O escândalo de fraudes no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) tem sido explorado pela grande imprensa como mais uma crise no colo do governo Lula (PT), mas, para o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, é importante lembrar que trata-se de um episódio iniciado no governo Bolsonaro (PL). Em entrevista ao Conexão BdF, do Brasil de Fato, Ramirez defendeu a necessidade de uma resposta mais clara por parte do Executivo e alertou para os riscos de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que ignore a origem do esquema.
“Por enquanto, tudo que boa parte dos grandes jornais têm passado, televisivos, escritos e radiofônicos, é que o governo Lula teria dado continuidade e teria abraçado essa causa, o que não é verdade”, disse. Segundo ele, é essencial que o Executivo esclareça se houve ou não continuidade do esquema, desde o momento em que assumiu, e se foram abertas investigações internas.
“O governo precisa dizer exatamente o que aconteceu para dar uma resposta aos grandes meios de comunicação que têm jogado nas costas do governo Lula toda a responsabilidade, o que não é verdade, e se há ou não há algum grau de participação do [ministro Carlos] Lupi. Aparentemente não há”, completou. O especialista caracterizou esse movimento de responsabilização do governo atual como uma “fraude da fraude”.
Para ele, uma CPI deve criar instabilidade no governo, mas também pode ser “um tiro no pé” da oposição “porque toda investigação tem que começar pelo começo”, argumentou. Ramirez relembrou que os descontos fraudulentos começaram ainda no governo Bolsonaro, quando o INSS estava vinculado ao Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes. Por isso, segundo ele, há chances de que a própria oposição recue da tentativa de instalar uma CPI.
“À medida que as investigações avançam, as raízes do problema começam a se apresentar”, disse. Para o cientista político, caso avance, a CPI pode repetir o padrão da comissão sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), que não gerou consequências concretas. “É mais para fazer estardalhaços, é o desespero da direita. A direita bolsonarista está com as mãos sujas nessa história”, afirmou.
O professor chamou atenção também para a pressão política que o caso vem gerando sobre o ministro Carlos Lupi (PDT), responsável pela pasta da Previdência Social, e os riscos de instabilidade no cenário pré-eleitoral. “Algumas lideranças do PDT já disseram que, caso o Lupi seja afastado, o partido pode sair integralmente do apoio ao governo Lula”, alerta.
“Esse é o grande problema. Estamos a um ano da eleição, e ela vai ser difícil, até porque a direita tende a formar uma unidade reacionária e conservadora. Por isso, é necessário que Lula consiga angariar todo tipo de apoio, principalmente do PDT, que é um partido relativamente alinhado com as pautas petistas, entre elas, a defesa do trabalho”, avalia.
Centrão formaliza o que já era prática
A federação entre União Brasil e Progressistas (PP) também foi abordada na entrevista. Para Ramirez, a aliança apenas reforça o modus operandi histórico do centrão, que opera como uma “máquina de usurpação da máquina pública”, sem compromisso com projetos de país ou coerência ideológica.
“Esses partidos de centro nunca se preocuparam em ser governo, mas sim em estar com qualquer governo, para se beneficiar de cargos, verbas e contratos. Apoiam Deus e o diabo”, ironiza.
O professor lembra que esse grupo sustenta seu poder a partir de redes de influência regionais e interesses oligárquicos. “É a verdadeira mamata do poder público. E nenhum presidente, seja Lula ou Bolsonaro, conseguiu neutralizar esse poder.”
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