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ARTIGO

A invisibilidade das mulheres na maternidade solo: dever unilateral?

É preciso dar voz a inúmeras mulheres que enfrentam diariamente as consequências do abandono afetivo paterno

04.ago.2025 às 18h07
Belo Horizonte (MG)
Rosemeire Cardoso
A invisibilidade das mulheres na maternidade solo: dever unilateral?

"Do lado das mulheres que exercem a maternidade sem apoio paterno, recaem responsabilidades diárias e intransferíveis: saúde, educação, alimentação, acolhimento emocional, rotina, segurança e todas as decisões importantes relacionadas aos filhos". - Foto: Sidney Oliveira/ Ag. Pará

Meu nome é Rosemeire, tenho 36 anos, sou professora da rede pública de ensino e atuo em uma escola localizada na região metropolitana de Belo Horizonte. Trabalho em dois turnos e passo, em média, 12 horas por dia fora de casa. Essa rotina extensa é necessária para garantir o sustento do meu lar e proporcionar à minha filha uma vida digna. E, quando falo em dignidade, não me refiro a luxo, mas ao atendimento das necessidades básicas.

Sou mãe da Júlia, atualmente com 9 anos. Moro distante da minha família, pois precisei me estabelecer próxima ao trabalho, buscando conciliar da melhor forma possível minha profissão com o cuidado diário e integral à minha filha.

Não conto com rede de apoio. E, mesmo que essa estrutura existisse, ela jamais substituiria o papel do pai. É importante valorizar a ajuda solidária de parentes ou amigos, mas é igualmente fundamental reconhecer que o envolvimento paterno não é um favor — é um dever legal, emocional e humano.

Sigo como única responsável por todas as demandas da casa, da saúde, da educação e do bem-estar da Júlia.

Escrevo esta carta como um gesto de resistência e esperança. Desejo dar voz a inúmeras mulheres que, assim como eu — ainda que em contextos e realidades distintas — enfrentam diariamente as consequências do abandono afetivo paterno.

Trata-se de um problema social invisibilizado, mas que afeta profundamente o desenvolvimento emocional das crianças e impõe uma sobrecarga exaustiva a milhares de mulheres que criam seus filhos sozinhas em todo o Brasil.

Pai uma vez por mês

Após minha separação do pai da minha filha, quando ela tinha apenas 1 ano e 6 meses, ele nunca participou efetivamente da vida dela. Nos primeiros anos, o contato existia apenas porque eu insistia, convicta de que minha filha tinha o direito fundamental de manter algum vínculo com o pai.

Contudo, nos últimos dois anos, esse vínculo se reduziu a um único dia de visita por mês, quando ele a busca pela manhã e a devolve ao final do dia.

Por um único dia, ele veste o papel de pai. Registra o momento com fotos, compartilha nas redes e alimenta uma imagem pública que não condiz com a verdade. No cotidiano, silencia. Não liga, não pergunta, não participa da escola, da saúde, das emoções ou da rotina da filha. É uma presença pontual, quase simbólica — e, ainda assim, socialmente aceita.

Ao buscar sua colaboração — seja para acompanhá-la a consultas médicas, participar de apresentações escolares ou tratar de outras demandas relacionadas à filha — a resposta frequente é negativa: “não posso”.

Essa ausência paterna não é simbólica, é concreta. Quem mais sofre com isso são os filhos. Júlia, por exemplo, já passou por acompanhamento psicológico para lidar com a dor da ausência. Já me perguntou por que o pai não a vê com mais frequência e chegou a desejar que eu me casasse novamente para “ter outro pai”.

Do lado das mulheres que exercem a maternidade sem apoio paterno, recaem responsabilidades diárias e intransferíveis: saúde, educação, alimentação, acolhimento emocional, rotina, segurança e todas as decisões importantes relacionadas aos filhos.

Essa sobrecarga, enfrentada por milhões de brasileiras, tem levado a crises de ansiedade, exaustão física e emocional, além de um sentimento constante de abandono — não apenas enquanto mães, mas enquanto mulheres.

Normalizar o abandono

Segundo dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV, 2024), o Brasil tem cerca de 11,3 milhões de famílias chefiadas por mulheres. Muitas enfrentam a ausência de corresponsabilidade paterna, tanto afetiva quanto financeira. Tentativas de diálogo e de envolvimento por parte dessas mães muitas vezes não resultam em mudança de postura dos pais ausentes.

A sociedade, por sua vez, normaliza esse abandono. As políticas públicas o ignoram. E o peso recai sobre nós, que seguimos invisíveis aos olhos do Estado e, muitas vezes, da Justiça.

O abandono afetivo é, sim, uma violação de direitos. A Constituição Federal, em seu artigo 227, estabelece que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reforça essa obrigação em seu artigo 4º, estabelecendo que esses direitos são responsabilidade solidária entre pais, Estado e sociedade. Já o artigo 22 do ECA é ainda mais direto. “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda o dever de cumprir e fazer cumprir os direitos da criança e do adolescente”.

Pais que se omitem de forma voluntária e recorrente, mesmo tendo condições de exercer seus deveres, violam frontalmente esses dispositivos legais. Embora muitas vezes negligenciado pelas instituições, o abandono afetivo tem sido, cada vez mais, reconhecido pelos tribunais brasileiros como passível de reparação por danos morais.

Mas ainda precisamos nos perguntar:

Qual é, afinal, o papel de um pai?

