A celebração do Dia dos Trabalhadores no 1º de Maio possui um longo legado de luta que atravessa a história mundial desde o século 19 até os dias de hoje. E na história da Rússia não poderia ser diferente. Com o apogeu e a queda dos processos revolucionários no século 20, entre insurreições, festividades e rituais de Estado, o Dia dos Trabalhadores teve variadas formas de manifestação antes, durante e depois do período soviético.
Antes do triunfo bolchevique em 1917, os ares pré-revolucionários já davam ao feriado um caráter especial, tornando 1º de Maio um palco regular de manifestações, greves e revoltas contra a vigência do Império Russo.
O primeiro registro histórico da celebração da solidariedade internacional à classe operária durante o Império Russo foi em 1890, quando 10 mil trabalhadores participaram de uma greve em Varsóvia (ainda parte do Império Russo). Depois em 1891, na então capital São Petersburgo, cerca de 200 revolucionários organizaram o primeiro ato ilegal de 1º de Maio.
Assim, nas décadas seguintes a força do feriado foi aumentando cada vez mais na medida em que se intensificavam as agitações políticas e os movimentos revolucionários na Rússia.
Em 1912, 400 mil trabalhadores participaram de greves e manifestações no Dia do Trabalhador. Um ano depois, este número aumentou para 420 mil; em 1914 até 500 mil trabalhadores, camponeses, soldados e marinheiros participaram de greves e manifestações.
Estas manifestações eram marcadas por reivindicações por uma jornada de trabalho de 8 horas, confisco das terras dos proprietários e a derrubada da autocracia czarista.
Força bolchevique
Já em 1917, após a vitória da Revolução de Fevereiro, o 1º de Maio foi celebrado pela primeira vez de forma legal com as palavras de ordem “Abaixo a guerra imperialista!” e “Todo o poder aos sovietes!”, dando o tom do que viria a ser o triunfo dos bolcheviques em outubro daquele ano e que determinaria os rumos da história da Rússia e do mundo ao longo do século 20.
Após a Revolução de Outubro, o 1º de Maio passou a ser declarado feriado nacional e recebeu o status de uma das principais datas do país – junto com o aniversário da Revolução – ao longo de todo o período soviético, ganhando um caráter de ritual de Estado, com massivas marchas, paradas militares e festividades oficias em homenagem à classe trabalhadora.
Neste contexto, com o passar das décadas – e com o progressivo avanço econômico da União Soviética -, as marchas do 1º de Maio foram aumentando de escala. A magnitude das decorações festivas, o poderio militar e a adesão popular fizeram da Praça Vermelha, em Moscou, o coração das comemorações dos trabalhadores e trabalhadoras na URSS.
Para além de uma mera celebração, o feriado servia aos propósitos das autoridades demonstrar a vitalidade do povo soviético ao mundo, mas também comunicar ao próprio povo a força do Estado socialista frente às potências capitalistas. Em 1933, por exemplo surgiu a tradição dos desfiles aéreos. Foi justamente nas celebrações do 1º de Maio que a aeronave Maxim Gorky, o I-16 e outras conquistas da indústria da aviação soviética foram mostradas ao mundo. Estes desfiles aéreos foram realizados em todas as comemorações do feriado (exceto durante a Segunda Guerra Mundial) até 1968.

Pós-guerra e pela paz
Já na década de 1970, os desfiles militares foram substituídos por marchas mais numerosas de trabalhadores, dando protagonismo às grandes bandeiras e faixas que carregavam palavras de ordem em nome da paz mundial e dos trabalhadores. Um dos slogans mais famosos das manifestações deste período era “Paz! Trabalho! Maio!”, uma adaptação do poema de Maiakovski “A Bandeira Solar”.
Foi também durante os feriados de 1º de Maio que a União Soviética aproveitou a oportunidade de abrir as fronteira aos aliados internacionais e comunicar o internacionalismo dos ideais soviéticos, recebendo em Moscou representantes dos países da América Latina, África, Ásia e Oriente Médio.
Apesar de princípios ideológicos muito claros que impulsionaram as celebrações promovidas pelas autoridades soviéticos ao longo do século 20, o 1º de Maio também nunca deixou de ter um aspecto festivo muito forte, sendo motivo para o encontro de amigos durante as marchas, eventos com muita música, dança e comidas tradicionais ao ar livre.
‘Dia da Primavera e do Trabalho’
A transformação da data, tão carregada de significados políticos ao longo de toda a história, teve mais um capítulo marcante em que o próprio sentido do feriado refletiu as mudanças políticas do país. Em meio ao processo da dissolução da União Soviética, a comemoração do 1º de Maio perdeu o caráter ideológico e, consequentemente, a importância do feriado – antes promovido pelo Estado – diminuiu.
A partir de então, o feriado passou por um forte processo de despolitização e hoje é uma data apenas de aspecto festivo, quando os russos aproveitam o anúncio da primavera para viajar e descansar, principalmente até o feriado do dia 9 de maio, o Dia da Vitória, que celebra a derrota da Alemanha nazista na 2ª Guerra Mundial.

Os significados políticos ainda existem, mas passaram a ser lembrados por grupos mais restritos, normalmente ligados ao Partido Comunista do país, promovendo passeatas com símbolos que remetem à URSS e por demandas trabalhistas.
Esse processo pode ser percebido na própria mudança de nomenclatura do feriado, pois se no período soviético o 1º de Maio era considerado o “Dia da Solidariedade Internacional dos Trabalhadores”, a partir de 1992, após o fim da URSS, a data passar a ser chamada de “Dia da Primavera e do Trabalho”.