Vi com muita preocupação a aprovação pela maioria dos vereadores do Rio da proposta que vai armar a Guarda Municipal. É uma medida perigosa porque vai na contramão da realidade. Ontem mesmo o Ministério da Justiça e Segurança Pública divulgou dados mostrando que o Rio de Janeiro registrou alta de 6% nas mortes violentas e de 34,4% nas mortes causadas por policiais. Foram 1.254 mortes apenas de janeiro a abril deste ano.
Também neste mesmo período, o Brasil registrou 71 mortes de agentes de segurança pública. No Rio de Janeiro, a situação é mais alarmante. Houve crescimento de 18 mortes no mesmo período de 2024 para 37 agora, apenas nos primeiros meses. O estado concentra 52% das mortes de policiais no país.
Cabe questionar: em que instância o Executivo e o Legislativo da capital fluminense realizaram audiências e discussões para consultar a população sobre a medida? De acordo com a pesquisa da Quaest contratada pela Globo, 57% dos cariocas são contra o uso de armas pela Guarda Municipal. O povo não é bobo e sabe que será o maior prejudicado.
Você, que me lê, já deve ter presenciado no Rio inúmeras situações de conflito entre agentes da Prefeitura e da Guarda Municipal na repressão contra camelôs. É só fazer uma busca nas redes para encontrar situações de agressão e perseguição. Agora, imagine isso, mas com um guarda municipal portando uma arma de fogo nas regiões movimentadas da cidade.
Outro aspecto é o desvio de armamento. Em 2023 o Exército brasileiro registrou 48 desvios de armamento. De 2018 a 2022, cerca de 2.893 armas legais pertencentes a colecionadores, atiradores e clubes de tiro foram desviadas. O que nos leva a crer que a Prefeitura do Rio estará blindada destes desvios de armas? Nada.
O Rio de Janeiro é o maior laboratório de políticas de segurança do Brasil e é preciso reconhecer que o caminho está errado. As políticas não surtiram efeitos e os problemas aumentaram. A política de Eduardo Paes insiste no velho erro e piorará um problema que diz querer resolver.
Além disso, trata-se de um desvio de função do agente da GM. A atribuição de guardas municipais não é a de realizar policiamento ostensivo, com possíveis confrontos a tiros. Esse trabalhador e essa trabalhadora da GM é, na sua origem, um agente com o papel de guardar o patrimônio e de colaborar com o policiamento comunitário. Quem mais se prejudica com isso é o agente e suas famílias que viverão em uma aflição constante.
Quantos mais terão que morrer pra que essa guerra acabe? As altas taxas de letalidade se traduzem em nomes: Herus, João Pedro, Johnatha, Kathleen Romeu, Maria Eduarda…
Estudos do mundo inteiro e também aqui do Brasil apontam a relação entre armamento e o aumento da taxa de letalidade. Chega de enxugar sangue! Basta de choro de mãe favelada. Queremos uma Guarda Municipal valorizada, equipada, com servidores que trabalhem pela manutenção da ordem e do patrimônio público, colaborando por meio da lógica comunitária. Não queremos este modelo de segurança que não funciona e que vitima a população e os próprios agentes.
*Talíria Petrone é deputada federal (Psol-RJ).
*Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.