Após a repercussão do leilão que colocou à venda 32 lotes de terra em Paraty, no Rio de Janeiro — muitos deles localizados em áreas de preservação ambiental e com presença de comunidades tradicionais —, moradores da Ilha do Araújo se mobilizam para tentar barrar a medida, que consideram “arbitrária”. Para Éder Costa, liderança local entrevistada pelo Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato, a sensação ainda é de incerteza.
“É um pesadelo que não conseguimos ver a hora de acordar. É muito complexo. Nós somos leigos na questão, não conseguimos vislumbrar uma saída. Ouvimos várias pessoas técnicas falando, mas nos vemos no escuro”, conta. “Nós ouvimos relatos até das pessoas mais velhas, que estão angustiadas, e não conseguem dormir. Isso afeta bastante a comunidade toda”, lamenta.
Costa defende que haja “algum tipo de responsabilização” contra a decisão “arbitrária” do juiz à frente do processo que determina os leilões. De acordo com ele, a ação foi realizada “passando por cima de áreas que são federais, sem comunicar as partes interessadas, não só a prefeitura e o ICMBio [Instituo Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade], mas sobretudo os moradores”. “Não avaliaram se tinha gente morando aqui dentro. Nosso cotidiano está totalmente afetado”, denuncia.
A comunidade exige o cancelamento imediato dos leilões, além da responsabilização dos envolvidos. “Cancelar é o nosso objetivo principal. Estamos nos organizando para conseguir, sobretudo, mobilizar, manifestar, fazer com que essa questão chegue onde deve chegar para ter a melhor resolução”, conclui.
Diante da omissão de autoridades locais e da ausência de dados confiáveis, os próprios moradores iniciaram um censo independente. “O último Censo do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] ficou bem fraquinho, não dá para usar. Estamos fazendo esse levantamento agora na ilha”, revela. Uma comissão comunitária foi formada com mais de 200 participantes e tem buscado articular outras comunidades afetadas pela venda irregular das terras.
Posses suspensas e insegurança
Com a ajuda da Defensoria Pública e do Ministério Público, os moradores conseguiram suspender temporariamente a emissão de posse dos lotes vendidos. “Teve uma pausa na emissão de posse. Já é um respiro, pelo menos, para ficarmos um pouquinho mais tranquilos”, diz Costa. “A resposta deles foi emocionante. Ficamos preocupados com o assédio que aconteceu e que tememos acontecer novamente”, acrescenta.
Além da insegurança jurídica, os moradores denunciam episódios de assédio e pressão por parte dos compradores. “Advogados da empresa que comprou uma parte da Ilha do Cedro foram lá entrevistar as pessoas. Isso é um assédio, uma violação, e mostra como estamos fragilizados nisso. Na Ilha do Araújo, onde eu moro, os topógrafos tentaram já entrar para medir essa terra que foi arrematada. Então ficamos nesse lugar de insegurança”, aponta.
A Ilha do Araújo, segunda maior do município, é habitada há séculos por caiçaras e conhecida por festas tradicionais, como a do Camarão e de São Pedro. É também referência no turismo de base comunitária, que promove uma relação respeitosa entre visitantes e o modo de vida local.
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