O governador da Paraíba, João Azevêdo (PSB), anunciou nesta segunda-feira (19) a realização do primeiro concurso público da história da Secretaria de Estado da Cultura da Paraíba (Secult-PB). Serão ofertadas 33 vagas para áreas diversas da cultura, como música, teatro, artes visuais, audiovisual, literatura, dança, além de setores ligados ao patrimônio cultural, como arqueologia, paleontologia e museologia.
A medida marca um avanço histórico na valorização das políticas públicas culturais no estado, promovendo a profissionalização e a continuidade das ações culturais para além de gestões pontuais. Até então, a secretaria era composta, majoritariamente, por servidores comissionados ou contratados temporariamente, o que também afetava a memória institucional e a execução de projetos complexos, como restaurações, musealizações e levantamentos patrimoniais.
O edital será publicado no Diário Oficial do Estado nesta terça-feira (20). A taxa de inscrição será de R$ 120.
O que é a Secretaria de Estado da Cultura da Paraíba (Secult-PB)?
A Secult-PB é o órgão responsável por formular, implementar e coordenar políticas públicas voltadas à promoção, preservação e difusão da cultura em toda a Paraíba. Entre suas atribuições estão o apoio a artistas e grupos culturais, o fomento à produção cultural, a gestão de museus, arquivos, bibliotecas públicas e a salvaguarda do patrimônio imaterial e material do estado.
Criada com o objetivo de estruturar o campo cultural na Paraíba, a secretaria tem ampliado suas ações nos últimos anos, mas sempre enfrentou desafios ligados à carência de pessoal técnico especializado e à descontinuidade de políticas. O concurso é um passo importante para consolidar sua atuação.
Concurso fortalece políticas culturais e gera estabilidade profissional
Ao anunciar o concurso, João Azevêdo destacou a importância de formar um quadro permanente de profissionais capacitados para atender às crescentes demandas do setor. Segundo ele, o estado tem investido na abertura de novos museus, centros culturais e programas de fomento, e precisa de especialistas para acompanhar esse crescimento.
Entre os cargos ofertados estão analistas de gestão cultural em diferentes linguagens artísticas, além de especialistas como antropólogos, museólogos, historiadores, restauradores, arquivistas e bibliotecários. “É fundamental que a gente precise destes profissionais e quero colocar no estado uma equipe nesta direção, paleontólogo que também é uma demanda que existe nas obras muitas vezes que nós fazemos, precisamos de paleontólogo, restaurador, arquivista, analista bibliotecário, historiador”, afirmou o governador, através da Secom-PB.
As 33 vagas contemplam um leque amplo de atuações culturais. Há oportunidades para analistas culturais nas áreas de música, teatro, circo, dança, audiovisual, literatura e artes visuais; antropólogos, arqueólogos e paleontólogos, essenciais em escavações e obras públicas; museólogos e restauradores, fundamentais para a gestão de museus e conservação de bens culturais; arquivistas, bibliotecários e historiadores, responsáveis pela preservação da memória e do conhecimento.
Esses profissionais serão distribuídos em diferentes equipamentos e projetos da Secult-PB, com atuação prevista em todas as regiões do estado.
Carência de profissionais efetivos
Segundo dados do Ministério da Cultura, menos de 10% dos estados brasileiros realizaram concursos específicos para a área nos últimos 10 anos. A carência de profissionais efetivos compromete a continuidade de programas e políticas culturais estruturantes.
No caso da Paraíba, o concurso surge como uma resposta estratégica à necessidade de qualificar os quadros técnicos da Secult-PB e garantir a execução de políticas culturais de longo prazo. A medida também representa uma oportunidade de geração de emprego qualificado e de reconhecimento das diversas profissões ligadas à cultura.
Para Caio Ceragioli, integrante do Fórum de Teatro de João Pessoa e do Fórum dos Fóruns de Cultura da Paraíba, está mais do que comprovada a necessidade de um concurso: “Eu acho que, de uma maneira geral, é importante o concurso público para que se tenha funcionários de carreira, concursados, e para sair um pouco dessa lógica do ‘puxadinho’ que às vezes rola na cultura em geral. Ou seja, quais são os estados que têm concursados e precisam caminhar. Mas eu acho que esse concurso é o primeiro passo de uma longa caminhada para avançar na Secretaria de Cultura — ainda mais com os recursos que estão vindo do governo federal”, comenta.
