Com a chegada do inverno, a situação da população em situação de rua em São Paulo se agrava ainda mais. A cidade ultrapassou a marca de 90 mil pessoas vivendo nas ruas, mas a política pública continua sendo insuficiente, mal estruturada e, muitas vezes, violenta, alerta Andreza do Carmo, coordenadora da Associação Rede Rua, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.
Segundo Carmo, nunca houve um número de vagas em abrigos que correspondesse à real necessidade. “A prefeitura lida com as vagas de abrigo como solução, quando a vaga deveria ser temporária para resolver a questão”, critica. Ela destaca que os espaços são, em muitos casos, insalubres, com regras rígidas e sem estrutura para acolher quem tem animais ou carroças, como catadores de recicláveis. “Muitas vezes, esses serviços são visto como depósito de gente, […] numa perspectiva de esconder o problema, mas precisamos olhar na perspectiva de acolher com dignidade”, defende.
A coordenadora também denuncia a prática sistemática de remoção forçada de pertences por agentes da zeladoria urbana, conhecidos como “rapas”. “Vai tudo: cobertor, roupa, documento, medicamento… Muitas vezes com violência, uso da força, spray de pimenta”, relata. Para ela, a incoerência da política atual beira o absurdo. “A prefeitura atende, dá o cobertor, e no outro dia ela vai de manhã, tira e joga a água gelada”, lamenta.
Carmo lembra que, mesmo com a previsão anual de baixas temperaturas, a gestão municipal segue falhando em criar estratégias consistentes de acolhimento. “Não dá para compreender o porquê que não existe uma previsão, para que não precise chegar na situação de uma pessoa morrer na rua de frio”, questiona. Até agora, nenhuma ação clara foi anunciada pela administração do prefeito Ricardo Nunes (MDB) para proteger essas pessoas no inverno de 2025.
Frente ao descaso do poder público, são as organizações da sociedade civil que atuam na linha de frente. A Rede Rua oferece atendimento diário com banho, alimentação, atendimento psicológico e doação de roupas e agasalhos, além de realizar ações noturnas com voluntários. Tudo sem apoio financeiro da prefeitura.
Para Carmo, o cenário exige mais do que medidas paliativas. “Vamos para as ruas para tentar de alguma forma suprir as necessidades, mas é urgente que existam políticas públicas reais, que garantam moradia, saúde mental e dignidade”, conclui.
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