O Jornal Boca de Rua, único no mundo produzido exclusivamente por pessoas em situação ou com vivência de rua, completa 25 anos e marca a data com o lançamento do documentário Ruaologia. Dirigido pelo jornalista e pesquisador Arthur Walber Viana, o filme será exibido neste sábado (9), às 18h, na Casa Alice (rua Olavo Bilac, 188 – Cidade Baixa, Porto Alegre), com entrada gratuita e debate após a exibição.

O termo Ruaologia – “a ciência da rua” – foi criado por Carlos Henrique Rosa da Silva, integrante do Boca de Rua, e batiza a obra que retrata a história, os processos e a importância do jornal. A produção integra a tese de doutorado de Viana, defendida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), em março de 2025, que analisa o papel do veículo como canal direto de voz para seus próprios integrantes.
O diretor conta que gravou cerca de 250 minutos de entrevistas, condensados em 43 minutos no documentário. Ao todo, 11 integrantes do Boca de Rua participam do filme: Michelle Aparecida Marques dos Santos, Aline Gonçalves Leal, Fábio Saraiva Corrêa, Carlos Henrique Rosa da Silva, Diogo Macedo, Michel Vasconcelos dos Santos, Edisson José Souza Campos, Nara Gonçalves Canabarro, José Luiz Straubichen, Jones Rosa dos Santos Barbosa e Anderson Luís.
“Compartilhar a palavra”
Conforme Viana, o objetivo da pesquisa foi “aprender, por meio do convívio e da escuta”, as potencialidades do grupo de pessoas em situação ou com trajetória de rua que, há 25 anos, fazem jornalismo, “discutindo pautas, entrevistando, fazendo fotos, escrevendo matérias”. Ele avalia que o grupo, ao praticar e refletir sobre comunicação, revela saberes que a Semiótica e a Comunicação – áreas onde está inserido – deveriam escutar.

O diretor destaca que o foco da pesquisa não era apenas reconhecer o Boca de Rua como fonte de saber, mas criar espaços em que os próprios integrantes contribuíssem criativamente com o debate acadêmico. “Por isso o método com entrevistas em profundidade e observação-participante. A intenção era criar uma aliança, e não apenas extrair esses saberes dali sem que houvesse uma relação mais significativa com o grupo”, explica.
Segundo ele, o documentário surge justamente do desejo de “compartilhar a palavra” com os integrantes do jornal, descentrando a figura do pesquisador. “No convívio com o Boca de Rua, o que mais chama atenção é a potência desse espaço. As reuniões são intensas, cheias de ideias, discussões, cheias de força. O jornalismo que emerge dali expressa essa vitalidade das pessoas que fazem ele.”
“O Jornal Boca de Rua é um grito”
Uma das idealizadoras do Boca de Rua, a jornalista Rosina Duarte destaca que o jornal já inspirou mais de 200 projetos acadêmicos e vários audiovisuais, entre eles o longa “De olhos abertos”, da cineasta francesa Charlotte Dafol, que participou de 25 festivais e recebeu três prêmios. Mas pontua que “o projeto é como um ser vivo que muda e se adapta ao tempo presente”.
Duarte celebra a visão atual que Ruaologia traz, de forma didática, sobre o processo de realização do jornal e sobre a relação de seus participantes com o projeto. “É como espiar por uma fresta de um mundo insuspeitado. Assim, oferece ao expectador uma visão caleidoscópica da realidade que nos é mostrada de forma plana, proporcionando a oportunidade de construir sua visão crítica ao invés de tragar verdades prontas, rasas e preconceituosas”, afirma.
A jornalista explica que o Boca de Rua são se trata de um projeto social, “mas de uma comunidade alternativa com suas próprias regras e sistema de gestão organizadas pelo grupo, que também criou uma metodologia própria de comunicação.” Ressalta que não há nada igual no mundo e que “proporciona uma sensível redução de danos do silêncio e da solidão – duas das maiores causas do sofrimento humano.”
“O Jornal Boca de Rua é um grito. É uma mordaça mastigada até romper. É a venda arrancada dos olhos da sociedade para revelar a realidade nua diante de si. É a pequena, improvável e persistente revolução dos (in)visíveis”, define Duarte. Ela convida a todas e todos para fazerem a assinatura virtual do Boca de Rua, “recurso é fundamental para a impressão do jornal”.
A assinatura pode ser na modalidade mensal recorrente, com valores a partir de R$ 10. O projeto Boca de Rua tem orientação da Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação (Alice), que defende o direito à comunicação.
Serviço
Lançamento do documentário Ruaologia, de Arthur Walber Viana
Quando: Sábado, 9 de agosto, às 18h
Onde: Casa Alice – Rua Olavo Bilac, 188, Cidade Baixa, Porto Alegre (RS)
Quanto: Entrada gratuita
Classificação: Livre