Ao participar da articulação que levou o presidente dos EUA, Donald Trump, decidir taxar os produtos brasileiro em 50%, em evidente chantagem política, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) cometeu um ato de traição nacional e deveria ser punido por isso.
Esse é o resumo da análise do professor de Relações Internacionais da UFABC, Gilberto Maringoni, em entrevista ao Brasil de Fato. “Como é que um deputado pode ir a outro país conspirar?”, questiona o professor. “E não só conspirar, mas articular políticas danosas ao país. Não existe na Constituição, e deveria existir, um termo de traição nacional. Isso é traição nacional. Ele deveria ser cassado e preso”, afirma.
O filho de Jair Bolsonaro declarou, nesta segunda-feira (14), que não pretende voltar ao Brasil. Vivendo nos EUA desde março de 2025, o deputado admite que pode abandonar o mandato para “trabalhar” no país, segundo suas palavras, de forma mais importante do que poderia fazer no Brasil. A licença para se ausentar das funções políticas expira no próximo domingo (20). Se não retornar, ele poderá perder seu cargo obtido com 741 mil votos.
Em entrevistas concedidas ao Estadão e à Folha de S. Paulo, Eduardo falou sobre os próximos movimentos de seu mandato e atacou o Supremo Tribunal Federal (STF) e o ministro Alexandre de Moraes, que conduz a investigação que pode levar Bolsonaro à prisão.
O parlamentar diz temer que aconteça com ele o mesmo que está acontecendo com seu pai. “A minha data para voltar é quando Alexandre de Moraes não tiver mais força para me prender”, declarou.
O deputado alega ter medo de que o ministro vá “tentar colocar uma coleira” nele, reter o passaporte, “me fazer de refém, ficar ameaçando”. A jornalistas, Eduardo não se preocupou em esconder o fato de estar nos Estados Unidos atuando efetivamente contra Moraes e a favor da anistia. “Eu não estou buscando convencimento da população, eu estou buscando pressionar o Moraes”, afirmou.
Eduardo Bolsonaro é alvo de um inquérito por obstrução de investigação de organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, aberto por Moraes em maio. A abertura foi provocada por um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que citava justamente as atividades dele nos Estados Unidos.
Eduardo atacou também os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e de Minas Gerais, Romeu Zema (NOVO), por se posicionarem contra as tarifas. Após a publicação da carta de Donald Trump chantageando o governo brasileiro, os dois governadores se manifestaram apoio a Jair Bolsonaro. A postura mudou nos dias seguintes, com a pressão dos setores exportadores brasileiros que serão afetados pelas tarifas. Tarcísio se reposicionou e chegou a ter um encontro com chefe da embaixada dos Estados Unidos no Brasil.
O deputado licenciado considera que o movimento foi “desrespeitoso”. “Tarcísio utilizou os canais errados. O filho do presidente está nos Estados Unidos. O Tarcísio não tem nada que querer costurar por fora uma decisão. O Tarcísio tem que entender que o filho do presidente está nos Estados Unidos e tem acesso à Casa Branca. Qualquer tentativa de nos dar bypass [atravessar] será brecada e freada”, provocou.
Na prática, Eduardo eleva ao mais alto grau a estratégia de porta giratória comum entre governos e empresas privadas. Após passar quase três mandatos na alta estrutura do poder público, incluindo acesso irrestrito ao poder Executivo durante os quatro anos de presidência de seu pai, o agora deputado licenciado leva aos Estados Unidos toda a sua expertise para pressionar pela anistia de Bolsonaro.
Para Gilberto Maringoni, as ações de Eduardo têm levado a extrema direita brasileira a se desgastar perante a sua base de apoio, em especial o setor da agricultura de exportação. “Politicamente, eles estão se quebrando perante essa sua base de apoio empresarial, e, em São Paulo, Tarcísio de Freitas, que estava se colocando como o principal candidato à presidência dessa ala extremista da vida política brasileira, a essa altura inviabilizou a sua campanha, porque a repulsa do setor é muito forte”, analisa.
Sobre seu mandato, Eduardo diz ainda estar recebendo ideias dos assessores, mas considera a possibilidade de “não renunciar, deixar o tempo correr e perder o mandato por falta”. Também há uma movimentação, ele adianta, em torno de uma mudança do regimento da Câmara para “casos excepcionalíssimos”, o que o permitiria manter o mandato enquanto segue atuando nos Estados Unidos, participando das votações por telefone. À Folha, porém, ele desdenha da manutenção do cargo e diz não precisar mais “de um diploma de deputado federal para abrir portas e os acessos” que possui no exterior.