No coração de Belo Horizonte, histórias de dor, superação e esperança se entrelaçam diariamente em um espaço onde o acolhimento é a principal ferramenta de transformação. Pelo menos esse é o objetivo do projeto Canto da Rua, que dá outro significado à vida das pessoas em situação de rua da capital mineira.
Por lá, o número alarmante dessa população, que aumenta a cada dia mais, encontra a força para diminuir. Idealizado durante a pandemia, o projeto, que tem sede no bairro Santa Inês, na região leste da cidade, tem várias frentes de atuação, como geração de trabalho e renda, moradia, documentação e memória; e também educação, cultura, lazer e turismo, como reforça José Ribeiro Gomes, coordenador do projeto.
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“A gente atende, por dia, aqui, em torno de 50 a 100 pessoas que passam para se organizarem, tomar um banho, tomar um café, comer um pão e também para serem encaminhadas aos eixos de atuação da central, que é a carteira assinada, a elaboração de um cadastro biopsicossocial para entender esse sujeito em sua sua totalidade e também criar conjuntamente o seu plano de vida de superação das ruas de Belo Horizonte”, descreve.
Iniciativa é diversa e inclusiva
O Canto da Rua está no guarda-chuva de uma associação maior: a Pastoral Nacional do Povo da Rua, que existe desde 1987 em várias cidades do Brasil.
Em BH, além da sede, no bairro Santa Inês, o projeto também se espalha por outros cantos da cidade, onde as ações ganham corpo. No bairro Dona Clara, um grupo de economia solidária ligado ao projeto mantém uma minifábrica artesanal de produtos de limpeza.
Já no bairro Lagoinha, funciona o “Amigos da Rua”, um mini ateliê de economia solidária que trabalha com costura criativa. No Mercado Novo, no centro de BH, a loja Canto da Rua funciona como uma vitrine de tudo que é produzido por esses grupos.
Diante das inúmeras ações, histórias de vida são transformadas. José do Carmo Silva, por exemplo, participa do projeto desde 2024. Atualmente, ele faz um curso de panificação oferecido pela iniciativa, algo que considera fundamental para o seu desenvolvimento enquanto pessoa que já teve a trajetória marcada pelas ruas.
“Para mim, está sendo muito importante. É um curso, é um novo aprendizado, é uma área que me dá muitas oportunidades no campo do emprego e creio que é muito bom para mim e para as outras pessoas que também estão participando”, avalia.
Lugar de transformações
Segundo o Polos de Cidadania da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a região Sudeste concentra 63% da população em situação de rua de todo o Brasil. Só em Belo Horizonte, o número fica acima de 14 mil.
Diante desse desafio, o Canto da Rua ganha ainda mais importância. Pelo menos é o que conta Thaís Nonato, que viu sua vida mudar quando foi retirada das ruas pelo projeto e que, hoje, ocupa o lugar de agente social, que tem a função de ajudar a levar pessoas com a mesma experiência a conhecer a iniciativa.
“O projeto transformou a minha vida quando eles foram na rua me achar e começaram a fazer um cuidado, principalmente na redução de danos, porque eu usava muita droga. Estar na rua é uma etapa sem recursos para a vida. A gente está num mundo apagado, invisível, totalmente emparedado com a sociedade, com a política pública. Quando eu estou na rua, eu não existo para ninguém”, lamenta.
Para ela, a discriminação direcionada às pessoas em situação de rua é fatal e precisa ocupar um espaço nas discussões sociais, para que haja uma mudança, como essa promovida pelo Canto da Rua.
“O suicídio da gente é começar a entrar no álcool e outras drogas. E a pastoral chegou me explicando que não era esse o melhor caminho”, recorda.