Começou nesta quinta-feira (31) e segue até o domingo (3), no Agreste de Pernambuco, a última etapa preparatória da Jornada de Alfabetização nas Periferias, campanha de educação popular que visa alcançar entre 2,5 mil e 3 mil pernambucanos que não sabem ler ou escrever. O projeto é liderado pela Campanha Mãos Solidárias, com apoio financeiro da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Secretaria de Alfabetização de Jovens e Adultos (Secadi), do Ministério da Educação.
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As aulas de alfabetização serão conduzidas por educadores populares. Eles têm se preparado ao longo dos últimos meses em cursos como o que ocorre nestes dias, no Assentamento Normandia, zona rural de Caruaru. “Falamos sobre a concepção e os fundamentos da educação de jovens e adultos. Depois vamos estudar especificamente a técnica e o método Sim, eu posso, que já foi aplicado com sucesso em diversos países da América Latina, Caribe e África”, explica Ana Gusmão, uma das coordenadoras da campanha educativa.
Cada educador popular é responsável por facilitar o aprendizado em uma turma, normalmente dentro das comunidades em que vivem. Em Pernambuco, o início das aulas está previsto para a segunda-feira (11), realizadas em espaços de igrejas, terreiros, associações de moradores dentro daquele território. Os encontros têm duração de duas horas por dia, de segunda-feira a quinta-feira, reservando a sexta-feira para um encontro entre educadores e coordenadores para avaliar a semana e planejar a seguinte.
Gusmão explica que o método é inspirado pela perspectiva do renomado educador pernambucano Paulo Freire. “Além da apropriação da escrita e leitura por estas pessoas que, por motivos diversos, foram excluídas deste processo, esperamos contribuir também para o avanço da consciência política e organizativa dessas comunidades. Além de ler a palavra, queremos que os estudantes aprendam a ler o mundo”, diz a coordenadora. Com duração de cinco meses, a jornada deve ser encerrada em janeiro de 2026.
Em Pernambuco são 200 turmas, com entre 14 e 20 alunos cada, nos municípios do Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe, Caruaru e Petrolina. Segundo o Censo 2022, do IBGE, mais de 960 mil pernambucanos com 15 anos ou mais não sabem ler ou escrever, índice que corresponde a 13,4% da população nessa faixa etária, quase o dobro dos 7% da taxa nacional.

Na capital pernambucana, o Censo apontou mais de 67 mil pessoas (5,5% da população a partir dos 15 anos) não alfabetizadas, prejudicadas na realização de atividades do dia a dia, como fazer compras no supermercado, seguir instruções ou placas para encontrar um endereço, tomar o remédios corretamente ou se comunicar via Whatsapp. Para reduzir estes índices, a Jornada de Alfabetização terá 150 turmas na Região Metropolitana do Recife, além de 30 em Caruaru e 20 em Petrolina.
O índice de pessoas excluídas do letramento varia entre grupos sociais ou regionais, sendo o analfabetismo mais um elemento das desigualdades sociais e econômicas que marcam o acesso à educação no país. Nacionalmente, as pessoas pardas (8,8%), pretas (10,1%), nordestinas (14,2%), indígenas (20,8%) e quilombolas (25,9%) estão entre os grupos com as maiores taxas de analfabetismo. Isso levou a campanha a concentrar esforços nos nove estados da região Nordeste, além de turmas em Minas Gerais e São Paulo.
O método Sim, eu posso foi desenvolvido na década de 1990, pelo Instituto Pedagógico Latino-Americano e Caribenho, e colocado em prática em Cuba. Em mais de três décadas, a metodologia foi aperfeiçoada e aplicada no Haiti, Venezuela, Zâmbia e outras nações. No Brasil, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) usa desde 2006 o método nos assentamentos. O poder público também aplicou, casos da Prefeitura de Maricá (RJ) e dos governos estaduais da Bahia e do Maranhão.
Em todo o Brasil são 1.350 turmas, cada uma tendo um educador responsável, auxiliado por coordenadores de turmas, coordenadores pedagógicos, mobilizadores sociais e comunicadores populares. O objetivo é alfabetizar 18 mil pessoas em todo o país. A campanha está estruturada desde o primeiro semestre e tinha previsão inicial para começar no mês de março, mas seguidos atrasos no repasse de recursos para viabilizar as aulas postergaram o início da campanha.
A iniciativa integra o Pacto EJA pela Superação do Analfabetismo, do MEC. Integram a Jornada de Alfabetização organizações da sociedade civil como o Movimento Sem Terra (MST), Movimento Brasil Popular (MBP), o Levante Popular da Juventude, o Movimento dos Trabalhadores por Direitos (MTD) e o Movimento Camponês Popular (MCP).