Em 4 de fevereiro de 2025, o presidente Trump, dos EUA, recebeu na Casa Branca o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e afirmou que os EUA tomariam a Faixa de Gaza e deslocaria os palestinos de lá para construir ali um resort mediterrâneo e que os palestinos adorariam deixar suas terras arrasadas se tivessem a opção. O líder israelense não esboçou nenhuma indignação e pelo contrário reafirmou a amizade entre os dois países.
Esqueceu de combinar com os palestinos e com os países vizinhos e a proposta foi rechaçada tanto pelos donos da terra como por egípcios e jordanianos que já acolheram historicamente milhares de refugiados palestinos.
O que vêm ocorrendo recentemente é um confinamento ainda maior dos moradores de Gaza, agora no sudoeste do território onde teoricamente terão acesso a comida e água – itens essenciais a vida que se tornaram raros em consequência do bloqueio israelense à região – mas para isso passariam por uma revista para entrar nesse gueto e não mais poderiam sair, ao menos que “optem” pelo exílio.
A Axios informou, no dia 18 de julho, que o chefe do Mossad, serviço de inteligência de Israel, David Barnea, se reuniu com o enviado especial estado-unidense Steve Witkoff para tratar da realocação dos moradores de Gaza. Ele disse que a Etiópia, a Indonésia e a Líbia expressaram sua abertura para receber muitos palestinos.
Outra possibilidade já cogitada foi a Síria, que conta com um novo governo que ainda carece de legitimidade, formado por um grupo antes considerado terrorista pelos EUA, que assumiram o poder após o golpe ao então presidente Bashar al-Assad. E são alvo de novas ofensivas militares israelenses. Portanto o atendimento desta demanda de realocação dos palestinos, poderia favorecer a legitimação internacional do governo sírio e cessar as agressões israelenses.
A Human Rights Watch, através de seu diretor Omar Shakir, afirma que a retirada dos palestinos da Faixa de Gaza pode ser considerada crime de guerra e mesmo especialistas jurídicos dos EUA como Susan M. Akram, professora clínica de direito da Boston University, referendam esse entendimento.
Disputa pelo território
É verdade que em abril desse ano a Indonésia havia dito que poderia acolher provisoriamente palestinos, sobretudo feridos, mas até então não se cogitava uma transferência permanente.
A NBC News informou em maio que o governo Trump estava trabalhando em um plano para enviar permanentemente 1 milhão de palestinos de Gaza para a Líbia. Ele acrescentou que, em troca, o país do norte da África veria a liberação de bilhões de dólares congelados pelos Estados Unidos há anos.
A Líbia passa por instabilidade e facções políticas estão em conflito desde que uma guerra civil derrubou o governo e assassinou o presidente Muammar Kadafi, há quase 14 anos e desde então possuí dois governos rivais — um no oeste, liderado por Abdul Hamid Dbeibah, e outro no leste, comandado por Khalifa Haftar. Este poderia ser mais um ingrediente de disputa no território líbio pelo controle das reservas cambiais congeladas, mas nenhum dos lados se manifestou oficialmente.
Trump além de lançar a ideia de realocar os habitantes de Gaza, em razão da destruição da maior parte de seu território, após mais de um ano e meio de guerra, também sugeriu novamente que os Estados Unidos deveriam assumir o enclave devastado pela guerra, que poderia se tornar uma “zona de liberdade”.
:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::
Posteriormente Trump desdenhou do “empreendimento” como quem quer “comprar”, ele disse neste mês que Gaza era “um dos piores negócios imobiliários já feitos”, acrescentando que Israel “desistiu da propriedade à beira-mar” quando se retirou da faixa em 2005.
O fato que se apresenta é a possibilidade de uma cogestão estado-unidense para Faixa de Gaza também pretendida por Israel, o que poderia levar a um regime de administração diferenciado, talvez uma zona franca ao menos para o capital dos EUA, ou mesmo um regime fiscal diferenciado, tudo com a justificativa do empreendimento imobiliário.
Quem sabe até um território que goze de alguma autonomia onde Netanyahu e Trump possam usufruir de seus patrimônios sem o rigor das leis dos países que hoje comandam?
O sionismo é um movimento político que fundamentou a criação de um estado nacional para os judeus no mesmo local onde existiu o antigo Reino de Israel e que há mais de um milênio é habitado majoritariamente pelos palestinos, que tem sido expulsos por sucessivos ataques e apropriações de seus territórios desde a primeira metade do século passado.
Hoje também há um segmento fundamentalista cristão que se baseia na interpretação do antigo testamento bíblico, e vincula a permanência dos judeus em Israel para o cumprimento das profecias do retorno de Cristo ao nosso mundo, e podem ser compreendidos como sionistas cristãos.
Nos EUA, Trump teve o apoio político da grande maioria destes dois grupos e uma distorcida interpretação teológica dos fatos pode novamente servir aos interesses destes governantes, representantes da extrema direita mundial.
Paulo Henrique Santos Fonseca é professor municipal de Geografia de Belo Horizonte e Contagem
—
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
