Em visita ao assentamento Cícero Guedes na manhã desta sexta-feira (1º), o Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, anunciou que está em fase final o processo para 185 famílias serem assentadas definitivamente na região onde funcionava a Usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense.
O ministro enalteceu o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) por reivindicar justiça social na região, e pela preservação da memória dos que foram tombados em nome dessa luta. Muitos foram os crimes ocorridos nas dependências da Usina Cambahyba, que teve sua estrutura usada para desaparecer corpos durante a ditadura militar.
“Agora essa usina representa a memória daqueles que lutaram contra a ditadura e de um trabalhador rural que foi morto e que leva o nome nesse assentamento que é Cícero Guedes”, disse Teixeira ao lado de outras autoridades e representantes do MST.
“Vamos transformar esse lugar em terra de esperança, alegria, prosperidade e desenvolvimento. Fazer com que seja espaço de fartura de alimentos, campo produtivo, com tecnologia. Transformar o lugar em uma comunidade com esporte, lazer, educação, um lugar bom de se viver e que tenha progresso”, completou o ministro do Desenvolvimento Agrário.
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“O MST foi muito importante para essa luta acontecer e agora essas famílias estão sendo selecionadas”, emendou o ministro se referindo ao edital do Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA) que vai contemplar as famílias agricultoras.
A Usina Cambahyba foi desapropriada por não cumprir função social, mas também por crimes ambientais e pela utilização de trabalho análogo ao escravo. Em paralelo à demanda por Reforma Agrária, o MST reivindica a instalação de um memorial para as vítimas da ditadura que foram incineradas nas antigas usinas de cana-de-açúcar.
Presente na comitiva, o assessor especial de Defesa da Democracia, Memória e Verdade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Nilmário Miranda, reforçou que a sede da Usina, hoje em ruínas, vai se tornar o Memorial Cícero Guedes, para que a história de militantes como ele não seja esquecida.
“Eles [do MST] foram verdadeiros guardiões dessa memória. Por isso que nós queremos fazer aqui um memorial Cícero Guerreiro que foi um herói também. Ele foi morto em nome da luta do povo brasileiro, a luta mais profunda. Essa memória é fundamental para que essa história nunca se esqueça e nunca mais aconteça”, disse.
Conquista histórica
Durante o ato no assentamento Cícero Guedes, que recebeu pela primeira vez a visita de um ministro do governo Lula (PT), foi anunciada uma reunião para o dia 13 de agosto com a direção estadual do movimento com Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Brasília para definir os próximos passos depois do assentamento das famílias.
Segundo Teixeira, a proposta é desenvolver no assentamento Cícero Guedes projetos com acesso a crédito e assistência técnica para formação de cooperativas de produção de alimentos saudáveis. Além disso, há outras áreas que também podem ter a destinação da Reforma Agrária como a Fazenda São Cristóvão, ocupada recentemente pelo MST e que pode simbolizar o assentamento de 500 famílias.
Para a deputada estadual Marina do MST (PT), “a realização do assentamento na área da Cambahyba tem um histórico profundo para democracia do Brasil”, afirmou a parlamentar e amiga de longa data de Cícero Guedes, de quem esteve ao lado em tantas mobilizações do movimento na região ao longo dos anos.
“Essa visita significa que o Governo Federal reconhece a luta diária, a importância que cada companheiro tem, pela democratização da terra. É o sucesso do nosso projeto de desenvolver a região Norte e Noroeste Fluminense com saúde, qualidade de vida, comida boa no prato, esperança”, destacou Marina.
Filho de Cícero Guedes, Mateus Santos, da direção nacional do MST, relembrou que o pai tinha o sonho de ver a Reforma Agrária se concretizar nas áreas onde trabalhou como cortador de cana e boia-fria.

“É um momento histórico, de muito orgulho. Essa terra é marcada pelo sangue de militantes que lutaram contra a ditadura e de sangue também do movimento sem terra. E agora respira ares de esperança e prosperidade. Como dirigente do MST, ex-boia-fria e cortador de cana, o meu pai dizia que ele só descansaria quando todas as áreas da região na pauta da Reforma Agrária fossem desapropriadas. E hoje eu tenho certeza que de onde ele estiver, está muito feliz”, disse Santos.
A comitiva também contou com o Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Cesar Aldrighi; a Reitora da UENF, Rosana Rodrigues; o Diretor da UFF em Campos, Antonio Claudio Lucas da Nóbrega; a ex-diretora da UFF Campos, professora Ana Costa; o Reitor do IFF Campos, Victor Saraiva; o coordenador do Sindipetro-NF, Sérgio Borges; Victor Tinoco e Maria Lúcia de Pontes, superintendentes do Incra no RJ; e a deputada estadual Carla Machado (PT).
Marcaram presença ainda representantes dos acampamentos Leonel Brizola e 15 de Abril, símbolos da luta pelo acesso à terra no município do Norte Fluminense.
Usina Sapucaia
Também foi celebrada no encontro a autorização da Justiça Federal de transferência da fazenda Santa Luzia, em Campos, para o Incra assentar cerca de 100 famílias de agricultores.
Em fevereiro, a fazenda que pertencia à Usina Sapucaia foi ocupada pelo MST para pressionar a destinação do local para fins de Reforma Agrária. Agora, com a conclusão do processo de adjudicação, pleiteado pelo movimento, o Incra e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) podem dar início ao processo de transferência das terras que somam 1.104 hectares.
A adjudicação acontece quando um bem penhorado de um devedor é transferido a um credor — como forma de quitação parcial da dívida fiscal da empresa com a União. Em agosto, o local também será pauta na reunião da direção estadual do MST com o Incra em Brasília.