O Egito está impedindo o avanço em seu território de grandes manifestações não-violentas que pretendem chegar à fronteira da Faixa de Gaza. A denúncia foi feita ao Brasil de Fato por brasileiros que integram esses grupos para demonstrar solidariedade aos palestinos, vítimas do genocídio cometido por Israel.
“Nenhum estrangeiro conseguiu seguir adiante, teve arbitrariedade e 40 pessoas tiveram os passaportes apreendidos. Eles bloquearam a estrada e passavam apenas os oficiais pegando os passaportes de todo mundo e só devolveram para aqueles que foram para o outro lado da estrada para voltar”, relatou Fábio Bosco, da Secretaria Internacional da Central Sindical e Popular CSP-Conlutas.
“Foram poucos os que conseguiram chegar até a Ismaília”, diz Boscom, se referindo à cidade destino após a partida da capital Cairo, na sexta (13). Ele diz que o mesmo ocorreu no sábado e alguns seguem detidos. A Marcha Global para Gaza planejava ir de carro até Al Arish e, posteriormente, percorrer a pé os últimos 50 quilômetros até o lado egípcio de Rafah, que faz fronteira com Gaza. A expectativa era chegar neste domingo (15) ao território palestino.
O grupo, formado por cerca de três mil ativistas independentes e coletivos de solidariedade ao povo palestino, tem o objetivo de denunciar o genocídio em Gaza. Desde março, Israel impôs um bloqueio à ajuda humanitária, interrompendo o fornecimento de alimentos, combustível e insumos médicos. No total, a coalizão reúne cerca de 10 mil pessoas de pelo menos 44 nacionalidades, incluindo pelo menos cinco brasileiros.
“A gente está esperando uma definição por parte da Comissão Organizadora da Marcha para ver os próximos passos para a gente dar continuidade ao nosso movimento aqui. Mas o sentimento das pessoas é de ir para lá e tentar fazer o que for possível para chegar o mais perto de Gaza”, diz Bosco.
Herbert Carlos, metalúrgico da Embraer em São José dos Campos e diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do município paulista, afirmou que o movimento sofreu “uma dura repressão” na sexta-feira (13). “A gente tentou ir para a cidade de Ismaília, onde nos encontraríamos para começar a marcha, mas o governo montou checkpoints na estrada. Foi uma coisa ostensiva”, disse Carlos.
“Muitas pessoas sofreram repressão direta. A gente fez uma manifestação em frente ao checkpoint, mas a polícia estava fortemente armada, com cassetetes, armas de fogo. Foi tudo muito ostensivo. Eles impediram que a manifestação acontecesse. Soubemos de pessoas que foram forçadas a entrar nos veículos da polícia contra a própria vontade. Teve caso de policial jogando fora a mala das pessoas. Então, sim, houve muita repressão”, relatou.
O bloqueio foi um pedido do governo israelense ao egípcio. Na quinta-feira (12), cerca de 200 ativistas da marcha foram detidos em hotéis e no Aeroporto Internacional do Cairo. Há cidadãos detidos dos Estados Unidos, Austrália, França, Holanda, Espanha, Argélia, Marrocos e Tunísia, de acordo com a organização.
“Espero das autoridades egípcias que impeçam a chegada de manifestantes jihadistas na fronteira entre Israel e Egito; e que não os autorizem a cometer provocações ou tentar entrar na Faixa de Gaza”, afirmou o ministro israelense da Defesa, Israel Katz, em um comunicado.
Por sua vez, o Ministério das Relações Exteriores egípcio afirmou que qualquer ação de delegações estrangeiras pró-palestinos devem ter “autorização prévia”. Destacou também “a importância de seguir essas medidas regulatórias estabelecidas para garantir a segurança das delegações visitantes, devido às condições de segurança sensíveis nesta área fronteiriça desde o início da crise em Gaza”.
Ações internacionais de solidariedade à Gaza
Em paralelo ao recrudescimento da guerra de Israel em Gaza, ativistas de todo o mundo tentam romper o bloqueio. Além da Marcha Global para Gaza, o Comboio Soumoud (resiliência em arábe) também viaja em direção ao território com o objetivo de levar ajuda humanitária e chamar a atenção para o genocídio e o bloqueio imposto por Israel.
No total, entre mil e 1,5 mil pessoas partiram, no dia 9 de junho, da Tunísia, Argélia, Líbia, Mauritânia e Marrocos. Também nesta sexta-feira (13), o comboio foi interrompido na cidade líbia de Sirte, após cruzar a fronteira entre a Líbia e a Tunísia.
No início da semana, a embarcação Madleen, da Coalizão Flotilha da Liberdade, foi sequestrada por forças israelenses, enquanto navegava em águas internacionais rumo à Faixa de Gaza. O navio também levava ajuda humanitária à população palestina.
De acordo com os relatos, drones equipados com sistema de disparo automático cercaram o barco, borrifando-o com uma substância branca semelhante à tinta. As comunicações foram interrompidas à força, e sons perturbadores passaram a ser emitidos via rádio para desorientar a tripulação.
Entre os ativistas, estavam a sueca Greta Thunberg, que deixou Israel um dia depois, e o brasileiro Thiago Ávila, que chegou ao Brasil na sexta-feira (13). Ele ficou preso num centro de detenção e chegou a ser levado para a solitária.
Apesar do bloqueio, Fábio Bosco celebrou o “movimento de solidariedade internacional multifacetado, que se expressa de formas muito diferentes”.
“Tem as manifestações de rua, personalidades se posicionando, formatura das universidades americanas em que os formandos vão com a bandeira da Palestina, artistas se posicionando, seja no Festival de Cannes, seja em Hollywood, e tem essas iniciativas, que foi o caso da Flotilla da Liberdade, da Marcha Global à Gaza, do Comboio da Resiliência, que buscam fazer um gesto simbólico de chegar em Gaza’, disse.
O genocídio de Israel em Gaza começou em 7 de outubro de 2023, após um ataque do grupo político-militar palestino Hamas em território israelense, deixando 1,2 mil mortos e cerca de 250 sequestrados. Desde então, mais de 55 mil palestinos foram mortos, sendo a maioria mulheres, crianças e adolescentes.