A cidade de Juiz de Fora (MG) pode se tornar a primeira do Brasil com mais de 500 mil habitantes a garantir gratuidade total no transporte coletivo urbano. O projeto de lei (veja íntegra) que institui a tarifa zero foi protocolado pela Prefeitura na Câmara Municipal na última segunda-feira (23) e ainda será analisado pelos vereadores.
A proposta, segundo a prefeita Margarida Salomão (PT), representa uma mudança na lógica da mobilidade urbana. “Estamos mudando a lógica da mobilidade urbana com coragem e responsabilidade. A tarifa zero é um avanço civilizatório, que integra a cidade, melhora a vida das pessoas e fortalece a economia local”, afirmou.
A iniciativa será discutida por comissões temáticas do Legislativo – entre elas, as de Legislação, Orçamento e Transporte. Segundo o presidente da Casa, vereador Zé Márcio-Garotinho (PDT), o projeto será debatido em audiência pública antes da votação. “Inicialmente a gente vê de forma muito positiva. A gratuidade universal atende a uma população que depende do ônibus e isso custa caro a ela”, analisou o vereador.
De acordo com a Prefeitura, o modelo proposto se baseia em um fundo municipal que substituirá o atual sistema de tarifas cobradas dos usuários. Atualmente, a tarifa é de R$ 3,75, congelada desde 2019.
Gratuidade universal e financiamento por grandes empregadores
O novo sistema prevê gratuidade para todas as pessoas físicas usuárias dos ônibus. O custeio será feito por um fundo municipal alimentado, entre outras fontes, por uma tarifa técnica paga por empregadores com mais de dez funcionários – substituindo o vale-transporte tradicional. Empresas com até dez empregados estarão isentas da cobrança.
Hoje, Juiz de Fora tem cerca de 2.380 empresas que se enquadram na obrigação de contribuir com o fundo. Além disso, recursos do orçamento municipal, repasses da União e do Estado, além de receitas com publicidade nos ônibus, também vão compor o financiamento.
Para acessar o sistema, a população deverá utilizar um bilhete eletrônico sem custo. A Prefeitura pretende distribuir novos cartões num prazo de 30 dias após a eventual aprovação da proposta.
A medida, segundo a Prefeitura, ampliará significativamente o acesso das populações periféricas à cidade, permitindo deslocamentos para trabalho, estudo, saúde e lazer sem que o valor da passagem seja uma barreira. “Hoje 36% dos usuários são gratuitos e agora queremos que todas as pessoas andem de ônibus de graça”, afirmou Margarida.
Experiências anteriores, inclusive na própria cidade com o programa Domingão do Busão, indicam aumento imediato da demanda: só aos domingos e feriados, a gratuidade já provocou um crescimento de 14% no número de passageiros. A expectativa é de um salto de até 30% na circulação de pessoas após a implementação total.
O valor economizado pelas famílias tende a ser convertido em consumo básico, o que, segundo o Executivo, representa uma forma indireta de redistribuição de renda.
Estímulo à economia local, geração de empregos e sustentabilidade
Estudos elaborados por economistas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) estimam que, até 2040, o consumo das famílias possa crescer em quase 30% com a política de Tarifa Zero. O comércio, os serviços e a indústria local devem sentir os efeitos positivos desse aumento da circulação de renda.
A expectativa é de que o emprego cresça 9,1% até o fim do período analisado. O impacto sobre a economia da cidade pode ultrapassar os R$ 1,7 bilhão – valor superior ao custo estimado do fundo de financiamento.
Além disso, os especialistas apontam que, com o tempo, a proporção entre os custos do fundo e o Produto Interno Bruto (PIB) municipal tende a cair, o que tornaria a política ainda mais eficiente do ponto de vista orçamentário.
A Prefeitura defende que a tarifa zero também tem potencial para reduzir congestionamentos e emissões de gases de efeito estufa. No Brasil, os veículos de transporte de carga e passageiros respondem por 47% do total de CO₂ emitido.
O estímulo ao uso do transporte coletivo favorece ainda a renovação da frota com ônibus mais limpos, como os movidos a eletricidade ou gás metano – alternativa já estudada pelo município. A redução da poluição sonora, especialmente nas áreas de maior circulação, é outro efeito esperado.
Ao colocar o transporte coletivo no centro das estratégias urbanas, Juiz de Fora dá um passo em direção a um modelo de desenvolvimento mais inclusivo, sustentável e eficiente. A prefeita Margarida Salomão afirma que o projeto articula inclusão social, crescimento econômico e preservação ambiental: “As pessoas mais pobres, quando têm algum tipo de alívio na sua renda, gastam mais em consumo, mais bens e mais serviços para suas famílias”.