Na noite da última quarta-feira (10), 22 mulheres assentadas e acampadas de diversas regiões do Rio Grande do Sul concretizaram um sonho que vinha sendo gestado há muitos anos.
O Instituto Educacional Josué de Castro (IEJC), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), realizou a formatura da Turma Filhas da Resistência e do Amor do 1º Curso de Gestão e Agroecologia para Mulheres. Com lágrimas de alegria, muitas receberam o seu primeiro diploma. Uma emocionante mística com música e poesia foi preparada pelos jovens estudantes do IEJC.

A diretora do IEJC, Diana Daros, parabenizou as formandas, destacando a importância da realização desse curso. Ela lembrou o período que as etapas foram realizadas e como a escola se preparava para recebê-las com muita alegria e afeto. “Com certeza, nossa escola ficou mais bonita com a participação de vocês.”

Segundo a liderança do Setor de Gênero do MST/RS Silvia Reis Marques, a ideia do curso existia desde a época em que a escola era sediada em Veranópolis. A concretização foi possível através da conquista de recursos de uma emenda parlamentar da deputada federal Maria do Rosário (PT).
“Após dois anos de planejamento e luta, o curso foi finalmente realizado. Ele foi estruturado em três etapas, cada uma com duração de cinco dias, incluindo o tempo de deslocamento. As etapas ocorreram no final de março/início de abril, final de abril/início de maio, e a última etapa mais recentemente”, explicou.
Marques ressalta que este é o primeiro curso da escola exclusivo para mulheres, focado em gestão e agroecologia, marcando um momento significativo para a instituição e para as participantes.
“Ele atendeu a uma demanda real das companheiras dos assentamentos, especialmente aquelas que não estão nas grandes cooperativas, mas que atuam em suas comunidades e lotes e precisam aprimorar a gestão de suas agroindústrias. Mulheres de quase todas as regiões do estado do Rio Grande do Sul, incluindo quatro companheiras de assentamentos novos (como Piratini e Cruz Alta), participaram do curso.”

Conforme explicou Marques, o curso visou proporcionar às mulheres o estudo, a teoria e a técnica para aprimorar a gestão de suas agroindústrias e comunidades, contribuindo para a reforma agrária popular e a produção de alimentos com menos trabalho pesado.
Além do conhecimento, o curso possibilitou a conquista de equipamentos como tratoritos, comprados com parte da emenda da deputada. “Nosso propósito foi diminuir a penosidade do trabalho no campo e facilitar a produção de alimentos saudáveis. A entrega dos tratoritos foi um momento de grande alegria e emoção, especialmente em locais como Cruz Alta, Itacurubi e São Gabriel, onde as mulheres já tinham planejamento para o uso coletivo dos equipamentos em mutirões”, contou.
A importância das mulheres na agroecologia

Juliana Silva de Vargas, também dirigente do Setor de Gênero, acredita que o movimento de agroecologia é principalmente impulsionado pelas mulheres, que são vistas como “guardiãs da vida e da natureza”.
“Elas têm um cuidado intrínseco com a natureza e a alimentação, desejando preservar e compartilhar alimentos saudáveis e de qualidade.” Segundo Vargas, o curso também evidenciou a necessidade de o MST direcionar um olhar mais carinhoso para as pequenas agroindústrias geridas por mulheres, que muitas vezes ficam na “periferia da visão” de financiamento e acompanhamento, em contraste com as grandes cooperativas, onde a maioria das direções ainda é ocupada por homens.
Desafios e empoderamento
Embora a participação feminina seja uma política do MST, na opinião de Vargas, ainda há um desafio cultural e machista a ser superado na prática, onde as mulheres frequentemente ficam na linha de produção em vez de em cargos de decisão.
“Este curso é visto como uma ferramenta para afirmar a capacidade e o desejo das mulheres de se aprofundar em conhecimentos de gestão e colocá-los em prática, como já ocorre em associações comandadas por mulheres que dão muito certo. As mulheres não apenas discutem, mas tomam decisões e executam as ações”, destaca.
Impacto pessoal e coletivo
Também responsável pelo Setor de Gênero, Nilva Loeci Azevedo afirma que o curso foi uma oportunidade única para muitas participantes, com algumas recebendo seu primeiro certificado de estudo, o que gerou grande emoção e orgulho.
“Essa iniciativa é vista como uma vitória coletiva e um passo importante para a transformação de vidas, reforçando a capacidade de luta e resistência das mulheres do campo. As participantes carregam o ‘amor revolucionário’ do MST, que as acolheu e deu oportunidades.”
Continuidade e futuro

Para as dirigentes, há o desafio de continuar com outros cursos de gestão para mulheres, aprofundando o que já foi aprendido e ocupando mais espaços de liderança. “A reforma agrária popular, pautada na missão de produzir comida e vida, é um horizonte para essas ações. A conquista desses cursos é fruto da luta e decisão das próprias mulheres, que estão na linha de frente ocupando e conquistando seus espaços”, destaca Azevedo.
Elas também lembraram de companheiras como Seleni de Lima, a Teca, que estava desde o início na busca por este sonho e agora ocupa uma diretoria na Cooperativa de Trabalhadores Assentados de Porto Alegre (Cootap), e a Sílvia Marques, vice-presidente da Cooperativa de Sucos Monte Vêneto, como exemplos dessa ocupação de espaços historicamente difíceis para mulheres.
“O curso reforça que a mudança é possível e que a luta das mulheres é essencial para as futuras gerações e para a transformação da sociedade. É um chamado para todas as mulheres continuarem estudando, lutando e celebrando a vida e as conquistas”, reforçou Marques.
