A deputada estadual Laura Sito (PT-RS) protocolou o Projeto de Lei 66/2024, conhecido como Projeto Libertar, que busca criar no Rio Grande do Sul políticas públicas de apoio a vítimas de violência sexual, com foco especial em crianças e adolescentes. A proposta que incentiva as vítimas a romper o silêncio e interromper o ciclo de abusos volta a ser articulada pela deputada para ter celeridade na tramitação.
O tema voltou a ganhar destaque nas últimas semanas após a divulgação de um vídeo do criador de conteúdo Felca, que mostrou os riscos da hiperssexualização e adultização de crianças na internet, em um cenário de regulamentação insuficiente das redes sociais. Para a deputada Laura Sito, episódios como esse reforçam a necessidade de priorizar o enfrentamento à violência sexual, combinando prevenção, acolhimento e responsabilização.

“Infelizmente, ainda vivemos um cenário em que muitas crianças e adolescentes vítimas de violência sexual não têm acesso a uma rede de proteção estruturada. A ausência de canais seguros para denunciar, a falta de profissionais capacitados e a limitação de serviços especializados contribuem para a subnotificação e para a continuidade dos abusos”, afirma Sito.
Ela observa que a superfície da internet, tendo as redes sociais como exemplo, se tornou “um espaço de vulnerabilidade a partir da hiperssexualização e adultização de crianças sem a devida regulamentação, lugar que até então era quase que restrito à chamada deep web”.
Prevenção, acolhimento e responsabilização
O PL 66/2024 pretende enfrentar os desafios de forma integrada, combinando prevenção, por meio de palestras educativas e campanhas de conscientização; acolhimento, com a criação de Centros de Referência e a ampliação do Departamento de Proteção a Grupos Vulneráveis (DPGV); e responsabilização, fortalecendo o trabalho das autoridades.
O projeto se inspira na experiência do Projeto Libertar, desenvolvido pela Polícia Civil em Camaquã (RS). Para a deputada, “o grande acerto foi aproximar a polícia das escolas de forma preventiva e educativa, criando um ambiente de confiança para que crianças e adolescentes pudessem denunciar”. O resultado foi concreto: 35 denúncias espontâneas surgiram a partir das palestras, muitas de casos que nunca chegariam ao conhecimento das autoridades. “Essa combinação de educação, acolhimento e integração entre escola e rede de proteção será a base da aplicação estadual.”
A deputada ressaltou que “o mais urgente é garantir que cada região do estado tenha estrutura para atender as vítimas, com profissionais capacitados para a escuta especializada e um fluxo de atendimento que funcione”. As principais ações são implementar os Centros de Referência (CRAI), ampliar a rede do DPGV e criar mecanismos permanentes de prevenção nas escolas.

De acordo com Sito, o PL estabelece que a implementação dos CRAIs seja gradual, priorizando as regiões com maior vulnerabilidade e ausência de atendimento especializado. “Para isso, prevemos capacitações regulares para equipes de saúde, educação, assistência social e segurança pública, com foco na escuta especializada e no atendimento humanizado. Buscamos também integrar os novos centros à rede já existente, evitando sobreposição e otimizando recursos.”
Desafios e lacunas na rede de proteção
Questionada sobre a limitação orçamentária de apenas R$ 40 mil previstos no Plano Plurianual, Sito afirmou que o valor “é absolutamente insuficiente e mostra a falta de prioridade que o tema recebia até agora”. Segundo ela, a atuação será, por um lado, pressionar o Executivo e a Assembleia para ampliar o orçamento destinado às políticas de proteção e, por outro, buscar parcerias com municípios, Ministério Público, Defensoria Pública e organizações da sociedade civil para viabilizar ações já no curto prazo. “Entretanto, não abrimos mão de lutar para que a proteção de crianças e adolescentes seja tratada como prioridade orçamentária.”
Riscos digitais e hiperssexualização de crianças
Sobre a atuação do PL frente à necessidade de regulamentação das redes sociais, Sito explicou que o projeto não substitui a necessidade de uma regulamentação federal das plataformas digitais, pois atua no campo da prevenção e da educação, também para os ambientes digitais.
O projeto prevê palestras e orientações para famílias e educadores, além de capacitar profissionais para identificar sinais de abuso, seja ele nos ambientes digitais ou não. “Casos como o do vídeo do criador de conteúdo Felca mostram que a falta de controle nas redes expõe crianças a riscos gravíssimos e, por isso, precisamos preparar nossa rede de proteção para agir também nesse ambiente.”
Para garantir que o projeto seja aprovado e implementado como política de Estado, Sito destacou que a estratégia é “construir um consenso suprapartidário sobre a importância do tema, envolvendo deputados e deputadas de diferentes bancadas, além de mobilizar sociedade civil, órgãos de proteção e gestores municipais. Ao incluir o projeto como política de Estado, com previsão orçamentária e responsabilidades definidas, garantimos que ele não dependa da vontade de um único governo para continuar.”