O presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, deputado estadual Adão Pretto (PT), formalizou nesta quarta-feira (23) um pedido de audiência pública para tratar do Projeto de Lei 280/2025. A proposição foi encaminhada em regime de urgência pelo governador Eduardo Leite (PSD) e trata da transferência de uma área da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro), em Viamão, à administração municipal.
O terreno em questão tem 144 hectares e está atualmente ocupado por 57 famílias do povo Mbya Guarani. No local, foram erguidas moradias, funciona uma escola estadual e os moradores têm acesso a água potável e atendimento de saúde por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). O PL propõe a doação a Viamão de 88 hectares.

A solicitação de audiência ocorreu após reunião com o secretário nacional de Territórios Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, Marcos Kaingang, que manifestou preocupação com o projeto do Executivo estadual. Segundo Kaingang, a medida desconsidera um Acordo de Cooperação Técnica entre o governo federal e o estado, que estabelece a permanência da comunidade indígena na área e prevê a compensação do valor da terra na dívida estadual com a União.
De acordo com informações do parlamentar, caso o projeto seja aprovado pela Assembleia, a prefeitura de Viamão poderá repassar o imóvel à iniciativa privada. O objetivo seria viabilizar um empreendimento voltado a atividades logísticas, empresariais e tecnológicas. A proposta, no entanto, gerou resistência entre representantes indígenas, parlamentares e órgãos públicos.

O Ministério Público Federal (MPF) já emitiu parecer contrário à proposta. Em manifestação assinada pelo procurador da República Ricardo Gralha Massia, o MPF destaca que a área faz parte do Acordo de Cooperação Técnica voltado à regularização fundiária de territórios ocupados por povos originários no Rio Grande do Sul.
Além disso, lideranças da comunidade Mbya Guarani relatam que não foram consultadas previamente sobre a proposta, em descumprimento à Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que assegura o direito à consulta livre, prévia e informada em casos que impactem diretamente territórios tradicionais. O cacique Eloir Werá Xondaro afirmou que nenhuma instância do poder público buscou ouvir os moradores antes do envio do projeto ao Legislativo.
Durante a reunião com o secretário Marcos Kaingang, o deputado Adão Pretto relembrou que, quando exerceu mandato na Câmara de Vereadores de Viamão, atuou contra a tentativa de construção de um presídio na mesma área, ainda durante o governo José Ivo Sartori. Segundo o parlamentar, a atual proposta representa um novo risco à permanência da comunidade indígena no território.
O pedido de audiência pública será analisado na primeira sessão da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos após o recesso parlamentar, agendada para o dia 6 de agosto. A expectativa é reunir representantes do governo do estado, do Ministério Público, da Prefeitura de Viamão, da comunidade Mbya Guarani e de órgãos federais para debater os impactos do projeto de lei e os direitos territoriais indígenas.
