Nesta segunda-feira (25), movimentos populares realizam uma plenária em defesa de ocupações e contra a venda de imóveis públicos no Rio de Janeiro. A reunião será às 18h, na Casa Almerinda Gama, localizada na rua Carioca, 37. Os movimentos de luta por moradia questionam a decisão do governador Cláudio Castro (PL) de leiloar imóveis do estado ignorando que na lista estão ocupações populares, estádio e sede de movimentos sociais que acolhem populações vulneráveis como mulheres vítimas de violência e pessoas trans.
O Projeto de Lei Complementar 40/25 foi enviado na última segunda-feira (18) com pedido de urgência para a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) como forma de recompor o orçamento do Estado. Nessa lista há 48 imóveis localizados em diferentes cidades, incluindo Maricá e Niterói, mas a maioria (26) está localizada no centro da capital.
O Movimento de Mulheres Olga Benário, responsável pela ocupação, informou pelas redes sociais que recebeu o comunicado no dia 4 de agosto de que a Casa Civil e a Secretaria de Mulheres do Estado do RJ pediram o encerramento da tentativa de mediação sobre o processo da Casa Almerinda Gama que acolhe mulheres vítimas de violência desde 2022. A nota questiona a falta de investimento público para a proteção das mulheres e onde as vítimas serão acolhidas, uma vez que esta é a única casa de acolhimento existente no Estado.
O Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro (GTNM-RJ) criticou a inclusão de imóveis onde funcionam movimentos que atividades de reconhecida importância social e que ocupam alguns poucos imóveis entre muitos que o Estado tem sem qualquer uso social há anos. Com sede em Botafogo, na zona sul do Rio, há 31 anos o espaço acolhe vítimas de violência, a preservação da memória e a defesa dos Direitos Humanos. “Reivindicamos que os imóveis onde funciona o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro e os demais movimentos sociais atingidos sejam retirados desta lista e que cada caso seja escutado, a fim de garantir o funcionamento e as funções sociais que exercem”, diz a nota publicada nas redes sociais.
Já o Movimento Unido dos Camelôs (Muca) classificou o projeto como “um ataque direto aos direitos do povo pobre, vulnerável e das minorias precarizadas” e inconstitucional, por ignorar a determinação constitucional da função social da propriedade. “Vale relembrar que esses mesmos imóveis estavam abandonados pelo poder público, só ganharam valor porque foram ressignificados pela comunidade que vive lá agora e com seu próprio esforço vem reestruturando tais patrimônios, enquanto o estado fechava os olhos”.
Ao Brasil de Fato, um dos coordenadores da Central de Movimentos Populares (CMP), Marcelo Braga Edmundo, disse que a proposta “mostra o descompromisso do governo com qualquer política pública que atenda a população”. E defende que os imóveis ocupados como moradia sejam requalificados e regularizados, assim como aqueles que tem outros usos sociais como o da Almerinda Gama. “Não dá simplesmente para fazer um pacote e colocar a venda sem fazer o debate necessário com a sociedade para beneficiar a população de fato. Infelizmente, a democracia por aqui cada vez mais se limita ao voto a cada 2 anos como se fosse um salvo conduto para que se faça qualquer coisa sem ouvir ninguém”.
Para o coordenador do Grupo de Pesquisas e Extensão sobre Culturas, Políticas e Geografias Marginais (Margear) e professor da Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Matheus Grandi, a medida contribui para a manutenção das desigualdades sociais na cidade. “Ao fazer isso, o governo do estado abre mão da possibilidade de contribuir com a realização do direito à moradia e ao trabalho de parte da população que habita a área central, residindo, auferindo renda e construindo nela suas vidas. Essa opção, a médio prazo, não apenas reduziria os gastos do estado com tais imóveis, mas também estimularia a economia local, revertendo tais gastos em investimento social e econômico de médio-longo prazo. Opções político-econômicas como essas, portanto, apenas renovam a construção desigual de nossa cidade e não contribuem com qualquer tipo de melhoria para nosso quadro social”, disse à reportagem.
Em nota, a assessoria da Casa Civil do governo do estado informou que fará uma possível revisão do leilão após o projeto aprovado pela Alerj. “O Projeto de Lei enviado à Alerj, que relaciona imóveis do Estado, tem caráter autorizativo. Caso aprovado, caberá ao Governo avaliar a necessidade e o prazo para eventual alienação, sempre com atenção especial a instituições que prestam serviços de relevante interesse social, garantindo a continuidade de suas atividades”, diz o texto.