Claudia Sheinbaum, manifestou-se contra a retirada do Monumento Encontro — que representa Fidel Castro e Ernesto “Che” Guevara — realizada pela prefeitura de Cuauhtémoc, no México. A chefe de Estado classificou a ação como incorreta e fora dos parâmetros legais.
“Está errado”, declarou nesta quinta-feira(17), durante sua coletiva matinal, e enfatizou que, se a prefeita Alessandra Rojo de la Vega não quiser o monumento em sua demarcação, “que ele seja realocado para outro local”.
O conjunto escultórico foi removido no dia anterior por funcionários da prefeitura, sem a autorização do Comitê de Monumentos e Obras Artísticas em Espaços Públicos (COMAEP), como exige a regulamentação vigente. A Secretaria de Planejamento, Ordenamento Territorial e Coordenação Metropolitana, que preside o comitê, confirmou que não recebeu nenhum pedido formal para a remoção e, por isso, a ação é considerada irregular. A pasta informou que acompanhará o caso de perto.
A escultura foi criada em 2017 pelo artista Óscar Ponzanelli, conhecido como “o escultor das estrelas”, por seus retratos em bronze de personalidades como Juan Gabriel, Roberto Cantoral e Armando Manzanero. A obra foi solicitada por moradores da colônia Tabacalera com o objetivo de resgatar a memória histórica da região.
O Monumento Encontro representa a reunião que ocorreu pela primeira vez no México, em julho de 1955, entre Fidel Castro e Ernesto Guevara — que ainda não havia recebido o apelido de “Che”. O encontro se deu a poucos metros do local onde, anos depois, a escultura foi instalada.
A peça consiste em um banco metálico de parque, sobre o qual estão sentadas as figuras dos dois líderes revolucionários, vestidos com seus trajes típicos de combate: Fidel segura um charuto e um livro; Che, um cachimbo. As esculturas, que juntas pesam 250 quilos, estavam desde 2018 na Praça San Carlos e haviam se tornado um ponto turístico por seu valor cultural e histórico.
No entanto, a prefeitura liderada por Rojo de la Vega ordenou a remoção, alegando que a instalação original não possuía documentação oficial. Em seu perfil no X (antigo Twitter), ela chamou o governo cubano de ditadura e equiparou os líderes da Revolução Cubana a Hitler. “Fidel e Che não são o povo cubano. Assim como Hitler não representou, jamais, o povo alemão”.
No Instagram, a gestora ironizou que, além de inexistir autorização formal de instalação, “nem Fidel, nem Che Guevara pediram permissão para estarem ali [no banco da praça]”. Na legenda, escreveu “Aqui se cumpre a lei. Cuauhtémoc Livre”.
O governo da Cidade do México desmentiu essas alegações, esclarecendo que o monumento foi devidamente aprovado pelo comitê competente na época e que sua instalação foi legal. Assim, a remoção sem trâmites prévios configura uma violação dos procedimentos estabelecidos para intervenções em patrimônio público.
Ao comentar o caso, a presidente defendeu a permanência do monumento, argumentando que as estátuas retratam “um momento histórico, independentemente de se concordar ou não com uma ou outra figura, que tem relação com o México”.
A ação também gerou indignação no meio diplomático. O embaixador de Cuba no México, Marcos Rodríguez Costa, se pronunciou em sua conta na rede X (antigo Twitter) com uma citação de Fidel Castro: “Não existe força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e das ideias”, e acrescentou: “A verdadeira revolução não é de pedra nem de bronze: é a consciência transformada, a vontade coletiva de lutar e construir um mundo mais justo”.
Após a remoção das esculturas, meios de comunicação locais relataram que funcionários do governo estiveram na praça para retirar pessoas em situação de rua que pernoitavam no local. Até o momento, o paradeiro do monumento segue desconhecido.
Por sua vez, o Instituto Mexicano da Juventude manifestou disposição para guardar a obra, caso as autoridades da capital decidam por sua realocação.
Na sexta-feira (18), a chefe do Governo da Cidade do México, Clara Brugada, afirmou que é possível restituir as esculturas dos líderes revolucionários Fidel Castro e Ernesto Che Guevara. A mandatária da capital indicou que as peças poderiam retornar ao seu local original enquanto se desenvolve o processo normativo correspondente para sua instalação.
Além disso, em sintonia com a presidente, Brugada ressaltou a importância de preservar a memória histórica na cidade e garantiu que o governo da capital tomará decisões para recuperar e conservar a história representada por esses personagens no espaço público.
“Monumento Encontro”
Foi no número 49 da rua José de Emparán que Fidel e Che se encontraram pela primeira vez, em julho de 1955. Na época, Guevara vivia no México, após sua passagem pela Guatemala, onde conheceu Julio Roberto Cáceres, “El Patojo”, um jovem guatemalteco com quem dividia moradia e trabalho, tirando fotos nas praças do centro histórico da Cidade do México.
Quando “El Patojo” conseguiu emprego como segurança em um depósito do Fondo de Cultura Económica, Che — leitor voraz e sem dinheiro para comprar livros — passou a dormir no local, aproveitando o acesso ao acervo. Lia literatura de aventura, como a História do México, de José Vasconcelos, e estudava O Capital, de Karl Marx.
Foi Antonio “Ñico” López, um cubano que Che conhecera durante sua estadia na Guatemala, quem o inseriu no núcleo do exílio latino-americano que, naquela época, se reunia na Cidade do México. Por meio de Ñico, Guevara não apenas se conectou com os irmãos Castro, como também com uma rede política de ideias insurgentes que, em meados do século XX, via no México um raro refúgio para pensamento e ação revolucionária.
Desde o governo de Lázaro Cárdenas (1934–1940), o México havia consolidado uma política de portas abertas para perseguidos políticos de todo o mundo. O país acolheu centenas de combatentes republicanos após a derrota na Guerra Civil Espanhola e protagonizou um dos gestos mais audaciosos de solidariedade internacional ao receber León Trotsky, o fundador do Exército Vermelho, numa época em que sua figura era rejeitada até por muitos governos de esquerda.
Em meados da década de 1950, a Cidade do México era um verdadeiro caldeirão político. Militantes de toda a América Central e do Caribe se reuniam no coração da capital mexicana, conspirando contra as ditaduras de seus países.
Foi através de Ñico que Che conheceu Raúl Castro, que o apresentou a um grupo de jovens cubanos que havia tentado tomar o Quartel Moncada, em oposição à ditadura de Fulgencio Batista. Naquela época, ainda eram pouco conhecidos fora de Cuba.
Naquela noite em que se encontraram pela primeira vez, Che e Fidel conversaram até de madrugada sobre a situação política de Cuba e da América Latina. Mais tarde, em cartas enviadas à sua mãe, Guevara contou que, entre todos os grupos revolucionários que conheceu no exílio, o liderado por Fidel foi o que mais o convenceu — pela firmeza, pela clareza ideológica e pela disposição de agir.
Daquele encontro nasceria uma história que transformaria para sempre a América Latina e o Caribe.