O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), voltou a criticar, nesta quarta-feira (13), o governo dos Estados Unidos pelos ataques às instituições e à economia brasileira. “Nós estamos num debate que não é econômico, gente. É um debate político. É um debate político com teor ideológico”, destacou.
Lula fez as declarações durante o evento de apresentação da Medida Provisória (MP) com o plano de contingência para enfrentar os impactos das tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos a produtos brasileiros. O presidente citou a participação do governo estadunidense no golpe militar de 1964, que deu início ao período de ditadura militar no Brasil.
“Veja que nós relevamos até o golpe de 64. Nós nem lembramos o que foi o papel da embaixada americana aqui no Brasil. Não lembramos o que foi o papel de navio de guerra dos Estados Unidos no nosso mar, tudo isso a gente sabe, não esqueceu, mas não levamos mais em conta, porque nós somos da paz”, declarou. “Agora, o meu time não tem medo de briga. Se for preciso brigar, a gente vai brigar. Mas antes de brigar a gente quer negociar”, completou o presidente.
O presidente voltou a afirmar que seu governo seguirá buscando novos mercados para os produtos brasileiros, e destacou que pretende promover o estreitamento das relações comerciais com a Índia, parceiro do Brasil no Brics.
“Vamos fazer um grande evento, que eu quero levar pelo menos uns 500 empresários brasileiros para a Índia, porque é um país muito grande, muito importante e tem muitas coisas para a indústria brasileira, sobretudo na questão de fármaco, a questão de inteligência artificial, a questão espacial e a questão de defesa. Nós temos muito que aprender com a Índia e ao invés de ficar chorando aquilo que nós perdemos, vamos procurar ganhar outro lugar. O mundo é grande, o mundo está ávido para fazer negociação com o Brasil”, afirmou Lula.
Direitos Humanos
O presidente Lula não citou diretamente o relatório anual do Departamento de Estado dos Estados Unidos, divulgado nesta terça-feira (12), que cita uma suposta “deterioração da situação dos direitos humanos no Brasil”, mas fez referência ao tema.
“Falar de direitos humanos no Brasil já foi importante em outras épocas. Mas agora, antes de falar em direito humano no Brasil, tem que olhar o que acontece no país que está acusando o Brasil”, afirmou.
“Aqui no Brasil nós temos um Poder Judiciário autônomo que está garantido na nossa Constituição de 88 e que [nem] o Poder Executivo nem o Congresso Nacional temos nenhuma incidência com relação ao julgamento que está acontecendo na Suprema Corte”, declarou o presidente, em referência à ação penal sobre a tentativa de golpe de Estado envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e alvo de críticas do governo de Donald Trump.
“Ninguém está desrespeitando regras de direitos humanos como estão tentando apresentar ao mundo. Porque os nossos amigos americanos, toda vez que eles resolvem brigar com alguém, eles tentam criar uma imagem de demônio contra as pessoas que eles querem brigar”, disse Lula.
Golpistas agem contra o Brasil
Por sua vez, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, destacou os esforços do governo em dialogar com os setores produtivos afetados e qualificou a crise entre o Brasil e os Estados Unidos como “inusitada”. “É um país que está sendo sancionado por ser mais democrático do que o seu agressor. É uma situação inédita e muito incomum no mundo. Um país que não persegue adversários, não persegue imprensa, não persegue escritórios de advocacia, não persegue universidades, não persegue imigrantes legais ou ilegais, está sujeito a uma retaliação injustificável do ponto de vista político e econômico, como é o caso do Brasil”, disse o ministro.
“Vamos enfrentar, como já enfrentamos, várias situações difíceis nesse país e vamos superar mais essa dificuldade que é imposta de fora para dentro, mas infelizmente com apoio de alguns setores radicalizados da sociedade brasileira”, afirmou o ministro, em relação à gestão do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) junto a autoridades estadunidenses para boicotar a relação entre os dois países.
Sobre esse aspecto, a deputada federal e líder do Psol na Câmara, Talíria Petrone (Psol-RJ), criticou a lentidão do Congresso em punir exemplarmente o parlamentar, que teve vencido seu período de licença, mas segue nos Estados Unidos sem cumprir o mandato para o qual foi eleito.
