No último dia 31 de julho, quatro servidores da Companhia Pernambucana de Gás (Copergás) foram pegos de surpresa. Funcionários concursados, alguns efetivados há 14 anos, receberam cartas de demissão alegando justa causa e foram mandados para casa. Segundo o sindicato que representa os trabalhadores da empresa, não houve qualquer medida administrativa prévia – nem advertências, nem os casos passaram por conselhos de ética. Demissão. Todos integravam o setor de segurança do trabalho, agora inexistente.
Trabalhador da empresa e diretor do Sindicato dos trabalhadores e petróleo e gás de Pernambuco (Sindipetro), Thiago Gomes disse que a companhia tem funcionado sem qualquer técnico de segurança do trabalho. “É uma companhia de gás, com elevado grau de risco na sua atividade. Temos obras de infraestrutura para gasodutos e elas seguem em curso sem supervisão técnica de segurança do trabalho. Os funcionários estão fazendo a contragosto, por pressão dos gestores”, contou o trabalhador ao Brasil de Fato.
Ele diz não ter entendido a ação da companhia. “Ainda não sabemos o real motivo de terem demitido todos os técnicos do setor de uma vez. Não houve advertência verbal ou escrita, não passou pelo conselho de ética da empresa. Foi estranho e arbitrário. É algo sem precedentes, que nunca aconteceu isso aqui na Copergás”, pontua Gomes. Uma das possibilidades ventiladas entre os trabalhadores é um possível interesse em terceirizar o setor, contratando pessoas jurídicas. Ele defende os demitidos. “Todos tinham um excelente histórico, desde quem entrou há 14 anos até quem entrou em 2024”, avalia.
Em seus vídeos institucionais, a empresa se gaba por ter conquistado certificados de segurança e destacando esta como fundamental para sua atuação na instalação de dutos subterrâneos. Na propaganda, a Copergás aponta justamente a segurança como vantagem competitiva em comparação às suas concorrentes.
Ameaça a todos os concursados
O Thiago Gomes considera que houve motivação política por parte da administração. “Estão tentando implementar uma gestão do terror. Se alguém entrar em desacordo com os gestores, eles demitem sem qualquer rito administrativo”, avalia Gomes. “Agora saímos de casa para trabalhar e não sabemos se ao fim do dia vamos receber uma carta de demissão”, lamenta. “Imagine se isso virar moda? Trabalhadores concursados correndo risco de demissão por questões políticas. Por isso entendemos essa ação da Copergás como uma ameaça aos trabalhadores de todas as estatais”, opina Thiago.

O trabalhador acredita que o serviço prestado pela Copergás à população também fica prejudicado com o ambiente de insegurança. “Se assumir uma gestão negacionista na empresa, que não valorize a segurança no trabalho, qual a confiança que os trabalhadores terão para fazer apontamentos técnicos necessários?”, questiona. O Sindipetro pretende abrir um processo judicial contra a empresa, mas preferiu não dar detalhes sobre a ação. Em nota pública, o sindicato classificou a ausência de técnicos de segurança do trabalho como “situação temerária à segurança de todos os trabalhadores da Companhia”.
O Brasil de Fato Pernambuco entrou em contato com a Copergás questionando sobre as demissões, mas até o momento não fomos respondidos. Tão logo a companhia entre em contato, adicionaremos as respostas ao texto.
Os funcionários da Copergás receberam a solidariedade da Federação Única dos Petroleiros (FUP), através do seu dirigente nacional. “Sou técnico de segurança do trabalho e sei da importância desse grupo de profissionais para garantir a segurança nas atividades de todos os trabalhadores. Não podemos admitir que aconteça isso com uma empresa estatal e vamos lutar para reverter as demissões”, discursou Dayvid Bacelar, durante encontro da categoria em Pernambuco. O líder sindical prometeu entrar em contato com os senadores Humberto Costa (PT) e Teresa Leitão (PT) para tentar pressionar politicamente o governo Raquel Lyra (PSD).
O Partido dos Trabalhadores (PT) também divulgou nota crítica à ação da Companhia Pernambucana de Gás. “A medida é uma atentado inaceitável aos direitos da classe trabalhadora, uma afronta direta aos princípios do serviço público, à estabilidade garantida por concurso e ao papel estratégico da segurança do trabalho na proteção à vida. Causa indignação que uma empresa de caráter público, vinculada ao Governo do Estado, promova esse tipo de prática antidemocrática e autoritária”, diz o texto.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) também manifestou “indignação e repúdio”. “É inaceitável sob todos os aspectos a ausência de diálogo da empresa. (…) As demissões são injustificáveis e descabidas, uma vez que a segurança continua sendo base fundamental para todos os trabalhadores e trabalhadoras da Companhia”, diz a nota pública.

Criada em 1992, a Copergás é uma empresa estatal de economia mista, que tem como acionista majoritário o Governo de Pernambuco (detentor de 51%) e sócios minoritários a paraibana Energisa (24,5%) e a transnacional japonesa Mitsui Gás e Energia (24,5%). Sob o controle da gestão Raquel Lyra, a companhia tem entrado em atrito com os trabalhadores, o que o sindicato considera ser reflexo de uma gestão que cede mais às demandas dos acionistas privados.
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Na negociação salarial mais recente, prevista para o fim de 2024, a categoria aceitou não ter reajuste salarial, apenas pediram ampliação de um ano no auxílio-escola e participação nas discussões sobre a compensação de feriados, mas a empresa negou e retaliou com redução do Vale Refeição, o que levou os trabalhadores da Copergás a declararem estado de greve. Em janeiro, o antigo presidente Felipe Valença foi substituído pela governadora, que indicou o advogado Bruno Monteiro Costa, atual gestor da companhia.
A Copergás
A Copergás entrou em operações em 1994 e herdou gasodutos da Petrobras, com a missão de distribuir gás natural com sustentabilidade em todo o estado de Pernambuco. A empresa está presente em 29 municípios, partindo da região metropolitana, passando por Garanhuns (no Agreste) e chegando até Petrolina (Sertão do estado). A empresa tem como meta para o período que vai até 2028 investir R$595,9 milhões na ampliação da rede de distribuição.
A empresa fornece gás, no momento, para 100 mil residências (sendo mais de mil condomínios residenciais). Também são atendidos mais de 1.200 centros comerciais (shoppings centers, hotéis, restaurantes), 154 indústrias e 133 postos de combustíveis. No último relatório divulgado pela empresa, com dados do fim de 2023, a Copergás apresentou um lucro líquido de R$96 milhões e movimentou R$1,2 bilhão no ano mencionado. Tudo isso com um time de apenas 170 trabalhadores.
