Na manhã desta segunda-feira (28), o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma os interrogatórios do chamado “núcleo 3” da tentativa de golpe de Estado, composto por nove militares e um policial federal, acusados de monitorar alvos e planejar um assassinato contra autoridades, como o ministro Alexandre de Moraes. Para o cientista político Paulo Roberto de Souza, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o cenário para condenações é cada vez mais consolidado.
“É inevitável que a maior parte dos envolvidos sofra alguma condenação ou sanção, isso está muito claro”, afirma, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. Segundo ele, o movimento de figuras como o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o senador Marcos Do Val (Podemos-ES) nos Estados Unidos busca “relativizar e diminuir penas”, e não impedir o processo. “A tendência é de que sejam condenados nos próximos meses até o final do ano, pelo que se está apresentando no calendário”, prevê.
Os depoimentos desta fase, no entanto, devem trazer poucos avanços, na visão do professor. “Estou pouco otimista de que vá sair algo significativo desses depoimentos hoje”, opina. Apesar disso, ele chama atenção para o tenente-coronel Rodrigo Bezerra Azevedo. “Ele é o maior destaque após Mauro Cid […], pode ser que traga alguma novidade, uma vez que ele está com um alvo nele”, indica.
Entre os réus do “núcleo 3” estão três coronéis do Exército (Bernardo Romão Correa Netto, Fabrício Moreira de Bastos e Márcio Nunes de Resende Jr.) e cinco tenentes-coronéis (Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira, Rodrigo Bezerra de Azevedo, Ronald Ferreira de Araújo Jr. e Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros), além do agente da Polícia Federal Wladimir Matos Soares e do general da reserva Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira.
Já o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está em uma “posição frágil” e sua conduta pode pesar nas decisões do STF, conforme Souza. “Se ele continuar [tensionando], eu acho que ele vai levar a situação a necessariamente uma prisão preventiva”, diz, citando a recente visita de Bolsonaro ao Congresso como provocação. “Ele parece ainda muito assustado, então vamos ver a tendência que ele se comporte um pouco, tentando evitar essa prisão”, avalia.
Tarifaço dos EUA: impacto no PIB paulista pode chegar a 2,7%
O cientista político também comentou a tensão diplomática e econômica envolvendo os EUA e a taxação a produtos brasileiros prevista para sexta-feira (1º), particularmente no agronegócio. Segundo ele, uma negociação ainda é possível, mas é “muito improvável” de resultar na extinção completa das tarifas.
“A tendência é que [a taxação] seja mais próxima de 50% do que de zero”, sugere. Ele critica o papel de parte da mídia, que estaria abandonando o discurso de defesa da soberania nacional para atender a interesses econômicos. “Começa-se a ter esse tensionamento, pressionando o governo federal como se ele tivesse responsabilidade sobre isso”, observa.
O impacto da medida do presidente dos EUA, Donald Trump, diz ele, deve ser sentido principalmente em São Paulo, onde o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) é acusado de agir contra o Brasil ao apoiá-la. “Se ela for aplicada de forma integral, a expectativa é que o PIB [Produto Interno Bruto] do estado de São Paulo tenha uma queda de 2,7%”, informa.
Apesar disso, medidas do governo federal como o plano de contingência e o Programa Acredita Exportação podem ajudar setores afetados a se rearticularem. “Programas como esse acenam para um ganho de tempo (…), uma abertura da janela para o nosso comércio, nossos exportadores se rearticularem”, explica.
Volta do Congresso deve acirrar tensões; foco será em IR e golpe
Com o fim do recesso parlamentar, Souza projeta semanas “muito interessantes”, com destaque para a volta das discussões sobre a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem recebe até R$ 5 mil mensais. “É uma promessa da campanha do Lula de 2022 (…) e pode melhorar a avaliação do governo”, diz.
A extrema direita, por sua vez, deve usar o retorno do Congresso para tentar “salvar Bolsonaro”. Segundo ele, o debate em torno da tentativa de golpe é mais profundo do que aparenta. “Estamos disputando na sociedade brasileira quais são as linhas da Constituição”, analisa. “Até que ponto vá se admitir que pessoas com cargos eletivos possam agir de forma como se não tivessem nenhuma responsabilidade, por um pretexto baseado em liberdade de expressão irrestrita”, complementa.
Sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), ele acredita que o avanço será tímido no curto prazo, devido ao descompasso entre Congresso e Executivo. “O Congresso continua nesse tensionamento de uma agenda própria, e de uma necessidade de se posicionar sobre as eleições do ano que vem”, aponta.
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