Ele ainda pontua que há uma falta de estrutura para conseguir gerir muitos recursos federais bem como também desenvolver as políticas culturais com recursos próprios. “A gente vem percebendo a dificuldade: inúmeros fatores, constantes atrasos nos editais, problemáticas, falta de entendimento até sobre coisas básicas como a Lei de Cotas, vários atropelos, uma execução caótica como por exemplo o ‘Sala de Arte”.
O setor cultural representa uma fatia significativa da economia brasileira. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua) do IBGE, mais de cinco milhões de pessoas atuam no setor cultural no país, incluindo atividades formais e informais. Já o relatório da Fundação João Pinheiro mostra que a cultura representa cerca de 2,6% do PIB nacional.
Na Paraíba, os investimentos em cultura cresceram nos últimos anos. Em 2024, o estado e seus 223 municípios executaram 95,5% dos recursos recebidos do Governo Federal por meio da Lei Paulo Gustavo, totalizando R$ 89,16 milhões. Desse montante, R$ 64,27 milhões foram destinados ao setor audiovisual e R$ 24,89 milhões a outras áreas culturais, como música, dança, pintura, escultura e artes digitais. Os editais estaduais como o REMA – Lei Canhoto da Paraíba; Edital Prêmio Patrimônio Vivo; Prêmio Culturas Populares; Prêmio Pontos e Pontões de Cultura da Paraíba e muitos outros. A ampliação da infraestrutura, com novos museus e centros de cultura, exige agora uma equipe técnica qualificada para assegurar a continuidade das ações.
Alexandre Santos, gestor cultural e pesquisador do Observatório de Políticas Culturais da Paraíba (ObservaCult-UFPB) também comenta o edital:
“A realização do primeiro concurso da história da Secult-PB é um marco e anima a todos nós que fazemos o setor cultural na Paraíba. Ao realizar este concurso, a Secult-PB não apenas fortalece a gestão pública da cultura em si, como também o Sistema Estadual de Cultura e toda a cadeia de políticas públicas que ela desenvolve.Possuir um quadro técnico de servidores efetivos permite a continuidade dos processos administrativos, fluxos e políticas do órgão, à medida que se garante a estabilidade do quadro de servidores que atuará no órgão a longo prazo. Além disso, também é importante por ampliar a capacidade de processamento, elaboração e implementação das políticas públicas, tendo em vista que o setor cultural é complexo e diverso, o que exige servidores especializados para tratar da ampla demanda existente”.
Certame e todos os detalhes
O edital do concurso da Secretaria de Estado da Cultura da Paraíba será publicado no Diário Oficial do Estado nesta terça-feira (20). A taxa de inscrição será de R$ 120. Informações como datas de provas, conteúdo programático, requisitos para os cargos e cronograma completo estarão disponíveis no documento.
O concurso será organizado por banca ainda não divulgada, e o processo seletivo deverá incluir provas objetivas e, possivelmente, etapas práticas ou de títulos, dependendo da função. Mais detalhes devem ser esclarecidos nos próximos dias pelo governo.
Expectativas e alinhamentos
O concurso deverá ajudar a melhorar pontos críticos de atuação da Secretaria de Cultura no estado, como, por exemplo, a centralização das ações culturais na capital, João Pessoa. Diversos agentes culturais do interior denunciam que editais e programas da secretaria não chegam com a mesma força às regiões do Sertão, Agreste e Brejo.
Além disso, a escuta institucional é limitada, e espaços como o Conselho Estadual de Política Cultural são considerados pouco atuantes ou com representatividade restrita. A execução das políticas culturais enfrenta dificuldades como a lentidão na operacionalização de programas e editais, atrasos na aplicação da Lei Paulo Gustavo e da Lei Aldir Blanc, excesso de burocracia e dificuldade na prestação de contas — barreiras especialmente relevantes.
A lentidão também se estende a processos de tombamento e inventário patrimonial, importantes para a proteção do acervo cultural do estado.
A ausência de relatórios públicos anuais com dados sobre investimentos por área, município ou grupo social dificulta o controle social e a correção de desigualdades históricas no acesso à política cultural. Soma-se a isso a fragilidade na preservação do patrimônio histórico, arqueológico e paleontológico. O número reduzido de especialistas disponíveis para acompanhar obras e escavações coloca em risco importantes sítios e acervos.
“Que seja um primeiro passo de uma estruturação que ainda vai levar um tempo, mas que essa primeira leva já contribui significativamente para a cultura paraibana. E ele tem um foco mais quantitativo, com maior número de profissionais para a área de patrimônio e arqueologia, o que também supre uma carência muito grande. Espero que a gente consiga avançar”, conclui Ceragioli.