Pedro Leopoldo foi o centro das discussões sobre transporte público na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) na segunda-feira (29). A cidade sediou, após forte pressão popular, uma audiência pública promovida pelo governo Romeu Zema (Novo), que apresentou o projeto de concessão administrativa dos terminais e estações do sistema MOVE.
O projeto prevê nove novos terminais rodoviários e a requalificação de outros dois, com investimento estimado em mais de R$ 1,4 bilhão. O terminal de Pedro Leopoldo seria construído no terreno da rodoviária atual, na Praça Rui de Carvalho, e faz parte do programa de Parcerias Público-Privadas (PPP) do Estado.
“Saímos com mais dúvidas do que respostas”
Para o vereador Gael (PT), o projeto é precipitado e carece de diálogo com a população. Ele critica a ausência de estudos que justifiquem a mudança e questiona a falta de consulta pública adequada.
“Não foi apresentado nenhum estudo ou documento que fundamente a necessidade da transformação da rodoviária em um terminal. Também não foi feita uma consulta para saber em que medida a rodoviária atende ou não as necessidades dos usuários. Isso demonstra como essa proposta está sendo precipitada e mal fundamentada. Seria necessário a realização de estudo e de consulta pública consistente”.
Segundo o parlamentar, o governo também não esclareceu como ficará a situação dos comerciantes que atuam na rodoviária há anos.
“A princípio, o risco [de perda do sustento] existe. Porque na proposta não está claro como o novo terminal funcionará, se o aluguel das lojas sofrerá aumento, se as regras mudarão, pois hoje a gestão é da prefeitura. Como se dará essa transferência para o governo do Estado? Além disso, esses trabalhadores sequer foram ouvidos devidamente”, ponderou.
Gael também criticou o silêncio do governo frente aos questionamentos. “Enviamos um ofício com vários questionamentos e, até agora, não tivemos retorno”.
“Privatizar não é solução”, diz morador
Durante a audiência, o morador Igor Martins foi enfático nas críticas. Ele questionou por que o governo quer construir terminais em Pedro Leopoldo e Lagoa Santa e sugeriu que Confins seria mais adequado.
“A maioria dos trabalhadores de Pedro Leopoldo trabalha no aeroporto de Confins. Por que não construir o terminal lá, que tem potencial de agregar mais e atender melhor a população de ambos os municípios?”, questiona.
Martins também denunciou o aumento no valor das tarifas e questionou se a linha 5297, que liga Pedro Leopoldo ao centro de BH, será extinta.
“Quando a linha troncal, que vai seguir de forma direta até o centro de BH, começar a operar, a linha 5297 vai deixar de existir? Isso vai acelerar as viagens? Em 2014, pagava R$ 4,75 até BH. Hoje a passagem está R$ 14,10 e demoramos mais pra chegar ao centro da capital”, criticou o usuário que ficou sem respostas durante a audiência.
Ele criticou ainda o discurso das concessionárias de que os custos de manutenção justificam tarifas mais caras. “A desculpa é que a manutenção dos ônibus custa caro e por isso o valor é repassado aos usuários”.
Martins também relacionou a proposta à privatização do metrô da capital.
“Privatizar é a solução ou deveria o poder público se responsabilizar? O governo foca em conceder o serviço público para empresas que vão operar e, se a empresa precisar aumentar sua margem de lucro, vai solicitar ao governo, que vai conceder. E esse dinheiro sai do bolso do cidadão. Fui funcionário do metrô antes da privatização e posso dizer que o serviço piorou bastante depois disso”, denuncia.
“O usuário vai pagar o preço?”
Gael também apontou contradições no modelo “multimodal” apresentado. Durante a audiência, a representante do governo Zema, Joana Brasil, defendeu que o usuário poderá ir ao terminal de Uber, moto ou carona, e então embarcar no transporte coletivo.
“A experiência da cidade de Pedro Leopoldo com o Terminal Vilarinho é um exemplo de que esse modelo multimodal não necessariamente melhora o serviço. Muitas vezes o que acontece é um isolamento das regiões metropolitanas, viagens mais demoradas do que antes, em que o trajeto era direto. Sabemos que muitas vezes a intenção é desafogar o trânsito na capital. Mas a que custo? O usuário do transporte público é quem deve pagar o preço?”, pergunta.
Prefeitura exige cláusulas locais
A Prefeitura afirmou, em nota, que a adesão ao projeto será condicionada a cláusulas que respeitem as realidades locais. A prefeitura destacou que o terminal contará com bicicletários, áreas comerciais, wi-fi gratuito, banheiros acessíveis e sistema de câmeras conectado a um centro de controle.
Gael, por sua vez, reforçou que o foco deve ser outro.
“Sem dúvidas, precisamos de investimentos na rodoviária. Mas um ponto central para melhorar a mobilidade urbana é reduzir o valor das passagens e ampliar o número de linhas e horários. Reencaminhamos o ofício com todos os questionamentos e, assim que tivermos resposta, vamos dar publicidade”, afirmou o vereador.
Governo promete relatório, mas prazo é indefinido
O governo do Estado informou que todas as dúvidas recebidas durante a consulta pública serão respondidas em relatório a ser publicado no site da Unidade PPP de Minas Gerais, após o fim do período de consulta pública, mas não houve definição de data para a publicação.
Para Gael, no entanto, o essencial é garantir tarifa justa e ampliação do serviço. “Precisamos de investimentos, sim. Mas o foco deve ser a redução das passagens e mais linhas e horários. Sem isso, a mobilidade não melhora”, concluiu.