No campo cearense, a posse de um pedaço de terra significa muito mais do que cercas e hectares. Para agricultores familiares, pescadores, quilombolas e povos indígenas, a titularidade é dignidade, segurança e a porta de entrada para políticas públicas que garantem futuro. É o chamado “papel da terra”, documento que dá ao agricultor acesso a crédito, aposentadoria, assistência técnica e ao mesmo tempo reconhece o direito ancestral de comunidades tradicionais sobre seus territórios.
Homologação de territórios indígenas
Em agosto, três territórios indígenas no Ceará foram homologados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: Jenipapo-Kanindé (Aquiraz), Tremembé de Queimadas (Acaraú) e Pitaguary (Maracanaú e Pacatuba). A decisão representou a concretização de uma luta histórica.
“Quando digo espaço de luta é porque é um espaço que todo dia precisamos defender”, afirma Ana Paula, liderança Tremembé de Queimadas. Para ela, a demarcação e a homologação são fundamentais para que os povos indígenas se sintam mais seguros em seus territórios.
Clécia Pitaguary, liderança do povo Pitaguary, também celebra o avanço, mas ressalta que não é hora de acomodação: “A expectativa não é de acomodação. Não vamos nos acomodar. Para cada terra homologada essa força tem que ser mais forte, se somar aos que ainda não conseguiram, dentro e fora do Ceará”.
A regularização como justiça no campo
O processo de regularização fundiária no estado é conduzido pelo Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace). Para o superintendente João Alfredo, o trabalho tem uma dimensão social e política. “Mais do que um documento, a regularização é o reconhecimento de um direito. É o que permite ao agricultor ou à comunidade tradicional acessar políticas públicas, crédito, assistência técnica, resolver conflitos e viver com dignidade”, afirma.

Ele explica que o Idace realiza levantamentos para identificar e titular posses legítimas em áreas devolutas. “Não é apenas um estudo, mas um trabalho detalhado, com georreferenciamento e cadastro, que nos permite identificar posseiros, medir imóveis, registrar famílias e, a partir daí, emitir títulos de propriedade ou delimitar territórios tradicionais. É um trabalho que promove justiça no campo.”
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Povos do mar e reservas extrativistas
Para os povos do mar, a luta é semelhante. José Alberto, o Beto Pescador, liderança da Reserva da Prainha do Canto Verde e membro da Confrem, destaca o papel dos governos na defesa dos territórios: “O governo Lula e o governo do Ceará, na pessoa de Elmano de Freitas, vêm avançando nesse processo de reconhecimento. É muito importante ter pessoas que têm compromisso com os povos tradicionais, indígenas e quilombolas. Também é muito importante esse trabalho que o Idace vem fazendo”, diz.
Números da regularização no Ceará
Entre 2023 e 2025, o Ceará já contabiliza mais de 15 mil títulos de propriedade entregues a agricultores familiares; 87 comitês municipais de regularização fundiária instalados; cinco territórios indígenas demarcados (três já homologados); um quilombola titulado em Salitre; além de áreas de pescadores artesanais e assentamentos estaduais reconhecidos.

Também foram concedidas CDRUs a comunidades tradicionais, adquiridos e arrecadados imóveis rurais, reconhecidos seis assentamentos estaduais pelo Incra e realizados projetos de pesquisa em parceria com universidades.
Governo do Ceará lança plataforma Terra.CE
O Governo do Ceará, por meio do Idace, lançou a plataforma Terra.CE, considerada um marco para a governança fundiária no estado. Desenvolvida em parceria com o programa Cientista Chefe/Funcap e a Universidade Federal do Ceará, a ferramenta reúne dados georreferenciados e integrados, garantindo informações atualizadas para apoiar a política fundiária e ambiental.
Apresentada durante edição especial do Idace Debate, a plataforma é produto do subprojeto de Governança Fundiária e Ambiental, coordenado pela professora Inês Escobar, e foi desenvolvida pelo professor Wellington Sarmento.
A Terra.CE já está disponível no site do Idace para acesso público.
Reconhecimento nacional
A experiência cearense foi destaque no Prêmio Solo Seguro, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, recebendo menção honrosa pela iniciativa “Universalização da Regularização Fundiária Rural”.
Mais que solo: cidadania
Seja na lavoura de feijão em Quixeramobim, no território indígena Tremembé ou na comunidade de pescadores da Prainha do Canto Verde, a luta é a mesma: garantir o papel da terra. “Regularizar a terra é organizar o território de forma justa, é dar condições para que o povo do campo viva com dignidade. O papel da terra é, antes de tudo, o papel da cidadania”, resume João Alfredo, do Idace.
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