Depois que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, implementou a política de deportação em massa, 5.600 venezuelanos foram mandados de volta para Caracas. A medida tem como alvo migrantes que viviam de maneira irregular no país, mas também terá um impacto para a economia estadunidense.
O último voo com venezuelanos chegou nesta quinta-feira (11) e trouxe 141 pessoas que passaram antes por Honduras. Este foi o voo de número 33 que chegou ao país, e, diferentemente dos anteriores, não foi operado pela estatal venezuelana Conviasa, mas sim por uma companhia aérea estadunidense. O governo de Nicolás Maduro negociou a volta dos deportados e chegou a um acordo com Washington para receber os venezuelanos. A reunião foi mediada pelo enviado especial da Casa Branca, Richard Grenell.
A Venezuela critica a política do magnata, acusando-a de terrorista e violadora dos direitos humanos. O governo Maduro já havia instituído o programa Retorno à Pátria em 2023, para acolher venezuelanos que voltassem ao país e, com a onda de deportações estadunidenses, usa a iniciativa para ajudar logisticamente os que vêm sendo mandados embora dos EUA. Segundo a Caracas, mais de 1 milhão de venezuelanos voltaram ao país por meio desse programa.
Nos últimos meses, Washington tem acelerado cada vez mais a retirada de direitos de migrantes nos EUA. Em março, Trump invocou a Lei de Inimigos Estrangeiros, de 1798. A legislação estabelece que qualquer pessoa que esteja nos Estados Unidos e seja considerada de uma organização terrorista está sujeita a ser deportada como “inimigo estrangeiro”. O republicano usou essa norma para justificar o envio de 252 venezuelanos para um presídio de segurança máxima em El Salvador.
Em maio, o Tribunal Supremo autorizou a retirada do status de proteção legal (TPS) a 350 mil venezuelanos que viviam no país. A medida do ex-presidente Joe Biden garantia que os migrantes venezuelanos poderiam morar e trabalhar no país até outubro de 2026.
Na semana passada, Trump proibiu a entrada de cidadãos de 12 países nos Estados Unidos para proteger o território, segundo o republicano, de “terroristas estrangeiros”. Cidadãos de outros 7 países, incluindo a Venezuela, enfrentam também uma restrição que proíbe a residência, o turismo, os vistos de estudo e de atividades comerciais, conferências, reuniões e negociações.
Impactos econômicos
A política de deportações de Donald Trump tem um impacto não só para os países que recebem seus cidadãos de volta, mas também para os próprios Estados Unidos. Segundo a Pew Research Center, em 2023, cerca de 47 milhões de imigrantes viviam no país, o que representa 14,3% da população estadunidense. Desse total, cerca de 800 mil são venezuelanos.
Isso significa que a presença de estrangeiros nos EUA tem um impacto não só para a sociedade, mas também para a economia. De acordo com o Conselho Americano de Imigração (AIC), todos esses migrantes pagaram em 2023 um total de US$ 651,9 bilhões (R$ 3,6 tri) em impostos federais, estaduais e locais. Esses tributos estão ligados ao pagamento de taxas para quem mora sem documento no país, além do não recebimento de auxílios e a restituição do imposto de renda.
Ao todo, 11 milhões de imigrantes vivem de maneira irregular nos EUA. De acordo com a doutora em Economia pela Universidade Simón Bolívar, Katiuska Lopez, a maior parte dos imigrantes que vivem nos Estados Unidos exercem trabalhos subalternos.
“Isso, com certeza, tem um impacto na economia dos EUA, mesmo que seja pequena. Porque são trabalhos de mão de obra barata e que talvez não sejam feitos por estadunidenses. Eles sempre vão buscar migrantes que estão nessa situação de vulnerabilidade e precisando de trabalho para fazer esses trabalhos de mão de obra baratos”, disse ao Brasil de Fato.
Trabalhos em restaurantes, estacionamentos e aplicativos de entrega são as principais ocupações dos migrantes que vivem de maneira irregular nos EUA. Esse grupo quase todo não está em empregos formais e atuam em trabalhos que não exigem capacitação, cargos que hoje os estadunidenses não querem ocupar.
Além de um impacto interno, a deportação de migrantes também leva a um problema externo para os países de origem dessas pessoas: o envio de remessas. Muitos dos países da América Central tem uma grande proporção do PIB baseada nos dólares que são enviados desses migrantes para suas famílias.
O caso mais emblemático é o da Nicarágua. Em 2023, o país recebeu mais de 5 bilhões de dólares em remessas, o que representa 29,7% do PIB. Gilberto Rodrigues é professor de Relações Internacionais da UFABC e afirma que esses dois impactos são fundamentais para a economia de diferentes países.
“Existem dois tipos de impacto econômico quando pensamos em migrantes da América Latina e Caribe. Um é dentro dos EUA e outro fora. Isso porque migrantes latino americanos fazem remessas de dinheiro para suas famílias de origem, especialmente na América Central. Uma parte significativa desses países tem as remessas como um elemento muito importante do PIB desses países”, disse ao Brasil de Fato.
Com as deportações, Trump envia também um sinal para aqueles que pretendem ir aos EUA. A saída de muitos latinos, no entanto, pode ter impacto no próprio mercado de trabalho, já que os estadunidenses não devem ocupar esses postos subalternizados.
Gilberto Rodrigues lembra que há hoje 3 gerações de latinos que vivem nos EUA e o status desses migrantes muda também o trabalho que eles ocupam. Ele afirma que são dois impactos importantes para a economia estadunidense com a saída de migrantes.
“Historicamente, a população latino-americana ocupa os EUA, especialmente os mexicanos. Já há 3 gerações de mexicanos que vivem nos EUA, mas que mantêm vínculos com o México. Os setores que essa população migrante participa varia sobretudo de acordo com o status migratório. Muitos dos migrantes que estão regulares poderão exercer funções e ocupar cargos melhores. Na economia estadunidense, a restrição migratória gera dois problemas: menos pagamento de tributos e menos mão de obra para os trabalhos que os americanos não fazem”, afirmou.
Para os países que recebem esses deportados, no entanto, há um impacto econômico que pode ser positivo. A maior parte dos migrantes venezuelanos que vivem nos EUA, por exemplo, têm entre 18 e 26 anos. O retorno de muitas dessas pessoas amplia a população economicamente ativa da Venezuela
Segundo Katiuska Lopez, é possível que esse retorno também influencie na própria criação de negócios na Venezuela.
“Aqui pode ser que tenha um impacto maior porque a população se viu muito afetada em termos gerais pela saída de muitas pessoas e é possível que comecemos a ver atividades que não se viam. Comecem a abrir negócios e coisas de pessoas que vem com poupança ou com algum projeto para fazer aqui na Venezuela. O estado venezuelano está oferecendo oportunidades para os que estão chegando para que sejam inseridos imediatamente no mercado de trabalho”, concluiu.