Pelo segundo dia consecutivo, deputados e senadores de oposição se revezam para ocupar as mesas diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, impedindo, ainda que parcialmente, os trabalhos do parlamento. O parlamentares pressionam para que os presidentes das Casas pautem o projeto de anistia aos condenados pela participação na tentativa de golpe de Estado e uma série de pedidos de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O magistrado é relator da ação penal do golpe e determinou, na última segunda-feira (4), a prisão domiciliar cautelar de Jair Bolsonaro (PL), após o ex-presidente descumprir decisões judiciais.
As sessões agendadas para esta quarta-feira (6) foram canceladas e uma sessão solene do Congresso Nacional de abertura da 2ª Cúpula Parlamentar de Mudança Climática e Transição Justa da América Latina e do Caribe teve que ser transferida para um outro local. No entanto, algumas comissões funcionaram normalmente.
O líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-AP) afirmou que tem dialogado com o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União-AP), para buscar uma solução para o que considerou um um “segundo 8 de janeiro”. “O que está acontecendo não é obstrução, é vilipêndio, é um segundo 8 de janeiro, agora feito por aqueles que foram cúmplices no 8 de janeiro anterior. Então nós iremos procurar o presidente Davi Alcolumbre ainda nesta tarde para encontrar os meios necessários para o pleno funcionamento do Senado Federal”, disse o parlamentar.
O senador capixaba Fabiano Contarato (PT-ES) lembrou que a paralisação dos trabalhos do Legislativo tem impacto direto na vida dos brasileiros, sobretudo diante da imposição de sobretaxas aos produtos brasileiros, imposta pelo governo dos Estados Unidos, e que entraram em vigor nesta quarta-feira.
“As manobras de obstrução impedem o avanço de pautas urgentes, como o socorro a setores afetados pelo tarifaço dos EUA, a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil e o fim dos super salários. São medidas que dependem exclusivamente do Legislativo. É inadmissível que interesses particulares travem o que é essencial para o país”, declarou.
Sobre a pressão da extrema direita para pautar o projeto de anistia e os pedidos de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, o líder do governo afirmou que trata-se de uma pauta antinacional de submissão a interesses alheios ao Brasil.
“Essa pauta não é deles. Essa pauta é do estrangeiro. Essa pauta é de uma aliança do bolsonarismo com Donald Trump contra o Brasil. Não se trata de uma pauta dos interesses do Brasil e dos brasileiros. É uma agenda contra o Brasil. Sabe o que o brasileiro quer? O brasileiro quer a anistia do imposto de renda. É essa anistia que o brasileiro quer”, afirmou.

Segundo o senador, o governo quer priorizar a votação da correção da tabela de imposto de renda e sugeriu que há previsão constitucional para que o Congresso se reúna em outras dependências, em virtude da indisponibilidade dos plenários.
“A Constituição da República diz que o Congresso Nacional pode se reunir em qualquer uma das dependências, em qualquer lugar do território nacional. Então, isso está amparado pela Constituição. Essa é uma possibilidade. Mas vamos deixar ao presidente do Congresso Nacional, ao presidente do Senado, ao presidente Davi Alcolumbre as prerrogativas de como presidente do Congresso Nacional e presidente do Senado fazer definir qual o melhor funcionamento do Congresso Nacional”, disse o líder.
Da Câmara, onde há uma maior e mais inflamada bancada de extrema direita, o deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) qualifica o protesto bolsonarista no plenário como uma “cena patética” e, na mesma linha de Rodrigues, descartou que se trate de uma obstrução legítima e comparou o ato com o 8 de janeiro.
“Isso não é obstrução que é regimental, que tem seus métodos. Aqui é o espaço do dissenso, do conflito de ideias e projetos, mas um espaço regulamentado, não é briga de rua. Eles avançaram sobre as mesas diretoras, se instalaram lá fantasiados, mascarados com esparadrapo na boca, alguns até nos olhos e ouvidos e estão protagonizando essa cena patética que impede os outros de se manifestarem”, disse o deputado, esclarecendo que há instrumentos regimentais, como pedidos de vista, e requerimentos de diversos tipos, que são utilizados para obstruir uma determinada votação, mas jamais ocupar, pela força, o recinto legislativo.
“O óbvio, o necessário, o urgente é a volta do funcionamento normal da Câmara e do Senado. Essa atitude lembra muito o 8 de janeiro. E isso não pode ser admitido. É algo completamente torto e torpe em relação ao nosso processo democrático. É uma ofensa à nossa Constituição”, finalizou Alencar.
Haddad: ‘oposição atrapalha o país’
Ministros do governo criticaram a estratégia de obstrução da direita no Congresso. Pela manhã, na chegada ao ministério, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a oposição “atrapalha o país”.
“A oposição está atrapalhando o país e não sou eu que estou dizendo, é a oposição que está dizendo. Eles estão dizendo que vão atrapalhar o país. Eles estão anunciando isso”, declarou o ministro, que defendeu ainda uma unidade nacional, envolvendo setores próximos ao grupo político da família Bolsonaro, para enfrentar a estratégia de boicote do parlamento.
“Existe uma força extremista no Brasil agindo contra o interesse nacional. Então, o empresariado, além de vir para Brasília, tem que conversar com a oposição, tem que passar a mão no telefone e ligar para a turma que quer ver o circo pegar fogo e parar com isso”, advogou Haddad.
Gleisi Hoffmann, ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), que é responsável pela relação do Executivo com o Congresso, usou a rede social X para criticar a obstrução do parlamento.
“O povo brasileiro não pode carregar nas costas o peso de Jair Bolsonaro. Primeiro, conspirou com um governo estrangeiro, fazendo o presidente dos EUA impor pesadas taxas às exportações brasileiras, comprometendo nossos empregos, empresas e a economia do Brasil em troca de pressão para sua anistia. Agora, seus apoiadores no Congresso Nacional, com o mesmo objetivo, impedem votações importantes para os trabalhadores e as famílias do Brasil”, publicou a ministra, citando sem seguida os projetos de interesse nacional que seguem parados no parlamento, como a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança, isenção da conta de luz pra quem consome até 80 kW.