Mais de 200 organizações sociais, ambientais e populares convocam um ato para este domingo (1º), em Belo Horizonte, contra o Projeto de Lei 2159/2021 — conhecido como “PL da Devastação”. A manifestação, que integra uma mobilização nacional, será realizada a partir das 9h, com concentração na Praça da Liberdade e caminhada até a Praça Sete, passando pela tradicional Feira Hippie, espaço estratégico pela grande circulação de pessoas.
O protesto visa alertar a sociedade sobre o que movimentos e especialistas consideram o maior retrocesso ambiental da história recente do país. O PL, aprovado pelo Senado na última semana, propõe mudanças profundas no licenciamento ambiental brasileiro, incluindo a possibilidade de auto-licenciamento para empreendimentos de médio porte, sem a necessidade de análise prévia dos órgãos ambientais.
A mobilização em Belo Horizonte contará com falas de representantes de diversos grupos, incluindo comunidades indígenas, movimentos de defesa de rios e matas, associações de bairro, além de performances artísticas e intervenções culturais. Entre as ações previstas está também uma homenagem e ato em defesa da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, alvo recente de ataques no Senado.
“São mais de 215 organizações assinando o manifesto, e essa lista não para de crescer. Isso expressa a beleza dessa diversidade que está profundamente vinculada à diversidade socioambiental que defendemos”, destaca Esther Maria, integrante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), uma das articuladoras do ato.
Defesa de Marina Silva como símbolo de resistência
Entre as pautas do ato, ganha destaque a manifestação de solidariedade à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que recentemente sofreu agressões verbais de parlamentares durante audiência no Senado. Para os movimentos, o ataque foi não apenas desrespeitoso à figura da ministra e à sua trajetória, mas um atentado à democracia e ao direito de debate qualificado sobre políticas ambientais no país.
“Todos e todas nós nos sentimos violentadas ao ver que a democracia está atravessada por esse tipo de linguagem rebaixada, que silencia não só uma mulher, mas as pautas que ela representa”, afirma Esther Maria.
Contradições do governo federal
Na avaliação dos movimentos, o contexto federal revela contradições profundas. Embora o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha se comprometido internacionalmente com a defesa da Amazônia e da pauta ambiental, setores aliados ao agronegócio e à mineração impulsionam a flexibilização das normas.
“A defesa da Amazônia do meio ambiente foi uma das grandes promessas de campanha. Então isso deu muita força simbólica, midiática para o governo Lula, internamente conseguiu agregar forças importantes de movimentos e povos que fazem a defesa do meio ambiente”, lembra.
“Por outro lado, o governo também foi formado a partir de uma base associada ao agronegócio, às mineradoras e a grupos que têm interesse nessa flexibilização na legislação ambiental”, sinaliza.
Ela ressalta ainda que a tramitação acelerada do projeto busca evitar um desgaste internacional à imagem do país, que sediará em breve a próxima Conferência das Partes (COP) da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas.
MG: território marcado por tragédias e ameaças
Para Esther Maria, o PL 2159/2021 tem impacto direto e alarmante em Minas Gerais, estado historicamente marcado por tragédias socioambientais como os rompimentos das barragens de Mariana e Brumadinho, classificadas, na época, como empreendimentos de pequeno e médio porte — exatamente o tipo que passaria a ter menos rigor sob a nova legislação.
“Quando falamos em afrouxar o licenciamento ambiental, estamos falando também das vítimas desses desastres, das 272 pessoas mortas em Brumadinho e das 19 em Mariana, e do princípio jurídico da não repetição. Estamos violando, enquanto Estado, o direito das comunidades à reparação e à segurança”, denuncia.
Além do aspecto simbólico, a flexibilização ambiental abre espaço para o avanço desenfreado de novos empreendimentos minerários e agrícolas. Esther denuncia a articulação entre o governo estadual, comandado por Romeu Zema (Novo), e setores empresariais como a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que impulsionam projetos de mineração no estado.
Segundo ela, Minas tem se tornado uma fronteira de expansão para o extrativismo, com a exploração de lítio no Vale do Jequitinhonha, o avanço sobre o nióbio e as terras raras em Araxá e o sul de Minas, além de novos projetos de ferro, que mostram a ofensiva sobre os territórios, muitas vezes atropelando o debate democrático e o direito das populações.
Defesa dos biomas: Mata Atlântica e Cerrado ameaçados
O protesto também chama atenção para a destruição acelerada dos biomas mineiros. Minas Gerais figura entre os estados que mais perderam áreas de Mata Atlântica nas últimas décadas, além de registrar ameaças severas ao Cerrado, bioma vital para o abastecimento e a recarga hídrica do país.