A Casa de Referência Mulheres Mirabal, em Porto Alegre, recebeu uma intimação judicial para desocupar o imóvel na zona norte da cidade, utilizado para acolher mulheres em situação de violência. A decisão determina que a associação deixe o espaço até o dia 10 de setembro, sob pena de uso de força policial para efetivar a remoção.
A medida foi emitida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), após pedido da Prefeitura Municipal de Porto Alegre para a desocupação e restituição do prédio localizado na Rua Souza Reis. A Mirabal atua no espaço desde 2018 e a ocupação do local é alvo de disputas com o poder público.
A entidade ocupou o prédio da antiga escola estadual Benjamin Constant, no bairro São João, após um acordo do Movimento de Mulheres Olga Benario RS, que organiza a Casa, com o Estado e a Prefeitura. Na época, a prefeitura era dona do terreno da escola e o Estado afirmou que cederia o prédio ao Município, contanto que a prefeitura o destinasse ao atendimento de mulheres vítimas de violência. Com isso, a Mirabal deixou a sua primeira ocupação, na Duque de Caxias, e passou a atuar nesse espaço.
Contudo, assim que houve a mudança, a prefeitura iniciou um processo de reintegração de posse. A Mirabal venceu o processo em primeira instância, pois foi entendido pela Justiça que a Prefeitura de Porto Alegre utilizou de má-fé com o Movimento. Mas, o processo seguiu e teve encerramento em 2024, com a vitória da Prefeitura em segunda instância.
“Essa intimação, ela relembra a gente de uma decisão que já teve em segunda instância que dava a causa para a Prefeitura de Porto Alegre, ano passado. O que aconteceu agora é que a prefeitura faz esse pedido para que a gente saia em 15 dias e ainda encontra uma juíza que corrobora com isso”, relata Nana Sanches, uma das coordenadoras da entidade.
Em março deste ano, a Superintendência do Patrimônio da União (SPU) cedeu um prédio no Centro Histórico de Porto Alegre para a entidade realizar os trabalhos de atendimento à mulheres vítimas de violências. O objetivo da entidade é utilizar esse novo imóvel para o acolhimento, enquanto a outra sede serve para abrigamento de mulheres.
Para Nana, a medida busca criminalizar o movimento e ela aponta que o prazo imposto ignora as condições reais para a desocupação e desconsidera o trabalho desenvolvido no local.
Na intimação consta que “a obrigação proposta consiste na desocupação voluntária do imóvel, sob pena de adoção das medidas coercitivas previstas no art. 536 do CPC, inclusive expedição de mandado de reintegração de posse com autorização para uso de força policial e arrombamento, se necessário”.
Para Nana, o documento não justifica o prazo de 15 dias e tampouco informa a destinação futura do imóvel. Ela lembra que a Mirabal oferece acolhimento e abrigamento a mulheres, com serviços que vão desde alimentação até atendimentos, e destaca que o espaço já é uma referência na região. “Existe uma rede grande de mulheres que são atendidas naquele território, por isso aquela casa é tão importante de ser mantido enquanto um espaço para mulheres”, diz.
Como aponta a coordenadora, a casa fornece um espaço com o auxílio necessário para que as mulheres ali atendidas retomem suas vidas, aprendendo um ofício e conquistando autonomia. Um processo que leva tempo e que apenas reforça o absurdo da decisão de exigir que elas saiam em 15 dias.
Nana relata que a associação está se organizando e avalia a realização de uma plenária com apoiadores para discutir estratégias de resistência. “A nossa luta é para que aquele prédio siga sendo o local de atendimento para mulheres vítimas de violência”, afirma.