A China e o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) foram os temas de um painel realizado na noite da última segunda-feira (26) no auditório da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grade do Sul (Faced/Ufrgs) com a participação dos professores Elias Jabour da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Isis Maia (Ufrgs). O evento foi uma promoção da Fundação Maurício Grabois/RS e teve a mediação do vereador Giovani Culau (PcdoB). Cerca de 400 inscritos lotaram o auditório e salas paralelas além de muitos assistirem pela internet.

Isis Maia falou sobre como a China retirou 800 milhões da pobreza extrema, tema de sua tese de doutorado, e Jabour contou de sua vivência de dois anos na China na direção do Banco dos Brics, acompanhando a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT). Ambos foram unânimes ao explicarem o rápido desenvolvimento social e econômico daquele país asiático: a direção estratégica e científica de um partido socialista, o Partido Comunista Chinês (PCC).

Maia contou que ao tomar conhecimento da retirada de 800 milhões de pessoas da linha de pobreza, em 2021, resolveu estudar o tema como tese de doutorado. “Foi o equivalente a quatro vezes a população brasileira, num processo de menos de 20 anos”, justificou a economista. “Descobri que a China tem uma tradição milenar de participação popular, atualmente a Conferência Consultiva do Povo Chinês que discute todas as medidas governamentais a serem tomadas, desde a menor aldeia camponesa até a vida nas maiores cidades”.
Segundo ela, no final do processo até mesmo a tecnologia das big techs foi utilizada para mapear a população mais pobre, cerca de 45 milhões que ainda viviam naquela condição. Um aplicativo foi desenvolvido para mapear e acompanhar a vida dessas pessoas. Isis contou ainda que uma metodologia utilizada pelo governo Lula para este trabalho no Brasil foi usada: o acompanhamento pré-natal das gestantes pobres nas unidades de saúde.
O socialismo não tem modelos acabados
Já Jabour, que estuda a China desde 1993, discorreu sobre sua preocupação para entender o fenômeno e classificá-lo. Professor de economia, ele inicialmente classificou o sistema chinês de “socialismo de mercado”. “Hoje troquei este conceito para apenas o de socialismo”, afirmou, lembrando das teses de Lênin sobre o papel do partido na construção do estado. Segundo ele, jamais um país ocidental construiria 45 mil quilômetros de ferrovias de alta velocidade em apenas 20 anos somente para atender a população mesmo tendo prejuízo financeiro. “Somente um estado preocupado com a condição de vida das pessoas faria esta façanha”, completou.

Ele lembrou que em 1978 o socialismo chinês se reinventava através de instituições de mercado. Nos países asiáticos as instituições foram usadas para otimizar o mercado. “O socialismo como o capitalismo cria seus próprios mercados. Conforme Jabour, ao usar inovações tecnológicas disruptivas o estado se apropriava disso e entregava para a sociedade. “Uma transferência intersetorial de recursos do setor superinvestidor para o setor subinvestido”, afirmou.
Ele colocou uma questão desafiadora: “Como a China efetuou a transferência de 200 milhões de pessoas do campo para a cidade sem a criação de cinturões de miséria ou nenhuma favela?”, indagou. Segundo ele, somente a direção e a vontade política de um partido poderiam ter realizado isso. “E isso remete a outra questão que já está clara quem sustenta o Partido Comunista Chinês é a sociedade chinesa”. Explicou que o partido, com seus 90 milhões de militantes entrega a sociedade tudo o que ela espera e precisa.
“Não é por acaso que segundo uma pesquisa realizada pela Universidade de Harvard, 90% dos chineses apoiam o PCChinês”, conclui.
Os dois palestrantes explicaram que socialismo não é nenhuma receita de bolo, mas que no Brasil, a exemplo da China, devemos criar soluções a partir de nossa história de nossas contradições, estudadas e pesquisadas cientificamente.
O Brics representa a multipolaridade
Falando sobre o papel do grupo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (Brics), Jabour explicou que este grupo de países, hoje ampliado, do qual o Brasil faz parte, é a prova da multipolaridade que deve existir no planeta e ressaltou que não é por acaso que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, iniciou a atual guerra de tarifas. Segundo o professor, a diplomacia brasileira deveria levar em conta o papel fundamental deste grupo em relação ao momento atual e se aproximar mais.
Jabour esteve durante dois anos trabalhando na direção do Banco do Brics e disse ter certeza de que esta disputa será ganha pelo bloco do Sul multipolar.