“É muito grave uma articulação de parlamentares brasileiros contra a soberania nacional, atacando a Justiça brasileira e atacando a economia brasileira”, afirmou a parlamentar. “Infelizmente, a firmeza do presidente Lula não está sendo vista no Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados. E o que a gente espera é que o pedido de cassação avance, que a gente tenha uma responsabilização dele e de todos aqueles que tentam permanecer com um golpe em curso”, destacou a deputada.
Plano Brasil Soberano
Entre as medidas anunciadas no evento está o adiamento da cobrança de tributos e contribuições federais das empresas impactadas, além da devolução de tributos sobre importações de componentes que eventualmente tenham sido pagos por empresas exportadoras.
A MP também cria o Novo Reintegra, dirigido especialmente para os setores afetados, que devolve às empresas parte dos tributos pagos ao longo da cadeia produtiva. Atualmente, empresas de grande e médio porte de produtos industrializados têm alíquota fixada em 0,1%, enquanto micro e pequenas, por meio do programa Acredita Exportação, recebem de volta 3% doe impostos pagos.
O Novo Reintegra aumenta em até 3% o benefício para empresas cujas exportações de produtos industrializados foram prejudicadas pelo tarifaço. Dessa forma, grandes e médias empresas passam a contar com o reembolso de até 3,1% de alíquota, e as micro e pequenas, com até 6%. As novas condições do Reintegra valerão até dezembro de 2026 e terão impacto de até R$ 5 bilhões.

Finalmente, o governo incluiu no texto a ampliação das compras públicas de alimentos, sobretudo de produtos perecíveis que não puderam entrar no mercado americano em razão das tarifas.
A MP conta ainda com medidas consideradas pela equipe econômica como estruturantes, como a reforma do Fundo de Garantia para Exportação (FGE), criando um sistema de crédito para a exportação, com a liberação de R$ 30 bilhões dirigidos prioritariamente aos setores afetados pelo tarifaço, mas extensivo a todos os setores produtivos.
Outra proposta é um sistema de seguro que visa garantir a estabilidade das exportações, segundo o ministro da Fazenda. Nesse sentido, a MP prevê o aporte de R$ 1,5 bilhão no Fundo Garantidor do Comércio Exterior (FGCE), R$ 2 bilhões no Fundo Garantidor para Investimentos (FGI), do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e R$ 1 bilhão no Fundo de Garantia de Operações (FGO), do Banco do Brasil, voltado prioritariamente ao acesso de pequenos e médios exportadores.
O acesso às linhas estará condicionado à manutenção do número de empregos nas empresas beneficiadas. Para monitorar a situação da empregabilidade no Brasil, a MP determina a instalação da Câmara Nacional de Acompanhamento do Emprego, sob coordenação das Câmaras Regionais nas Superintendências Regionais do Trabalho.
Indústria e sindicatos satisfeitos
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Ricardo Alban, compareceu ao evento no Palácio do Planalto e parabenizou o governo pelo plano. “Preservarmos a nossa capacidade de resiliência e de reação da indústria nacional. Então, a defesa comercial é um ponto muito delicado a ser observado e outro, como já está sendo feito, dar muito mais ênfase aos acordos bilaterais. Nós temos que ter uma verdadeira cruzada nos acordos bilaterais. Se for com Mercosul, ótimo. Se não for com Mercosul, vamos fazer acordos bilaterais, porque é aí que nós vamos abrir oportunidades de mercados para que a gente possa trabalhar”, destacou o empresário.
“E mais uma vez juntos, convergentes, sem nenhum problema de ter cada um seu pensamento, cada um sua ideologia, cada um sua racionalidade. Mas nós colocarmos o Brasil como nação em primeiro lugar”, afirmou Alban.
Em representação dos sindicatos, Miguel Torres, presidente da Força Sindical destacou a necessidade de preservar os empregos diante da crise instaurada pela medida unilateral do governo estadunidense. “Então esse pacote vai trazer uma tranquilidade tanto para o setor produtivo quanto para os trabalhadores. Temos que garantir o emprego, a mão de obra ativa nesse país. Não podemos esquecer disso. E isso está contemplado nesse pacote. Isso é muito importante para que nós possamos avançar”, destacou o dirigente.