Em meio à intensificação do debate sobre a crise climática e às atividades da Semana do Meio Ambiente, com discussões que abordam o avanço do agronegócio, o Centro Ecológico comemorou quatro décadas de atuação. A celebração ocorreu na manhã deste sábado (7), durante a tradicional feira ecológica da Redenção, em Porto Alegre.
Nascida no no município de Ipê (RS), em 1985, o Centro Ecológico é uma organização não governamental (ONG) que atua em diversas regiões do estado, assessorando centenas de famílias agricultoras na transição para modelos de produção agroecológicos. Além da capacitação técnica, o centro também promove formação em associativismo, comercialização e políticas públicas para fortalecer a agricultura familiar.
O agrônomo Laércio Meirelles, que integra o ONG, destacou a importância da celebração. “Essa história da agricultura ecológica, da agroecologia, tem muito de nadar contra correntes, tem muito de se opor ao establishment. Então, a gente ter chegado até aqui, vendo esse volume de pessoas envolvidas, de agricultores, consumidores, agricultores e consumidores, é um prazer muito grande.”
A entidade participa da feira da Redenção desde a origem da mesma, incentivando famílias agricultoras da Serra Gaúcha e do Litoral Norte a exporem e comercializarem seus produtos.
Alimentação como um ato político
Considerada a mais antiga do gênero no Brasil, a feira ecológica da Redenção é realizada desde 1989. Rúne semanalmente cerca de 100 feirantes que oferecem alimentos produzidos sem agrotóxicos, respeitando os ciclos da natureza e os princípios da agroecologia.
Para Meirelles, o espaço representa uma alternativa concreta de alimentação saudável. “Ninguém quer comer veneno. Se você perguntar a qualquer um, a resposta é óbvia. Essa feira é uma expressão da disponibilidade de comida saudável que a gente tem. É só querer. Aqui a família agricultora vende o que ela come em casa”, explicou o agrônomo, reforçando a confiança na qualidade dos alimentos ofertados.
Além de promover o acesso a produtos livres de veneno, o Centro Ecológico atua com visitas técnicas, formações e cursos para agricultores que desejam fazer a transição para a produção ecológica. “Por alguma razão entraram no caminho dos venenos, viram que não é o melhor caminho e querem voltar, ou querem passar a produzir de forma ecológica”, expôs.
É quandso o centro entra, com informação técnica, com informação de associativismo, com informação sobre comercialização. “Para que eles possam fazer essa transição da agricultura comercial para a agricultura ecológica”, complementa.
Crise climática e agroecologia
A relação entre a agroecologia e a crise climática também esteve presente no discurso. “A crise climática é fruto dessa maneira como a sociedade resolveu se desenvolver, usando muito dos recursos naturais e trabalhando eles de forma equivocada. Consome muito e os seus dejetos são mal trabalhados. Isso está gerando esse problemaço do clima”, afirmou Meirelles.
Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), cerca de 95% dos alimentos consumidos dependem do solo. A entidade destaca que os solos abrigam aproximadamente 25% de toda a biodiversidade do planeta. Em um relatório de 2022, a FAO reforça ainda que, depois dos oceanos, os solos são os maiores reservatórios naturais de carbono, tendo um papel fundamental tanto na mitigação quanto na adaptação às mudanças climáticas.
Apesar disso, observa a FAO, práticas agrícolas insustentáveis, o uso excessivo dos recursos naturais e o crescimento populacional têm colocado uma pressão crescente sobre os solos. Um terço deles já está degradado, e especialistas alertam que a erosão pode causar uma queda de até 10% na produção agrícola até 2050, segundo a organização.
Entre as causas do problema, a instituição destaca o uso excessivo ou inadequado de agrotóxicos. “A produção global anual de produtos químicos industriais dobrou desde o início do século 21, para aproximadamente 2,3 bilhões de toneladas, e deve aumentar em 85% até o final da década.”
Para mitigar essa situação, entre as medidas que a entidade sinaliza estão a necessidade de maiores investimentos, principalmente para apoiar a adoção de práticas sustentáveis de manejo e recarbonização do solo. “A agricultura ecológica é parte dessa resposta. Consumir produtos ecológicos, consome aqui e preserva ali. É uma agricultura que esfria o planeta. Ela não contribui com o aquecimento global”, defendeu o agrônomo.
Meirelles encerrou sua fala deixando o convite à observação do momento do planeta e a cada um dar uma parcela de contribuição. “Consumindo de maneira saudável, consumindo de maneira preocupada. O que a gente consome tem reflexo no desenho da sociedade que a gente vive. Então vamos consumir de maneira desenhada a sociedade que a gente quer”.
