O Brasil atingiu, pela primeira vez na história, uma taxa de fecundidade total abaixo de 1,6 filhos por mulher, de acordo com os dados do Censo Demográfico 2022. O número está bem abaixo do nível de reposição populacional, que seria de cerca de 2,1 filhos por mulher. Para Izabel Marri, demógrafa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), essa redução é resultado de transformações na sociedade brasileira, principalmente o aumento da autonomia feminina e do acesso à educação.
“Cada vez mais o número de filhos tem diminuído e as mulheres estão adiando o início da maternidade”, afirma Marri, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. Ela explica que esse fenômeno tem relação direta com o avanço da escolaridade, o maior acesso a informações e a métodos contraceptivos, além da crescente participação das mulheres no mercado de trabalho. “As pesquisas desde a década de 1990 já mostravam que as mulheres tinham mais filhos do que gostariam, ou seja, faltava acesso a métodos contraceptivos”, diz.
Ainda que o censo não traga dados diretos sobre métodos anticoncepcionais, outras pesquisas indicam que tanto a oferta pública quanto a demanda por esses recursos têm crescido. “Quanto maior a informação dessa mulher, maior tende a ser a demanda dela pelos métodos contraceptivos”, reforça a demógrafa.
Outro fator apontado é o custo e a responsabilidade de criar uma criança, muitas vezes assumida majoritariamente pelas mães. “Cuidar de filho custa. Então, tem uma troca. […] As pessoas vão fazendo escolhas”, explica. Segundo ela, ao priorizar estabilidade no emprego e conclusão dos estudos, muitas mulheres acabam adiando tanto a maternidade que, mais tarde, nem sempre conseguem ter o número de filhos que desejariam.
Desigualdades
A desigualdade social e racial também aparece nos dados. Mulheres negras e pardas ainda apresentam taxas de fecundidade maiores do que as mulheres brancas. Já entre os recortes religiosos, as evangélicas lideram com 1,7 filho por mulher, enquanto as espíritas, grupo com maior nível de escolaridade, registram a menor média: 1 filho por mulher.
Regionalmente, o Sudeste e o Sul são as áreas com os menores índices de fecundidade, enquanto o Norte ainda mantém os mais altos, embora em níveis igualmente baixos. A taxa no Norte é de 1,9 filho por mulher, enquanto no Sudeste é de 1,4.
Questionada sobre o impacto dessa autonomia no debate público sobre direitos reprodutivos, Izabel Marri reconhece que o tema ainda encontra resistência no país. “O aborto faz parte de uma questão de saúde pública das mulheres. E eu vejo ainda uma dificuldade grande de se debater isso dessa forma. Precisamos avançar muito nesse tipo de discussão”, opina.
Para ouvir e assistir
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