O presidente estadunidense Donald Trump assinou nesta quarta-feira (30) uma ordem executiva que impõe uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros. A medida entra em vigor na próxima quarta-feira (6). A Casa Branca justificou a decisão com base na International Emergency Economic Powers Act, alegando que ações do governo brasileiro representam uma “ameaça extraordinária” à segurança nacional dos EUA.
Ficaram de fora da taxação alguns itens listados como essenciais à cadeia produtiva dos Estados Unidos. Entre os produtos isentos estão o petróleo cru, o suco de laranja concentrado, aviões comerciais e suas partes, além de medicamentos, reagentes imunológicos, instrumentos de uso médico-cirúrgico e chapas finas de aço inoxidável. A exclusão desses produtos consta na ordem executiva publicada pela Casa Branca.
Entretanto, setores importantes do extrativismo e da agricultura permanecem taxados, como o café, a carne, a soja, o açaí, o mel, as frutas in natura e o cacau. De acordo com o comunicado oficial da Casa Branca, a tarifação é uma resposta direta a uma “emergência nacional” provocada por ações do governo brasileiro, que estariam ameaçando “a segurança, a política externa e a economia dos Estados Unidos”. O International Emergency Economic Powers Act é uma legislação dos anos 1970 que permite sanções em casos de “ameaça extraordinária” à segurança nacional.
Apesar do recuo, ataques permanecem
No texto, o governo Trump acusa o Estado brasileiro de perseguir politicamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados, além de promover “graves violações de direitos humanos” e comprometer o Estado de Direito. “A perseguição, intimidação, assédio, censura e processos contra Jair Bolsonaro e milhares de seus apoiadores são abusos sérios”, diz o documento.
A ordem também ataca diretamente o Supremo Tribunal Federal (STF), com destaque para o ministro Alexandre de Moraes. Segundo a Casa Branca, Moraes teria atuado de forma coordenada com outros membros do Judiciário para censurar opositores políticos, inclusive nos Estados Unidos.
A acusação inclui o uso de medidas como multas, congelamento de ativos, ameaças de processo criminal e exclusão de plataformas digitais como forma de pressionar empresas estadunidense.
Entre os exemplos citados, está o caso do comentarista bolsonarista Paulo Figueiredo, neto do ditador João Batista Figueiredo, processado no Brasil por declarações feitas em território estadunidense. A Casa Branca afirma que isso representa uma violação da liberdade de expressão de cidadãos dos EUA.
A ordem também acusa o governo brasileiro de coagir grandes empresas de tecnologia dos EUA com exigências para alterar políticas de moderação de conteúdo, entregar dados de usuários ou enfrentar punições legais. “Essas ações minam não apenas a operação das empresas estadunidenses no Brasil, mas também a política dos EUA de promover eleições livres e direitos fundamentais”, diz o texto.
Como retaliação adicional, Trump determinou a revogação de vistos de Alexandre de Moraes, “de seus aliados” no STF (sem, contudo, citar nomes) e de seus familiares. Segundo o comunicado, a medida visa responsabilizar autoridades brasileiras por violações de direitos humanos e por supostas tentativas de censura.
A Casa Branca conclui que a tarifação é parte da política “America First” e representa o uso legítimo de instrumentos econômicos para defender os interesses dos Estados Unidos. “Trump está salvando a economia americana dos decretos arbitrários de um juiz estrangeiro tirânico”, afirma o texto.
Brasil apostou em diálogo e defesa de soberania, enquanto aliados de Bolsonaro articularam sanções
Apesar da retaliação, a resposta brasileira tem se concentrado na defesa da soberania, da democracia e da legalidade. Nos últimos dias, o governo brasileiro intensificou as tentativas diplomáticas para barrar o tarifaço de 50% imposto por Donald Trump. O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) tem liderado as conversas com autoridades norte-americanas, incluindo o secretário de Comércio, Howard Lutnick, e representantes do setor privado. “É um perde-perde que também não é bom para os Estados Unidos”, disse Alckmin, criticando a medida imposta por Trump como “totalmente injustificável”.
Enquanto Alckmin protagonizou os diálogos no Brasil, Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores, esteve em Nova York (EUA) entre domingo (27) e terça-feira (29), buscando negociar com o governo Trump. O chanceler também representou o Brasil em reuniões da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o massacre palestino no Oriente Médio.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também se manifestou. Em discurso no interior do Rio de Janeiro, nesta segunda-feira (28), criticou duramente o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que, segundo ele, viajou aos Estados Unidos para pedir a imposição de sanções contra o Brasil. “O cara que vivia enrolado na bandeira nacional agora está pedindo para atacar o Brasil”, afirmou. Lula defendeu o diálogo institucional e reafirmou que o Brasil “não quer briga, quer negociar”.
Lula também afirmou que Jair Bolsonaro não será julgado pelo governo, mas pela Justiça, e criticou a tentativa de interferência internacional no processo. Segundo ele, o ex-presidente “não merece o sacrifício do povo brasileiro” e deve responder por seus atos conforme as leis do país. Lula reforçou que o Brasil é uma democracia, com instituições funcionando, e que não aceitará pressões externas para interferir no curso do Judiciário. Ele repetiu o discurso em entrevista ao jornal estadunidense New York Times, publicada nesta quarta.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, seguiu na mesma linha e rechaçou qualquer submissão diplomática. “Você não vai querer que o presidente Lula se comporte como o Bolsonaro abanando o rabo e falando ‘I love you’”, afirmou à CNN. Segundo Haddad, o governo brasileiro segue buscando canais institucionais para garantir que o conflito seja resolvido com racionalidade, sem ceder a pressões externas.
Enquanto o governo e setores da sociedade civil brasileira defendem a soberania nacional, aliados do ex-presidente Bolsonaro atuam para aprofundar a crise. Eduardo Bolsonaro, segundo revelou a imprensa, telefonou para gabinetes de senadores dos EUA para tentar minar o trabalho da comitiva oficial do Senado brasileiro, que esteve em Washington para tentar reverter a medida. O deputado também defende, publicamente, que a única saída para a crise seria anistiar seu pai ou paralisar o julgamento por tentativa de golpe de Estado.
Outro nome citado no comunicado da Casa Branca é o do comentarista bolsonarista
A inclusão do nome do bolsonarista Paulo Figueiredo – que reside nos Estados Unidos e enfrenta processo no Brasil – na justificativa do tarifaço ajuda a mostrar o grau de instrumentalização política da medida por parte do governo Trump.