servidores temporários, sem recomposição dos quadros das carreiras, falta de reajuste salarial e déficit de funcionários das unidades. Temos um cenário de equipe técnica já ter recebido voz de prisão de policiais penais. É uma catástrofe a gestão do sistema prisional no estado”, critica. 

De acordo com a deputada, as práticas de tortura e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes está presente nas unidades de maneira estrutural e não apenas atrelada às ações de um grupo específico ou de determinados servidores. 

Indenização a vítimas de tortura

Além das graves denúncias de violações nas unidades prisionais do estado, o relatório também questiona o não pagamento de indenização às vítimas de tortura praticada por agente do estado, determinado pela lei nº 13.187, de 20/01/1999.

A coordenação da Comissão Especial de Indenização às Vítimas de Tortura (Ceivit) construiu o levantamento dos pagamentos realizados no período de 2002 a 2018 para subsidiar a avaliação da política estadual de reparação às vítimas.

Em MG, desde o governo de Itamar Franco, a comissão recebe uma série de pedidos, que eram atendidos gradativamente até o início do primeiro mandato do governador Romeu Zema (Novo), que não deu sequência aos pagamentos. 

“Nossa expectativa é que o governo do estado volte a pagar o passivo de vítimas e familiares de vítimas que ainda guardam indenizações já deferidas pelo Conedh e que o governo publique as últimas deliberações que foram aprovadas pela Ceivit e ratificadas pelo conselho”, pontua. 

Segundo o relatório, MG apresenta uma baixa taxa de reparação em relação a outros estados que mantêm uma política indenizatória parecida. Em São Paulo, por exemplo, a comissão realizou o pagamento de 1.851 indenizações, frente a um universo de 2.214 pedidos protocolados. No Rio Grande do Sul, 1.670 pagamentos foram feitos, diante de 1.704 pedidos de indenização. Em MG, apenas 585 indenizações foram pagas desde 2002.

Outro lado

O Brasil de Fato MG entrou em contato com o governo para comentar as denúncias, mas até o momento de publicação desta reportagem não obteve respostas. O espaço segue aberto para manifestações.

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Fonte: BdF Minas Gerais

Edição: Leonardo Fernandes