A Venezuela realiza neste ano a segunda eleição para cargos eletivos. No próximo dia 27 de julho, os venezuelanos vão votar por prefeitos de 335 cidades em todo o país em uma disputa que pode ampliar ainda mais o poder do Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV).
O grupo do presidente Nicolás Maduro já venceu de maneira acachapante as eleições de governadores e deputados em 25 de maio. Dos 24 estados em disputa, o PSUV levou 23 e ainda conseguiu mais de 90% dos deputados.
Tudo isso partiu de uma estratégia bem consolidada e de uma mobilização massiva dos chavistas, em contraste com um pedido de abstenção da oposição de extrema direita. O governo espera repetir a dose e conseguir ter uma maioria absoluta nos municípios para implementar políticas que estejam interligadas desde a presidência até as prefeituras.
Uma questão fundamental para o governo é a legitimação do chavismo depois de uma eleição presidencial contestada pela oposição de extrema direita em 2024. O governo entende que esse pleito fecha um ciclo de validação do poder constituído no país depois de um ano da vitória de Nicolás Maduro.
Já a oposição liderada pela ex-deputada ultraliberal María Corina Machado pede que os eleitores não participem do pleito. Essa foi a estratégia usada na última eleição para governadores. O objetivo seria “descredibilizar” o pleito a partir de uma alta abstenção.
Para o cientista político Sair Sira, a tendência é que, por esses fatores, o PSUV também conquiste uma vitória expressiva nas eleições municipais.
“Vai se completar o ciclo de legitimação dos poderes Executivo e Legislativo nas três esferas de governo: nacional, regional e municipal. O que é importantíssimo para o PSUV. O PSUV tem não só uma vantagem do exercício da gestão de estar governando e ter a máquina desde o começo, mas também pelo dilema eterno das oposições venezuelanas de participar ou não participar, chamar a abstenção, deslegitimar o processo e mesmo assim seguir participando. Isso evidentemente favorece quem participa”, disse ao Brasil de Fato.
A estratégia da campanha do governo deve ser a mesma da corrida para governadores e deputados. Há dois meses, o caminho desenhado foi deixar as marchas para os últimos dias e focar em uma campanha de aproximação, passando pelas ruas das cidades menores.
Agora, o chefe de campanha e presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, adotou o lema “Mais Perto, Mais Soluções” e tentará, novamente, aproximar os candidatos dos eleitores.
“Nós vamos insistir numa campanha casa por casa. Não saímos das ruas porque vimos a atividade permanente dos governadores eleitos pela revolução venezuelana em uma insistência de como foi a nossa campanha eleitoral para o 25 de maio. Mais do que uma campanha, a meta era começar o trabalho de entender o sentimento das pessoas, o trabalho de ver o que as pessoas estavam pensando. Agora vamos fazer o mesmo”, disse.
A oposição vai, novamente, rachada para o pleito. Desde o começo do ano, Machado pede para que seus eleitores não compareçam às urnas. Nas eleições para governadores o resultado não deu certo. De acordo com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a participação foi de 42,63%. No entanto, foram 5 milhões de votos, o que representa pouco menos de 25% do padrão eleitoral venezuelano, que tem 21 milhões de eleitores registrados.
Eles questionaram a vitória de Nicolás Maduro no ano passado, mas não apresentaram provas ao acusar o processo eleitoral de “fraude”. Os opositores se apegam a uma lacuna deixada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) que, até hoje, não divulgou os resultados detalhados das mesas eleitorais de 2024.
O voto na Venezuela, no entanto, não é obrigatório e o efeito prático foi a conquista de 253 deputados dos 285 disponíveis. A oposição, no entanto, insiste que está muito perto de alcançar os seus objetivos e derrubar o governo Maduro.
Para Sair Sira, tanto a aproximação do PSUV quanto o contexto dos opositores serão determinantes para o resultado deste pleito.
“O partido não funciona só como um partido de quadros com formação ideológica, mas também tem um componente de massa, uma estrutura que pode chegar às ruas, é uma estrutura bem definida. Isso dentro da estrutura eleitoral dá uma vantagem. Há muitos venezuelanos que gostariam de se sentirem representados por esses partidos de direita, que não estão de acordo com as ideias do governo. Mas esta estrutura e contradição dos partidos opositores acabam passando esse recibo”, afirmou.
Há alguns lugares em que a oposição não abre mão por ter um domínio político estabelecido, especialmente as zonas mais ricas. Chacao, Baruta e Lechería são três das cidades mais ricas da Venezuela e hoje são administradas por políticos de direita. Opositores entendem que essas são as “jóias da coroa” porque é onde está o poder político e as maiores cidades do país em termos demográficos.
Valencia, Maracay, Maracaibo, Barquisimeto, Barcelona, Puerto La Cruz também são observados pela direita por conta da importância política e econômica. Não só cidades populosas, a meta da oposição é buscar cidades com posições estratégicas que tenham uma relevância na produção petroleira, fluxo comercial e produção industrial significativa.
Consulta em paralelo
Essa eleição terá uma particularidade, já que será acompanhada da consulta popular da juventude. Essa ferramenta foi criada pelo governo venezuelano para essas eleições para consultar os jovens das comunas venezuelanas sobre projetos de investimento que serão financiados pelo poder público, mas escolhidos pelos moradores.
Toda essa ferramenta é uma continuidade do trabalho que já é feito pelo governo desde abril do ano passado, quando foi realizada a primeira transferência de recursos para as comunas do país.
Para Sira, isso representa uma transformação cada vez mais aprofundada no modelo de governança proposto pelo chavismo.
“Os circuitos comunais estão se posicionando como um novo nível de governo onde a estrutura institucional tradicional, poder público nacional, regional com os governadores, e municipal com prefeitos e vereadores, não tem tanta incidência direta. É uma aposta audaz no marco dos ataques que a economia venezuelana sofre. Que a comunidade possa gerir um pedaço pequeno de recursos públicos é importantíssimo. Isso terá nos novos prefeitos e prefeitas, governadores e governadoras, uma incidência importante”, disse.