Vivemos sob uma estrutura patriarcal que normaliza o pai ausente e romantiza o mínimo. Pagar pensão é visto como ato de responsabilidade suficiente, quando, na verdade, filhos não precisam apenas de dinheiro — mas de vínculo, cuidado, afeto e presença.

Criar filhos sozinha não é heroísmo. É cansaço. É ausência de escolhas. E ainda há quem pergunte: “mas ele paga pensão?”, como se isso bastasse. Como se uma transferência bancária pudesse substituir o tempo de qualidade, os colos, os abraços, as conversas nas madrugadas difíceis, a presença nas reuniões da escola, nos aniversários e nas doenças.

Pior: muitas vezes, esse valor é irrisório e padronizado, o que obriga as mulheres a trabalharem longas horas e, por consequência, se ausentarem dos próprios filhos. Eles sofrem duas vezes: pela ausência do pai, e pela ausência da mãe que precisa prover.

Um dos argumentos que frequentemente ouvimos para justificar a ausência paterna é que “amor não se obriga” ou que “não se pode forçar ninguém a ser pai”. Embora essas frases soem como um apelo à liberdade e à espontaneidade dos sentimentos, escondem uma visão simplista e injusta da paternidade.

A paternidade não é apenas uma questão de amor ou vontade momentânea, mas um compromisso legal, ético e social. A Constituição Federal, o ECA e o Código Civil deixam claro que o pai tem obrigações para com o filho — não apenas financeiras, mas também emocionais, educacionais e de presença ativa na vida da criança.

Se fosse apenas uma questão de “amor espontâneo”, estaríamos desconsiderando a importância do cuidado, da responsabilidade e do compromisso contínuo que uma criança merece. Crianças não vivem só de sentimentos, mas também de ações concretas — alguém que as ampare, cuide, esteja presente, proteja e eduque.

Vivenciando a maternidade sem apoio há oito anos, posso afirmar que meu tempo de descanso é quase inexistente, limitado a poucas horas uma vez por mês. Nesse curto intervalo, esforço-me para lembrar que, além de ser mãe, sou mulher — uma pessoa que também precisa viver sua vida social, cuidar da saúde física e mental e nutrir suas emoções. Essas necessidades são essenciais e não podem ser ignoradas.

Entretanto, a responsabilidade pela criação dos filhos continua recaindo quase que exclusivamente sobre as mulheres, enquanto os pais ausentes seguem ilesos, blindados por uma cultura que naturaliza sua omissão.

Violência institucional

Essa visão distorcida, que coloca a responsabilidade exclusivamente sobre nossos ombros enquanto deslegitima nossas capacidades, infelizmente está presente até em espaços onde o acolhimento deveria ser prioridade.

Em abril de 2024, levei minha filha a uma consulta com um neuropediatra para investigar uma suspeita de déficit de atenção. O que deveria ser um momento de cuidado e escuta tornou-se um episódio de violência institucional.

Ao saber que sou responsável sozinha pela criação da minha filha, o médico desconsiderou qualquer possibilidade diagnóstica e passou a proferir falas discriminatórias: afirmou que “crianças sem figura masculina em casa tendem ao fracasso” e que “autoridade no lar pertence ao homem”. Comparou o papel do pai ao domínio dos machos no reino animal e declarou que “mulher não é autoridade em ambiente familiar”.

A violência seguiu: ele sugeriu que minha filha poderia ter deficiência intelectual e que, se confirmado, “não haveria tratamento”. Tudo isso foi dito diante dela, sem qualquer cuidado, empatia ou sensibilidade.

Saí daquela consulta destruída emocionalmente. Denunciei o ocorrido — por preconceito de gênero e violência psicológica — não apenas por mim, mas por todas as mulheres que já foram submetidas a esse tipo de julgamento disfarçado de opinião médica.

Esse episódio é emblemático: mostra como o preconceito contra a maternidade solitária não está restrito ao senso comum. Ele circula com força nos discursos institucionais e reforça uma lógica perversa que associa a ausência de um pai à falência da estrutura familiar — quando, na realidade, o que fracassa é a corresponsabilidade.

Enquanto nós, mulheres, somos cobradas a dar conta de tudo, a autoridade que exercemos com amor e presença é constantemente posta em dúvida. Já os pais ausentes permanecem intocados, sequer questionados.

Quem olhará por nós?

Quem nos representará nas políticas públicas de acolhimento, proteção e justiça? Quantas mulheres que criam seus filhos sozinhas ainda terão que adoecer em silêncio até que sejamos, de fato, vistas?

Qual seria a solução para essa realidade cruel — ou a única saída será mesmo educar uma nova geração de homens? Homens com uma visão de mundo antimachista, que compreendam que paternidade não se resume a pensão, mas inclui cuidados, presença, vínculo e amor.

Falo por mim, mas também por tantas outras mulheres que vivem as mesmas dores, invisibilidades e sobrecargas. Mães que lutam diariamente para criar seus filhos sem parceria, muitas vezes com o coração em pedaços, mas com a firmeza de quem sabe que não pode parar.

Chega de romantizar o abandono. Chega de fingir que está tudo bem. Precisamos e exigimos ser ouvidas. O abandono afetivo é real. É devastador. E precisa, urgentemente, ser tratado como questão de justiça, de saúde mental e de direitos humanos.

Rosemeire Cardoso é professora da rede pública de ensino na Região Metropolitana de Belo Horizonte

—

Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Editado por: Elis Almeida
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