Milhares de argentinos se reuniram no Parque Lezama, em Buenos Aires, para apoiar a ex-presidenta Cristina Kirchner, que está cumprindo prisão domiciliar. O ato desta quarta-feira (9) foi realizado em meio às celebrações do Dia da Independência da Argentina. A líder peronista enviou um discurso gravado e criticou a dívida do governo com o Fundo Monetário Internacional.
De acordo com Kirchner, a Argentina vive um nível de dependência que não foi visto antes pela Casa Rosada, sede do governo do país. A ex-mandatária questionou o governo se há uma real liberdade ou se o país está implementando políticas impostas por organismos internacionais e aceitando as condições do FMI.
“Desde 1956, depois que Perón foi derrubado e levado ao Fundo Monetário Internacional, nunca tivemos esse nível de dependência. Porque quando paramos para pensar no que significou essa independência e a comparamos com a Argentina em que vivemos, a pergunta inevitável que temos que nos fazer, como argentinos, é: somos verdadeiramente livres ou independentes?”, afirmou.
Os manifestantes marcharam do parque até o edifício onde Cristina está cumprindo pena. Eles entoavam cantos de “Cristina eu te amo” e pediam justiça para o caso da líder. Os peronistas afirmam que a prisão foi uma decisão política do Judiciário argentino e que não foram apresentadas provas consistentes para a prisão da ex-presidenta.
Kirchner foi até a sacada da sua residência e saudou os manifestantes. O ato foi convocado pela própria ex-presidenta e foi chamado de Festival Cultural pelo Dia da Independência. O evento reuniu artistas independentes e exibiu, no palco principal, a frase “Argentina com Cristina”.
E o simbolismo não podia ser diferente. Os manifestantes carregavam bandeiras da Argentina e camisetas da seleção para protestar e relembrar a Independência do país.
Cristina também falou sobre as dívidas que os próprios argentinos têm, que foram comprimidas por medidas do atual governo. De acordo com ela, a maior parte das dívidas das famílias argentinas dizem respeito ao uso de cartão de crédito, serviços públicos, alimentação, compras parceladas, impostos, dívidas de aluguel e até de remédios.
“Eles querem consolidar um modelo em que tentam fechar os números macroeconômicos e consolidar um país para os 30% mais ricos, enquanto o restante está condenado a viver sem mobilidade social, sem dignidade e sem futuro. Já estamos vendo como esse modelo funciona para as pessoas, onde não só o país está endividado, mas as famílias também. 90% por cento das famílias têm dívidas e 12% das famílias têm mais de três dívidas ao mesmo tempo”, afirmou.
Ela enfatizou que a gestão do seu ex-marido e ex-presidente Néstor Kirchner reestruturou a dívida de maneira significativa e pagou o FMI.
Segundo institutos financeiros privados, a dívida da Argentina com o FMI hoje está em torno de US$ 58,8 bilhões (R$ 328 bilhões). O último empréstimo foi de US$ 20 bilhões (R$ 111 bilhões) e foi contraído pelo governo de Milei em maio.
Para Cristina, Milei não está conseguindo cumprir as metas que foram estipuladas pelo fundo para condicionar os empréstimos. Ela citou em seu discurso um problema estrutural do país que é a incapacidade de conseguir uma entrada de dólares suficientes para pagar a dívida externa.
“Milei já está falhando em cumprir as metas acordadas com o FMI. Na semana passada, o porta-voz do FMI reconheceu isso, dizendo: o acúmulo de reservas na Argentina se destaca por sua ausência. E, claro, a Argentina não produz dólares suficientes para se desenvolver e, ao mesmo tempo, pagar a dívida serial, compulsiva e passageira à qual os governos Macri e Milei nos submeteram”, afirmou.
Prisão de Cristina
Cristina cumpre pena de seis anos. A sentença foi confirmada no último dia 10 de junho pela Suprema Corte argentina, em um processo que sua defesa classifica como perseguição política. Ela foi condenada a inabilitação perpétua para exercer cargos públicos pelo caso conhecido como Causa Vialidad. A ex-presidenta é acusada de favorecer o empresário Lázaro Báez em 51 projetos de estradas públicas a partir de licitações públicas na província de Santa Cruz durante o seu governo e de Néstor Kirchner entre 2003 e 2015.
A prisão domiciliar imposta a Kirchner inclui uma série de restrições rigorosas. Ela deverá permanecer no endereço fixado e só poderá sair com autorização prévia do tribunal, salvo em casos devidamente justificados por razões de força maior. A obrigação de se abster de “provocar distúrbios na convivência com a vizinhança” é uma determinação que visa conter o grande fluxo de pessoas que, nos últimos dias, têm se dirigido à região para apoiá-la.
O primeiro líder internacional a visitá-la foi o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que recebeu autorização para um encontro com Kirchner na semana passada, durante a cúpula do Mercosul realizada em Buenos Aires.