Em mais uma ação violenta da Polícia Militar (PM), com apoio de fazendeiros, cerca de 100 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) foram retiradas de uma área ocupada em Monte do Carmo (TO), 24 horas depois de montarem acampamento no local.
De acordo com nota enviada pelo MST, os acampados estavam em uma área grilada por latifundiários, dentro do assentamento Taboca, na Serra do Taquaruçu.
O despejo, realizado na noite desta quinta-feira (17), foi conduzido sem mandado judicial, ainda de acordo com o texto. Além dos fazendeiros, os policiais receberam apoio de pistoleiros fortemente armados, de acordo com denúncias de militantes vítimas da ação, que resultou na detenção de 23 pessoas.
O grupo chegou na área quando as famílias estavam jantando. “Eles chegaram juntos, a polícia, os fazendeiros e os jagunços, com armas nas mãos, apontando pra gente como se fôssemos criminosos”, relata uma das vítimas.
Sob a mira de fuzis, os acampados foram retirados da área. “O pessoal foi levado até a delegacia as caminhonetes dos fazendeiros”, conta outra vítima.
Um homem teria sido ameaçado de morte. De acordo com a denúncia, os fazendeiros destruíram pertences das famílias e chegaram a incendiar um barracão onde seria realizada uma plenária. O que restou dos pertences das famílias foi deixado na calçada, diante da delegacia.
A investida não poupou nem as crianças. Um dos policiais teria ameaçado diretamente: “Se não disserem quem está liderando isso, as crianças vão pagar pelos adultos”, relata um dos acampados.
Os detidos foram levados à Central de Flagrantes do 5º Distrito Policial de Taquaralto. No trajeto, segundo os relatos das vítimas, o comandante da operação enviava áudios comemorando a ação e, em certo momento, solicitou um pagamento via Pix. “Mais um indício de articulação privada para fins de repressão violenta a um movimento social legítimo”, aponta a nota.
As famílias registraram boletim de ocorrência contra os policiais e jagunços por dano e ameaça.
“Não se tratou de uma reintegração de posse, mas de um ataque criminoso à luta por Reforma Agrária. Um ataque à vida, à legalidade e ao sonho de centenas de famílias que resistem pela terra que é do povo”, afirmou uma das vítimas.
Fazenda sobreposta à área teve título cancelado
A área em disputa é marcada por irregularidades fundiárias já reconhecidas oficialmente pelo Ministério Público Federal (MPF).
Em outubro de 2023, a Procuradoria da República no Tocantins instaurou um procedimento administrativo para monitorar a atuação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na destinação do lote 14, porção de terra de 700 hectares no Loteamento Serra do Taquaruçu — área pública arrecadada para a criação do Projeto de Assentamento Taboca.
Segundo o MPF, diligências resultaram no cancelamento do título e da matrícula de uma fazenda que sobrepunha o Lote 14, reconhecendo a destinação legítima da terra para a reforma agrária. Ainda assim, o processo de avaliação e efetiva destinação pelo Incra permanece inconcluso, o que favorece a continuidade da grilagem e a ação arbitrária de grandes proprietários da região.
A ação do MST na área faz parte da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária Popular, realizada anualmente em todo o país no mês de abril, em memória ao massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido em 17 de abril de 1996, quando 21 trabalhadores rurais foram assassinados pela Polícia Militar do Pará, durante uma marcha organizada pelo movimento.
O Brasil de Fato entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública de Tocantins por meio de endereço de e-mail disponibilizado no site, mas não obteve resposta até a publicação deste texto. Caso um posicionamento seja enviado, o texto será atualizado.